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segunda-feira, 31 de março de 2014

“Não está faltando cadeias. Está faltando é tronco em praça pública!”


Meu irmão Marcelo Pereira “Dilá” compartilhou uma história linda que não conhecia e cuja fonte não consegui identificar. Ao consultar a querida amiga Maria Silvia, ela me disse que os Griôs – contadores de histórias, protetores e celebradores da tradição oral africana, podem ter fortalecido essa história aqui no Brasil.

Fato é que ela nos ensina muito sobre punição, prisão e humanidade. Aliás, temos muito, mas muito mesmo a aprender com a África:

“Há uma ‘tribo’ africana que tem um costume muito bonito.

Quando alguém faz algo prejudicial e errado, eles levam a pessoa para o centro da aldeia, e toda a tribo vem e o rodeia. Durante dois dias, eles vão dizer ao homem todas as coisas boas que ele já fez.

A tribo acredita que cada ser humano vem ao mundo como um ser bom. Cada um de nós desejando segurança, amor, paz, felicidade. Mas às vezes, na busca dessas coisas, as pessoas cometem erros.

A comunidade enxerga aqueles erros como um grito de socorro.

Eles se unem então para erguê-lo, para reconectá-lo com sua verdadeira natureza, para lembrá-lo quem ele realmente é, até que ele se lembre totalmente da verdade da qual ele tinha se desconectado temporariamente: “Eu sou bom”.

Sawabona Shikoba!

Sawabona é um cumprimento usado na África do Sul e quer dizer: ”Eu te respeito, eu te valorizo. Você é importante pra mim”.

Em resposta as pessoas dizem Shikoba, que é: ”Então, eu existo pra você”. 

Já no Brasil, quando não se prende, se mata!

Quase 600 mil pessoas estão presas no Brasil. Temos aqui a quarta maior população carcerária do planeta, atrás apenas dos Estados Unidos (2,2 milhões), da China (1,6 milhão) e Rússia (740 mil). Vivemos a cultura do medo. Alimentamos estereótipos e o perigo quase sempre está acompanhado por determinada cor da pele, origem, tipo de vestimenta, prática cultural ou religiosa.

A violência é endêmica. A opressão por parte do Estado, que em tese deveria garantir segurança e bem estar à população, endossa a violência civil, tão cotidiana quanto cruel. Nosso país mantém 16 municípios no grupo das 50 cidades mais violentas do planeta. E o caráter racial da violência é explicito: enquanto a taxa de homicídios de negros é de 36,5 por 100 mil habitantes, no caso de brancos, a relação é de 15,5 por 100 mil habitantes e justamente por isso, enquanto o homem negro perde 20 meses e meio de expectativa de vida ao nascer, a perda do branco é de oito meses e meio. Pelas projeções, 36.735 brasileiros de entre 12 e 18 anos serão assassinados até 2016.

Assassinatos em série, pessoas desaparecidas, corpos arrastados. Tudo isso ao vivo e em tempo real. É possível negar o conflito em que vivemos? É possível negar a ineficácia das políticas de segurança pública ? É possível não perceber que encarceramento e força militar não resolvem os problemas e sequer tocam suas raízes?

Não há país civilizado. Não há país harmônico ou democrático. Somos violentos. Somos desumanos. Somos cruéis. É preciso assumir para tratar. É preciso enfrentar e desconstruir no imaginário da população, valores simbolizados pelo comentário de um dos leitores deste Blog: ”Não está faltando cadeias. Está faltando é tronco em praça pública!”

NÃO ESTÁ!

‘Amarildos’, ‘Ricardos’, ‘Douglas‘, ‘Cláudias‘ e tantos outros barrados, desaparecidos, torturados, arrastados eexecutados de nossos dias, são a prova de que infelizmente não está.

África… quanto temos a aprender com você…


Fonte: Negrobelchior**.

Somos Todas Cláudias



A campanha Somos Todas Cláudias nasce da mobilização de mulheres negras no Distrito Federal, que marcam sua posição diante do assassinato de Claudia Silva Ferreira. Arrastada por 250 metros por uma viatura policial, Claudia teve seu corpo vilipendiado em imagens que denunciam o racismo e o espaço da negação da humanidade de negros e negras nesse país. Por isso, nos próximos 25 dias, percorremos esse trajeto de dor experimentado por Claudia como um grito de resistência, solidariedade e amor.


Porque somos mulheres, porque somos negras, porque Somos Todas Cláudias!


O corpo negro arrastado e sem vida: Nem direitos, nem humano


“Depois de rolar lá de dentro e ficar pendurado no para-choque do veículo apenas por um pedaço de roupa, o corpo de uma mulher foi arrastado por cerca de 250 metros, batendo contra o asfalto conforme o veículo fazia ultrapassagens. Apesar de alertados por pedestres e motoristas, os PMs não pararam”.


A descrição da cena, reproduzida em vários jornais, foi registrada por um cinegrafista amador. A imprensa de todo pais repercutiu e até a presidenta Dilma se manifestou.

