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segunda-feira, 13 de abril de 2015

Somos contra o PL 4330 das terceirizações! Por mais direitos e nenhum a menos para as trabalhadoras!



Por: Maria Júlia Montero e Thaís Lapa*,
Desde o início do ano, temos visto uma grande avalanche de retrocessos com relação aos direitos da população no Brasil: a aprovação das medidas provisórias 664 e 665, que reduzem direitos previdenciários, especialmente a pensão por morte, e trabalhistas como o seguro-desemprego; o avanço da PEC 352/2013, apelidada de “PEC da Corrupção” pois prevê uma contrarreforma política que entre outras coisas legaliza o financiamento empresarial de campanhas eleitorais; a possibilidade de estabelecimento de um dia do orgulho heterossexual, o avanço da regulamentação da prostituição. Além disso, e a regulamentação do aborto não parece estar num horizonte próximo – muito pelo contrário.

Para coroar esse processo, foi aprovado nesta quarta-feira (8), por 324 votos a 137, o projeto de lei 4330, que prevê a regulamentação da terceirização do trabalho em nosso país. Apresentado em 2004 por Sandro Mabel (PMDB-GO e herdeiro da indústria fábrica de biscoitos Mabel, uma das maiores da América Latina), o projeto tem como eixo central permitir a terceirização irrestrita, isto é, de todas as atividades nas empresas, inclusive a atividade-fim, a atividade principal da empresa.

Centrais sindicais já vinham se mobilizando contra o projeto e, na noite de 7 de abril, data em que o projeto foi colocado em pauta em caráter de urgência pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, haviam ocorrido em todo o país manifestações e greves contra o PL 4330, bem como contra a retirada de direitos via MPs 664 e 665 e em defesa reforma política através de uma constituinte que acabe com o financiamento empresarial de campanhas, para que a política em nosso país não seja mais sequestrada pelos interesses econômicos dos patrões. Com esta aprovação de um dos maiores retrocessos nos direitos trabalhistas no nosso país, já está prevista manifestação nacional em 15 de abril, convocando a paralisação nos locais de trabalho em protesto contra o PL4330 em conjunto com protestos dos movimentos sociais.


Entenda os impactos da terceirização irrestrita para as/os trabalhadoras/es

Embora o trabalho terceirizado não seja regulamentado no país, o enunciado 331 do TST (Tribunal Superior do Trabalho) já permite contratar empresas terceiras para realizar serviços não considerados atividade-fim, ou trabalhos auxiliares, como vigilância, manutenção, preparação ou fornecimento de alimentação, transporte e conservação e limpeza. Como sabemos, as mulheres ocupam os postos de trabalhos mais precarizados do nosso país, especialmente as mulheres negras. São as que têm menor segurança no trabalho, salários menores, e também são as maiores atingidas pela terceirização (70% de cerca de 12 milhões de terceirizadas/os). Como exemplo desta relação íntima entre terceirização e precarização, o trabalho em limpeza terceirizado, em geral realizado por mulheres, dá às empresas a liberdade de demitir com maior facilidade (pode exigir “troca” de funcionárias), desobriga-a da garantia de direitos como férias, creches e escolas para filhos das trabalhadoras e rebaixa os salários, tão baixos a ponto de ser proveitoso para as intermediárias apenas gerir a subcontratação, já que vivem da diferença entre o que recebem da tomadora do serviço e o que pagam à trabalhadora. Sem contar que o caráter coercitivo de vínculo frágil deste trabalho faz as funcionárias, em geral, inibirem-se na resistência e na luta por direitos. Tais elementos, entre uma série de outros, já mostram os efeitos negativos às e aos trabalhadoras/es da terceirização já “permitida”.

Há também casos de contratação de trabalho terceirizado do que é a atividade principal da empresa, o que, até a aprovação do PL 4330, é irregular. Na cadeia de confecções, cujo trabalho de costura é predominantemente feminino, a presença das mulheres é massiva nas pequenas oficinas para onde as fábricas terceirizam parte do processo de costura. O trabalho terceirizado é aí, como em praticamente todos os casos, sinônimo de precarizado: pagamento ínfimo e por peça, o que implica em longas jornadas em geral em condições insalubres para se ganhar o mínimo para a sobrevivência, trabalho de menores de 16 anos, ausência de direitos trabalhistas e de possibilidade de organização sindical. Embora irregulares, tais oficinas costumam sustentar o setor de confecções em diversas regiões do país. Outro exemplo é o de muitas montadoras de celulares e outros produtos eletroeletrônicos, onde também há uma combinação entre terceirização e trabalho realizado por mulheres: as partes do processo de fabricação de eletroeletrônicos que passam a ser terceirizadas – reduzidos na empresa matriz e ampliados nas terceiras – são na montagem e reparo dos celulares, setores majoritariamente femininos. Trabalhadoras das terceirizadas ganham menos para fazer os mesmos trabalhos realizados na empresa matriz, além de terem, também, maiores jornadas maior instabilidade no emprego e maior propensão a sofrerem assédio moral.

Deste modo, embora a prática da terceirização seja apresentada como um meio de contratar especialistas em determinados serviços para que as empresas se foquem em sua atividade principal, o que se evidencia é que esta prática serve para a redução de custos para as empresas por meio do rebaixamento salarial: conforme dados do Dieese, quem trabalha em terceirizadas ganha quase 1/3 a menos do que quem não é, e segundo a Confederação Nacional da Indústria, 91% das empresas terceirizam para reduzir custos, e. A terceirização nada mais é, assim, do que uma forma de baratear a produção colocando os custos nas costas das/dos trabalhadoras/es.