Não acredito que existam seres humanos que não se comovam com algo tão brutal. Não pela morte, decorrência natural de nossa existência, mas pela forma como ela se dá. Aliás, discorrer não apenas de que maneira se dá a morte, mas de que maneira se dá a vida de determinados grupos sociais e étnicos pelo mundo afora, continua sendo infelizmente, motivo para muito debate.

Mas o que nos diz a improvável cena de um corpo negro, feminino, arrastado “feito saco”, feito qualquer coisa menos gente? O que nos diz a morte (ou assassinato?) precipitada, estúpida, violenta e covarde como a da mulher, negra, trabalhadora e mãe Claudia da Silva Ferreira?

A mim diz. E a quem mais quiser enxergar e ouvir: Diz sobre a lógica de um sistema de segurança pública a serviço de interesses privados e praticado a partir de valores violentamente racistas e machistas.

Se o corpo negro não fosse arrastado teria sido, ainda assim, atingido pela bala do policial. Mas por que, afinal de contas, a bala do fuzil do PM haveria de encontrar o corpo negro de Cláudia? Ela não estaria fora do perfil do bandido/traficante/perigoso/monstro, quase sempre jovem e negro? O relato de uma moradora, também registrado em vídeo, nos explica:

“Eles (os policiais) chegaram na maior covardia. Eles falaram que ela era traficante e que estava envolvida. (…) O único tiro saiu deles. Não teve confronto com traficante nenhum. Eles chegaram na comunidade num dia de lazer nosso. Era domingo de manhã…”

Não fosse o “acidente”, seria apenas mais uma incursão da polícia em um morro ou periferia qualquer do Rio de Janeiro. Seria mais uma troca de tiros com mais uma, duas ou dez vitimas quaisquer. Seria normal.

Não se trata aqui de repetir a lógica sensacionalista ou dizer que é um absurdo que um corpo seja arrastado por uma avenida. Trata-se de encontrar e dar consequência às respostas das seguintes perguntas:

O que os policiais estavam fazendo na comunidade?

Por que atiraram, já que há relatos de que não houve tiroteio algum?

Estavam a mando de quem? Ou os policiais não tem um comando? E quem comanda o comandante? E quem ou o quê apoia a política de quem está acima do comandante?

Ora, sabemos que a decisão fundamental é aquela da “ordem política”. Há uma política institucional que reproduz uma prática de ação policial em todo país. Os rostinhos tristes e lacrimejantes do governador e da presidente não podem ocultar a realidade: são eles os responsáveis pela política de segurança pública que, por sua vez, produz uma matança deliberada de negros e pobres todos os dias em todo o país. A morte de Cláudia choca pela forma como se deu, mas é considerada “margem de erro” para as ações do Estado. No dia a dia se mata aos montes e a grande mídia cuida de construir apoio popular para tal.

Me perdoem a pergunta, mas e se o corpo arrastado pelo carro da PM do Rio fosse um corpo branco? E se fosse um jovem de classe média vítima da truculência policial em uma das já corriqueiras manifestações de rua na capital carioca? E se a monstruosidade fosse promovida não pela PM, mas por menores infratores? Ainda é fresca a memória da tragédia do menino João Hélio (Em fevereiro de 2007 o menino de 7 anos estava no carro com a mãe em Madureira, na zona norte do Rio, quando quatro homens - entre eles um menor, renderam a mulher para roubar o carro. O menino tentou sair do veículo, mas ficou preso pelo cinto de segurança. Foi arrastado por sete quilômetros e morreu) Qual seria a reação da sociedade? Redução da maioridade penal? Leis mais severas? Pena de morte? Foi assim naquele período. E tem sido assim sempre que um “marginalzinho” comete atrocidades. Mas, e quando os promotores e responsáveis pelo crime são policiais, políticos e o Estado. Que fazer?

Algum Lenin aí?

O corpo negro arrastado e sem vida – Nem direitos, nem humanos.

Há tempos escrevi um texto com meu companheiro Jaime Amparo Alves, o qual recupero um trecho agora, mais que pertinente

“Qual o valor da vida negra em uma sociedade que se diz antirracista mas insiste em produzir padrões de vulnerabilidade à morte delineados por raça e classe social? Se levarmos em conta que entre nós permanece atualizada a máxima ‘direitos humanos para quem é humano’, fica fácil entender que a morte de negras e negros não suscita comoção porque este grupo social não tem sido visto nem pela lógica dos direitos nem pela lógica do humano; em outras palavras, é um grupo que carrega um ‘defeito de cor’ que lhe anula a possibilidade de um reconhecimento pleno e pertencimento à categoria do humano.

Temos insistido que é impossível entender a ‘necro-política racial brasileira sem levar em conta o lugar do corpo negro no projeto da nação verde-amarela. Se por um lado o corpo negro é consumido na figura da mulata tipo exportação, do homem negro hiper-sexual, do carnaval, do futebol, da favela e do candomblé como espaços do turismo exótico, por outro ele alimenta a imaginação racista branca como sinônimo do ‘mal’: criminoso, perverso, dependente do bolsa-família, favelado, fanqueiro, promíscuo. Haveríamos de nos perguntar então como é possível uma sociedade não racista, como nos quer fazer crer a grande mídia brasileira – capitaneada pela Rede Globo e pela Revista Veja e providencialmente coordenadas por uma intelectualidade treinada a partir das lições de Ali Kamel, Demétrio Magnoli e sua turma – conviver com tamanho paradoxo: ao mesmo tempo em que é impossível saber quem é negro e quem é branco no Brasil, negros são as principais vítimas da violência homicida, a maioria dos que apodrecem nas prisões, os alvos prediletos do terror policial e a maioria entre os empobrecidos e analfabetos. Em outras palavras, se os cínicos insistem em negar a existência do racismo no país, com um pouco de sensibilidade politica não nos parece ser difícil localizar onde estão os negros na hierarquia social brasileira. Os encontros mortais dos negros com o aparato policial, por si só deixa nu o argumento de que é impossível saber quem é negro e quem não é no país da democracia racial. A incrível capacidade da polícia em identificar o corpo negro nas invasões de favelas e a insidiosa disparidade nos números de homicídios entre a população jovem de ambas as raças, requer no mínimo que o discurso que nega a existência do racismo se sofistique.”

Fonte: Negrobelchior.

Misoginia x Misandria


Misoginia:
s.f. Sentimento de repulsa e/ou aversão às mulheres.
Repulsão excessiva do contato sexual com mulheres.
(Etm. do grego do grego misos: ódio e gene: mulher)

Misandria:
s.f. Medicina. Aversão patológica ao sexo masculino;
aversão ou ódio demonstrado pelo sexo masculino.
(Etm. do grego misos: ódio e andro: homem)

Definições simples que podem ser encontradas de formas ainda mais especificadas numa pesquisa rápida em qualquer dicionário online*.

De acordo com o vulto que as manifestações humanas tomam de tempos em tempos, é comum observar a popularidade que ganham certas palavras antes muito pouco usadas. Uma grande parcela dos homens (mesmo que pareça contraditório para um homem hétero), apresenta comportamento misógino, pois para que o machismo permaneça com a ‘superioridade masculina’, é preciso minar nossa confiança de alguma forma, para que permaneçamos em nosso devidos lugares.

Toda mulher sofre com o machismo e com a misoginia desde o momento que é reconhecida como tal. Se não no próprio ambiente familiar, no momento em que começa conviver em sociedade. Muitas se habituam aos comportamentos supracitados, e a eles nunca reagem. Algumas outras, sobretudo as que sofrem traumas mais profundos e lutam pela emancipação do gênero, desenvolvem um comportamento de resposta que vem sido classificado como misandria.

Mas como podemos classificar como misandria um comportamento que é apenas uma reação, uma resposta, ou mesmo uma defesa? (Acaso nós mulheres devemos aceitar caladas o tratamento que ainda recebemos em pleno século XXI, ou devemos nos comportar aceitando que somos o sexo frágil?)

Se a misandria existe, então por acaso isso anularia a carga do comportamento misógino que a mulher sofre desde sempre de forma ainda mais agressiva? A ‘ofensa’ que seria sofrida por um homem misógino não justificaria um comportamento equivalente, sobretudo em comparação ao que já foi, é, e será vivenciado por toda mulher. E isso inclui mesmo as que repudiam o comportamento ‘misândrico’, pois a vítima nunca, (NUNCA!) deve ser culpada e sim esclarecida e amparada.

Não entendamos por vítima o lado mais fraco, nenhuma mulher está salva de passar por certas situações, por mais forte que seja. Isso se torna propício pela aceitação das atitudes machistas e afins por parte sociedade, devido a manipulação nos invisibiliza e propaga ainda essa aceitação.

É fácil observar que tudo isso vem sob um disfarce de preocupação com a integridade, a feminilidade, a moral entre outros aspectos da própria mulher. E isso torna tudo muito mais difícil…

Nessas tentativas de inversão cada vez mais constantes, vemos deturpações enormes, como por exemplo dizer que toda feminista é misândrica, entre outras estereotipagens, além de alcunhas como ‘feminazi’ (esta em especial utiliza-se inclusive de forma bem humorada entre algumas feministas).

Porém uma massa de reacionários mais incautos, ou mesmo de misóginos treinados, acaba propagando uma imagem negativa e destrutiva, nos fragmentando cada vez mais. Estes, muitas vezes não assimilam que feminismo, é totalmente diferente de femismo**.

Mesmo tendo ciência de que existem frentes feministas mais incisivas, a inversão deve ser identificada e combatida! O mundo não é dividido entre femistas e machistas, misândricos e misóginos, e nem mesmo é preciso ser feminista para reconhecer certas situações. Algumas questões requerem apenas uma dose de bom senso!

Classificar a mulher como misândrica (e como machista), é o mesmo que classificar um negro como racista o que absolutamente não se aplica ao contexto em que vivemos. Num português mais claro: é uma tentativa escrota
de tirar o seu da reta.