Além disso, a terceirização serve como mecanismo de externalização dos conflitos trabalhistas. Como as/os empregadas/os têm vínculo empregatício direto com a terceira, procura-se colocar para ela a responsabilidade pelos direitos trabalhistas – inclusive quando a terceira somente produz para a contratante. Além disso, a terceirização por implicar em fragmentação sindical: sendo de empresas diferentes, realizam-se manobras para a não sindicalização das/os trabalhadoras/es terceirizados no sindicato da empresa matriz (maior, em geral mais consolidado e com mais força para realizar reivindicações). Em 2011, por exemplo, a Costech Engenharia, contratada exclusiva da Samsung para montagens de celulares em Campinas, retirou-se do complexo Samsung, instalando-se em Valinhos (cidade vizinha), alterou a finalidade estatutária da empresa de “montadora de equipamentos metalúrgicos” para “prestadora de serviços de montagem” e mudou irregularmente o enquadramento sindical de suas/seus funcionárias/os para funcionários de empresas de serviços – quando, sendo metalúrgicas/os e realizando trabalho idêntico ao de funcionárias/os da Samsung, eram representados/as pelo Sindicato dos Metalúrgicos de Campinas. Tal mudança de enquadramento para externalizar o conflito, neste caso, pôde ser revertida pela resistência das trabalhadoras da terceirizada, que com apoio do sindicato conseguiram garantir a mesma representação sindical os mesmos direitos das trabalhadoras da empresa matriz.

Mas esta é uma situação incomum, ou seja, em geral o elo mais fraco, as/os trabalhadoras/es das empresas subcontratadas, se prejudicam nos processos de terceirização. Assim, a fragmentação sindical resultante muitas vezes das terceirizações é uma forma de fragilizar os sindicatos e o próprio conjunto de trabalhadoras/es de um setor, dificultando a luta da classe trabalhadora por mais direitos, abrindo caminho para as empresas burlarem a legislação trabalhista. A terceirização se evidencia deste modo como um dos mecanismos utilizados pelas empresas, com apoio do Estado (pela omissão da fiscalização), para flexibilizar a gestão da produção de forma favorável às empresas – resultando em diminuição dos direitos trabalhistas, instabilidade no emprego, menor segurança no trabalho e pior remuneração.


As empresas têm todo interesse em aprovar o PL 4330 e houve condições plenamente favoráveis de aprová-lo no Congresso atual, onde bancada do empresariado cresceu substancialmente nas últimas eleições. Não é à toa que a FIESP, representante de patrões industriais no país, reivindica este projeto como benéfico às/aos trabalhadoras/es, como gerador de empregos. Tal defesa oculta que possíveis empregos criados seriam ainda mais precários, assim como que o PL4330 permite que apenas o nome do negócio seja mantido e todo o seu interior seja formado por terceiros Vale dizer que hoje em dia, as empresas já procuram escapar da garantia de direitos previstos na CLT (Consolidação dos Direitos Trabalhistas) “pelas bordas” e com a aprovação deste PL, passam a ter abertamente a liberdade de promover a redução de salários, direitos e possibilidades de resistência da classe trabalhadora.

Considerando que as mulheres já ganham 30% menos que os homens e já são a maioria das funcionárias terceirizadas, que cenário se pode prever para as trabalhadoras brasileiras com a aprovação de uma lei que torna a terceirização uma prática sem restrições, a ser aplicada “ao gosto” e em benefício dos patrões? Por esta razão, é fundamental o engajamento dos movimentos feministas nas lutas contra a terceirização irrestrita colocada pelo PL 4330, um projeto de interesse da empresas, que fere os direitos da classe trabalhadora como um todo, mas de forma especial os das mulheres. Assim como é fundamental o envolvimento na luta sindical e popular mais ampla para que as mulheres tenham condições de trabalho dignas, sem retirada de direitos, com garantia dos direitos já previstos atualmente e com ampliação dos mesmos, aprovando, por exemplo, projetos contra a discriminação salarial por gênero que prevêem salário igual ao dos homens pelo mesmo trabalho (PCL 130/11) – um dos quais Eduardo Cunha, presidente do Congresso mais conservador desde 1964, não tem a menor pressa em colocar em pauta.

Lutar por direitos e por nenhum direito a menos é preciso!

Havia alternativas possíveis para regulamentar a terceirização, como colocar em pauta os projetos apresentados por Vicentinho em 2007 para se contrapor ao PL 4330 ou outro construído em 2009 por centrais sindicais, juntamente com o Ministério da Justiça, o Ministério do Trabalho e a Secretaria de Assuntos Estratégicos, que prevêem a proibição da terceirização da atividade fim das empresas, bem como colocam a garantia da igualdade de condições salariais e de direitos entre os terceirizados e os não terceirizados. O conteúdo de tais projetos é favorável às/aos trabalhadoras/es: já que a terceirização tem entre seus objetivos centrais baratear custos, essa legislação tornaria o processo de terceirizar pouco atrativo para as empresas. Porém, como o interesse do atual congresso não é defender quem é trabalhadora/or, o projeto levado à pauta e aprovado foi o 4330, que fragiliza gravemente os direitos de quem trabalha.

Diante deste cenário, não há outra opção senão resistir! Nos mobilizemos no dia 15 de abril e em quantos dias forem necessários! Barremos a terceirização irrestrita que traz como horizonte ainda mais precarização do trabalho e sejamos firmes contra todo e qualquer projeto de lei que retire direitos das mulheres!!

Nós da Marcha Mundial das Mulheres, sempre em defesa da autonomia econômica das mulheres, seguiremos em marcha até que todas sejamos livres da opressão-exploração do capitalismo-patriarcado!

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* Maria Júlia Montero é militante do núcleo Helenira Resende da MMM (São Paulo) e Thaís Lapa é militante do núcleo ABC da MMM (São Paulo)

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