Façamos algumas observações um simples: as mulheres sofrem assédio, agressões, retaliações nos ambientes mais diversos, e os autores destas ações talvez nunca receberão delas, ou de outras a mesma abordagem; Uma grande quantidade mulheres, entre elas feministas, possuem companheiros, filhos, pais, entre outros entes próximos, do sexo masculino e não apresentam um comportamento de ódio para com os mesmos, mesmo quando o recebem.

No entanto parece impossível para alguns observar, que se esse repúdio feminino está crescendo, é porque algo ainda o motiva. Mas ao invés de uma reforma destes falsos valores que apodrecem nossa sociedade, o que vemos cada vez mais é uma espécie de chumbo trocado.

Em tempo: as definições apresentadas logo a início do texto são justamente para escurecer que na prática não se trata de simples ódio ou repulsa, ou das intrigas frívolas que vemos internetê afora. A misoginia atua não só desta forma, como de modo a colocar as mulheres em posição de descrédito e autodepreciação, pelo simples fato de serem mulheres, além de pior, em conflito umas com as outras! É comum o descrédito por comportamentos que “deveriam” ser estritamente masculinos, e qualquer outra atitude considerada agressiva inconvencional da mulher.

É preciso atentar não só para a etimologia das nomenclaturas impostas, como para as tentativas de inversão de culpa que são colocadas para tentar nos confundir. Não se culpe por algo que não partiu de você! Machismo, misoginia e androcentrismo, são comportamentos que tem sempre acompanhado a sociedade, que ainda é baseada no domínio masculino, e nenhuma inversão pode abafar tudo aquilo que temos vivenciado.

*Considera-se a pesquisa feita para esse texto e a ausência dos termos
em alguns dicionários impressos.

**Antônimo de machismo.

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Anne Cristhine Dourado, ou melhor apenas Anne Dourado. Nascida em 19 de setembro de 1993, aspirante a poetisa, escritora, cantora, militante... Só aspirante mesmo. Mulher negra, consciente, crítica e sempre aprendendo.

Após ameaça, movimento #EuNaoMereçoSerEstuprada marca protesto coletivo online




As participantes do grupo Eu não mereço ser estuprada vão fazer a partir das 20h deste domingo (30) um protesto coletivo e virtual. Elas convidam os internautas a postar junto com elas fotos sem blusa e com mensagens de protesto. O movimento #EuNaoMereçoSerEstuprada (e suas variáveis #EuNaoMerecoSerEstuprada e #EuSouMinha) começou nas redes sociais, como Facebook, Instagram, Twitter eTumblr, após a pesquisa do Ipea (Instituto Econômico de Pesquisa Aplicada, do governo federal) indicar que 65% dos entrevistados acreditam que mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas.

A comunidade, formada assim que foi divulgado o resultado da pesquisa, na última quinta-feira (27), já tinha 35,7 mil inscritos na manhã deste domingo.

Uma das incentivadoras do movimento online, Nana Queiroz publicou ontem em sua página pessoal no Facebook que foi ameaçada após a iniciativa.

"Amanheci de uma noite conturbada. Acreditei na pesquisa do Ipea e experimentei na pele sua fúria. Homens me escreveram ameaçando me estuprar se me encontrassem na rua, mulheres escreveram desejando que eu fosse estuprada", dizia o post.

No grupo, ela postou orientações aos participantes de como denunciar aqueles que têm feito comentários agressivos e que podem ser entendidos como incitadores do estupro e da violência, o que é considerado crime.

Vários internautas estão ironizando o conteúdo divulgado pelas participantes, associando feministas a mulheres indesejadas, afirmando que mulheres deveriam andar armadas para não serem violentadas e lançando provocações, como "ninguém é estuprada em casa lavando a louça" e "o feminismo acaba quando chega a conta do restaurante".

Fonte: UOL

sexta-feira, 28 de março de 2014

Centenário de Carolina Maria de Jesus

Carolina Maria de Jesus
* 14/3/1914 - Sacramento (MG)
+ 13/2/1977 - São Paulo (SP)
Escritora / Compositora

por Laura Macedo,
Ainda está em tempo de comemorarmos o Centenário de Carolina Maria de Jesus, oriunda de uma família extremamente pobre que, contrariando todos os indicadores negativos (favelada, semi analfabeta, negra, catadora de lixo, mãe solteira...), tornou-se escritora/compositora.

Na década de 1930, já em São Paulo foi morar na favela do Canindé. Seu sustendo próprio e de seus três filhos foi exercendo a atividade de catadora de papel. No meio do lixo, Carolina, encontrou uma caderneta, onde passou a registrar seu cotidiano de favelada, em forma de diário.


Da esquerda para a direita: Carolina Maria de Jesus, Audálio Dantas (jornalista) e Ruth Souza. Foi o jornalista e repórter da Folha da Noite Audálio Dantas o descobridor da veia artística de Carolina Maria de Jesus.


Carolina teve suas anotações publicadas, em 1960, no livro "Quarto de Despejo", que vendeu mais de cem mil exemplares. A obra foi prefaciada pelo escritor italiano Alberto Moravia e traduzida para 29 idiomas. Também foi adaptado para o teatro e cinema.


Em 1961 lançou, pela RCA Victor, o disco – “Quarto de Despejo: Carolina Maria de Jesus cantando suas composições". O disco pode ser ouvido na íntegra aqui.

Carolina Maria de Jesus (1914 - 1977) - Heróis de Todo Mundo # Ruth de Souza.



Confesso que foi a partir do disco, citado em parágrafos anteriores, meu interesse em pesquisar mais um pouco acerca da história pessoal e artística de Carolina Maria de Jesus. Apesar do meu mergulho raso apaixonei-me por ela e sua história. Desejo que a história de vida de Carolina Maria de Jesus não caia no esquecimento e engendre o aparecimento de várias outras "Carolinas" que, certamente, estão esperando uma oportunidade de mostrar suas artes ao país e ao mundo.


Diálogos - Mulheres Negras, Pluralidades, Saberes e Resistências: #SomosTodasCláudias! (29/03)

SEPPIR lança Edital para implementação do Sistema de Promoção da Igualdade Racial


Propostas podem ser inseridas no Siconv até 25 de abril de 2014, com foco no fortalecimento institucional e apoio a políticas voltadas para a juventude negra

Visando à implementação do Sistema Nacional de Promoção da Igualdade (Sinapir), a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (SEPPIR/PR), lança hoje (27/03) a Chamada Pública N° 01/2014. Até 25 de abril, Estados e Municípios poderão apresentar propostas pelo Sistema de Convênios do Governo Federal (www.convenios.gov.br).

As propostas deverão contemplar duas áreas temáticas: Fortalecimento institucional de Órgãos, Conselhos, Ouvidorias Permanentes e Fóruns voltados para a Promoção da Igualdade Racial; e Apoio às políticas transversais e de ações afirmativas voltadas à juventude negra. Para a primeira área temática serão disponibilizados R$ 2.746.398,00, divididos em recursos de capital e custeio. Para a segunda área temática, serão disponibilizados R$ 400.000,00, exclusivamente para custeio.

Estados e Municípios deverão atentar para a necessidade de que todas as propostas estejam em conformidade com o “Manual de Orientação para Celebração de Convênios com Entidades Públicas”, disponibilizado pela SEPPIR/PR no Portal dos Convênios (www.convenios.gov.br). As propostas serão avaliadas segundo a qualidade técnica e a situação social da população negra da localidade onde a ação será implementada. A previsão é de que no dia 11 de junho todas as propostas já tenham sido avaliadas, possibilitando a celebração dos convênios.

Segundo a Assessora de Assuntos Federativos da SEPPIR, Eunice Léa Moraes, o objetivo da chamada é a descentralização, o fortalecimento, a integração e a ampliação das políticas públicas de enfrentamento ao racismo e de promoção da igualdade racial no Brasil. “Esse Edital representa um importante passo para o fortalecimento da institucionalidade das políticas públicas destinadas à superação das desigualdades étnico-raciais no país”.

Os entes federados que já aderiram ao Sinapir terão pontuação adicional em suas propostas, conforme previsto na Portaria SEPPIR/PR nº 8, de fevereiro de 2014, que regulamenta os procedimentos para a adesão dos Estados, Distrito Federal e Municípios ao Sistema. A portaria traz ainda orientações e documentos necessários para o ingresso no Sinapir e define as modalidades de gestão para os participantes: Gestão Plena - somatório da pontuação obtida, multiplicado por 3; Gestão Intermediária - somatório da pontuação obtida, multiplicado por 2; Gestão Básica - somatório da pontuação obtida, multiplicado por 1,5.

Fonte: Seppir.

Hip Hop Possibilitando Futuros (28/03)


quinta-feira, 27 de março de 2014

Aprovado projeto que reserva 20% das vagas em concursos federais para negros


Cotas terão validade de dez anos a partir do momento em que o texto virar lei. Novas regras não se aplicarão a concursos que já tiverem editais publicados.

O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (26) o Projeto de Lei 6738/13, do Poder Executivo, que reserva 20% das vagas em concursos públicos da administração direta e indireta da União a candidatos negros que assim se declararem na inscrição. O texto teve o apoio de 314 deputados e o voto contrário de 36 deputados, com 6 abstenções. A proposta seguirá para o Senado.

A medida abrange os cargos efetivos e empregos públicos, inclusive em autarquias, fundações públicas, empresas públicas e sociedades de economia mista controladas pela União.

Os deputados rejeitaram todas as emendas apresentadas ao texto, inclusive duas aprovadas pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias, com parecer do deputado Pastor Marco Feliciano (PSC-SP). Uma delas estendia a reserva de vagas aos cargos em comissão da esfera federal e a outra subdividia a cota, nos concursos públicos, entre os que concluíram o ensino médio em escola privada (25%) e em escola pública (75%). As iniciativas dessas emendas partiram dos deputados Luiz Alberto (PT-BA), Janete Rocha Pietá (PT-SP) e Pastor Eurico (PSB-PE).

Dez anos de validade
Os editais já publicados quando a futura lei entrar em vigor não serão abrangidos pela nova regra, que terá a duração de dez anos.

A reserva deverá ser informada no edital e ocorrerá sempre que o número total de vagas for igual ou superior a três, ajustando-se a fração para o número inteiro seguinte (maior que 0,5) ou anterior (até 0,5).


A sistemática criada pelo projeto permite a um candidato negro concorrer às vagas reservadas e também às demais vagas, exceto para pessoas com deficiência.

Dessa forma, o candidato negro poderá se enquadrar em um caso ou outro conforme sua classificação no concurso. Se um candidato negro ocupar uma vaga destinada à ampla concorrência, ela não será debitada do número de vagas reservadas.

Segundo o relator pela Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, deputado Vicentinho (PT-SP), as universidades que já aplicam o sistema de cotas avaliam que o aproveitamento dos negros é igual ou melhor que qualquer outro aluno branco ou “filho de rico”. “Este projeto é o resultado de uma luta de negros e brancos, que não aceitam a persistência das diferenças de oportunidades. O mínimo que essa Casa pode fazer é votar este projeto, que abre um caminho”, afirmou.

Vicentinho disse esperar que não seja necessário renovar o sistema de cotas depois de dez anos.

Autodeclaração
Segundo o projeto, poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE).

Se, posteriormente, for constatado que a declaração é falsa, o candidato será eliminado do concurso ou, se nomeado, a contratação será anulada. Nesse processo, deverá ser assegurado a ele o contraditório e a ampla defesa, mas se ficar comprovada a falsidade, o candidato poderá sofrer outras sanções cabíveis na esfera jurídica.

Vagas redistribuídas
Caso não haja número de candidatos negros aprovados em montante igual às vagas reservadas, as remanescentes serão revertidas para a ampla concorrência e preenchidas segundo a ordem de classificação.

Caberá à Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial avaliar anualmente o cumprimento da sistemática.

Continua:

Íntegra da proposta:
Reportagem – Carol Siqueira
Edição – Pierre Triboli

Fonte: Camara.leg.br.

“Isso é comentário de mulher mal-comida”, disse o “homem de verdade”



Por: Leonardo Sakamoto,
- Tá tão bom esse jantar que você já pode casar!

A frase pousou na mesa de jantar tão leve quanto é possível para um golden retriever sujo e molhado, que sai correndo do jardim e, sem muita noção do próprio tamanho, lambuza todos à sua volta.

A bem da verdade, ela recebera a contragosto aqueles convidados. Pedido do chefe, que queria usar a sua melhor repórter para aumentar o interesse do pessoal da área comercial e de agências de publicidade com o jornalismo online que produziam. Então, reuniu velhos amigos para uma conversa sobre perspectivas do mercado digital – ou alguma abobrinha semelhante – e pediu o favor.

O problema é que ela não era a sua melhor repórter à toa.

- Oi, como disse?
- Que tá tão bom esse jantar que você já pode até casar.
- Desculpe, não entendi.
- Ah, é uma expressão antiga. Você já tem tudo que se espera...
- ... de uma mulher?
- Não de uma boa...
- ...dona de casa?
- Não, de alguém que...
- ... que existe para servi-lo?

Percebendo aonde isso ia dar, o chefe tentou jogar panos quentes.

- Quando se cansar do jornalismo, a Clarice* pode abrir um restaurante!

Mas aí já era tarde demais.

Dado os comentários que o incômodo convidado fez, mangando da reação da anfitriã, os papeis já haviam sido identificados. E se ele fosse desempenhar o do "porco", ela não ficaria na plateia batendo palmas como a "submissa".

Após o jantar e a sobremesa, todos foram para a sala de estar a fim de beber e jogar conversa fora. Lá, o convidado, para provocar ainda mais, começou a cometer impropérios sobre o lugar do homem e da mulher, piadinhas a respeito do gênero de produtos de limpeza e reflexões sobre o que é ser um "homem de verdade" nesse mundo confuso.

O único momento em que se dirigiu a Clarice foi para perguntar:

- Poxa, mas meu cálice está seco há um século.
- Desculpe! Mas como você está falando besteira há tanto tempo, achei que já havia bebido demais.
- Isso é comentário de mulher mal-comi...

Antes que pudesse terminar a frase, um cálice de tinto chileno – de boa safra, diga-se de passagem – voou em sua camisa branca. E algumas pessoas que estavam no jantar, mesmo com a memória afetada pelo álcool, juram que tudo teria terminado em furdúncio se o sujeito não tivesse sido controlado pelos demais.

- Vagabunda! Mulher não me trata assim – esbravejou, antes de sair porta afora e noite adentro.
- Acostume-se, o mundo mudou! – ainda gritou ela.

O chefe ponderou com ela que, apesar do cara ser um idiota, ela deveria se controlar mais:

- Por sorte, ele não era de uma agência grande...
- Não, você não está entendendo. Por sorte, o que eu tinha na mão era uma taça de vinho, não alguma coisa pesada ou cortante.

Ouvi a história de um dos envolvidos e achei interessante contar. Porque a reação de alguns dos presentes foi de que ela se destemperou e não de que o maluco em questão havia extrapolado os limites da convivência. De que foi "errado" e "violento" jogar o vinho nele, que só estava "dando sua opinião" sobre esses assuntos. Manchar uma camisa é violência. Reafirmar simbolicamente o machismo que mata, decepa, esfola e machuca, não.

Eu sei, eu sei... Mundo bizarro este em que vivemos.

A verdade é que a percepção de que ele estava errado só vai entrar na cabeça de algumas pessoas quando mais cenas como essa ocorrerem. Silêncio ou risinhos envergonhados são respostas mais fáceis no curto prazo. Enfrentar e contestar, por outro lado, mudam tudo.

(*) Troquei o nome real para Clarice porque adoro a Clarice Lispector.

Maioria dos menores infratores no DF é negra, tem entre 16 e 18 anos e possuem baixa renda, diz pesquisa



Dados da Codeplan mostram que maioria mora em Ceilândia e baixa escolaridade

Jovens entre 16 e 18 anos, negros, de baixa renda, e moradores de regiões administrativas afastadas do Plano Piloto. Esse é o perfil dos adolescentes que integram o Sistema Socioeducativo de acordo com estudo da Codeplan (Companhia de Planejamento do Distrito Federal). A radiografia do sistema entrevistou 1,1 mil indivíduos e mostrou uma realidade até então sem mapeamento

De acordo com a secretária da Criança, Rejane Pitanga, o DF é a primeira unidade da Federação a realizar essa pesquisa. 

— Para nós é, na verdade, um censo que será usado para embasar as políticas públicas, ainda mais neste momento tão importante em que o GDF faz a reestruturação do sistema socioeducativo e que derruba uma das piores unidades do país, que é o Caje. 

Pelo estudo da Codeplan, denominado “Perfil e percepção social dos adolescentes em medida socioeducativa no DF”, 80% dos jovens que cumprem medidas de internação se declararam negros. Em todas as unidades, de todas as categorias de medidas socioeducativas - semiliberdade, liberdade assistida, dentre outras -, os percentuais de negros são superiores ao da população em geral no Distrito Federal, que fica em torno de 55%. 

Em relação à moradia dos internos, Ceilândia, com 20,2%, apareceu em primeiro lugar, seguida de Samambaia, com 13,4%, e Recanto das Emas, com 8,3%. Em casa, 40% dos adolescentes conviviam apenas com a mãe; 13,7% com companheiro(a); e apenas 1,1% morava com o pai e a madrasta. 

Segundo o diretor de Estudos e Políticas Sociais da Codeplan, Osvaldo Russo, a ausência do pai contribui para que os adolescentes estejam envolvidos com atos infracionais. 

— Na medida em que a família falha, a responsabilidade do Estado aumenta, por isso é necessário o trabalho de prevenção, que é feito basicamente com educação, emprego e proteção. 

Pelo documento, apenas 2,2% dos que estão em unidades de internação têm ensino médio completo ou superior incompleto. Nesse mesmo ambiente, 82% não possuem instrução ou têm apenas o ensino fundamental incompleto. No entanto, esse índice, na liberdade assistida, cai para 61,6%. 

De acordo com Rejane Pitanga, a pesquisa reforça pontos que já eram conhecidos das pessoas que lidam diariamente com os jovens do sistema socioeducativo local. Segundo ela, o estudo não servirá apenas para balizar políticas públicas, mas, também, para que a população conheça o perfil dos internos. 

— A sociedade precisa saber quem são, qual a renda familiar desses adolescentes, quais as suas preferências, quais os seus dramas, suas dores. Trabalhando com esses dados, podemos construir melhor um novo modelo nessa área e, consequentemente, vamos ter indicadores sociais mais positivos a médio e longo prazo. 

Com a nova política de ressocialização dos adolescentes em conflito com a lei, que contempla a desativação do antigo Caje e a transferência dos meninos para novas unidades, o GDF pretende, por exemplo, diminuir a reincidência. No estudo, 11,3% dos internos tiveram 11 ou mais passagens pelo sistema socioeducativo. 

Aspectos Gerais 

Os atos infracionais mais cometidos pelos jovens foram os análogos ao crime de roubo, com 42,1%; homicídio, 14,7%, e tentativa de homicídio, com 8,7%. Em relação à duração da medida, 47,3% passam mais de um ano internados. Apenas 13,4% passam de zero a dois meses recolhidos. 

Para o diretor da Codeplan, o aspecto que mais chama a atenção dos pesquisadores é a vontade dos internos terem um futuro melhor, com foco nos estudos. A área de informática é a preferida de 47,3%, enquanto 33,4% gostam de mecânica de automóveis. 

— Apesar de estarem privados de liberdade, há uma expectativa para o futuro. Com o novo sistema socioeducativo, temos uma perspectiva de ressocializá-los, com projetos efetivos de educação e cultura, e isso será bem aproveitado por eles.

Fonte: R7.

Luta contra o preconceito deve se traduzir em ações concretas, diz ministro

O ministro da Educação, Henrique Paim, disse (21), Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial, que é preciso traduzir todo o embate contra o preconceito em ações concretas.

“Precisamos, a partir da educação infantil, começar nossa verdadeira saga contra a discriminação racial e a valorização da África no Brasil”, disse. “A educação é um instrumento de formação social importante. O único que vai fazer com que tenhamos redenção. Ela é libertadora, especialmente para nós, afro-brasileiros”, defendeu o ministro durante o lançamento de materiais pedagógicos sobre história e cultura africana

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O ministro da Educação, Henrique Paim, participa do lançamento de materiais pedagógicos sobre história e cultura da África Marcelo Camargo/Agência Brasil

Para ele, o lançamento do material representa um grande legado para o Brasil. Ao todo, 32 mil escolas vão receber as publicações, feitas em parceria com a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (Unesco).

O representante da Unesco no Brasil, Lucien Muñoz, lembrou que a discriminação racial assume diversas formas, mas que cada uma delas representa uma afronta aos direitos humanos e à dignidade. Para ele, a ampla circulação de informação estimula uma melhor aproximação de culturas, o respeito mútuo e o desenvolvimento de uma cultura de paz.

“Contribuir para a redução da discriminação racial no mundo e no Brasil produzindo conhecimento sobre a África e os afro-brasileiros tem sido um esforço que vem sendo desenvolvido nos últimos anos pela Unesco em estreita parceria com o MEC e a Universidade Federal de São Carlos.”

O secretário-executivo da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial, Giovanni Harvey, elogiou a parceria e cobrou que mais órgãos do governo federal se comprometam com o combate à discriminação racial e ao preconceito.

“Teremos um novo patamar quando a sociedade brasileira e os órgãos assumirem para si essa responsabilidade. Esse exemplo vai abrir caminho para que outros gestores públicos possam fazer o que o MEC está fazendo”, destacou.

A publicação Síntese da Coleção História Geral da África, dividida em dois volumes, pretende fornecer subsídios para pesquisadores e estudantes e para a prática pedagógica de professores da educação básica, com o objetivo de ampliar conhecimentos sobre a história e a cultura africana.

Já o livro História e Cultura Africana e Afro-Brasileira na Educação Infantil vai disponibilizar conteúdos para a formação e o conhecimento sobre a riqueza, as diferenças e a diversidade da história e da cultura africana e suas influências na história e na cultura do povo brasileiro.

De acordo com a secretária de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação, Macaé Maria Evaristo, o material abre caminho para a implementação da Lei n° 10.639 de 2003, que determina a inclusão de conteúdos sobre a história da cultura afro-brasileira e africana na educação básica.

“Estamos começando com um material específico para a educação infantil, mas vamos também entregar materiais para o ensino fundamental e o ensino médio”, disse. “É importante avançar nessas pautas dentro das escolas”, completou.

O embaixador da República do Zimbábue no Brasil, Thomas Bvuma, também elogiou o lançamento do material didático e lembrou que utilizar a educação como ferramenta para eliminar a discriminação racial permite ampliar o conhecimento e elevar a autoestima de quem sofre preconceito.

“Enquanto o mundo continuar a ter a pobreza ligada à cor e enquanto não houver educação multicultural universal, vamos continuar celebrando o Dia Nacional pela Eliminação da Discriminação Racial”, destacou.

quarta-feira, 26 de março de 2014

"Somos todas Cláudias": protesto contra racismo reúne 200 pessoas

Cerca de 200 pessoas se mobilizaram para chamar a atenção para a morte da auxiliar de serviços gerais Claudia da Silva Ferreira no Rio de Janeiro

Mulheres e homens ocupam escadas da Rodoviária do Plano Piloto para chamar a atenção para questões raciais e o crime no Rio de Janeiro

Em um ato político em solidariedade à morte da auxiliar de serviços gerais Cláudia da Silva Ferreira, cerca de 200 pessoas se reúnem na marcha "Somos todas Cláudias" na Rodoviária do Plano Piloto nesta terça-feira (25/3). Claudia foi baleada e arrastada em uma viatura por policiais no último domingo (16/3), no Rio de Janeiro.

O grupo está em frente à escada rolante da rodoviária. Alguns passageiros que precisam embarcar na rodoviária enfrentam dificuldades para acessar a plataforma.

O movimento saiu da Praça Zumbi dos Palmares, no Conic (Setor de Diversão Sul). As duas vias que ligam o Conic à rodoviária ficaram bloqueadas por alguns minutos. A organizadora do evento, Cris Pereira, disse que o ato serve para homenagear Cláudia, que morreu de "forma truculenta".

Em solidariedade, grupo se reuniu na Praça Zumbi dos Palmares, no Conic
Os manifestantes cantaram músicas em homenagem à vítima e distribuem fotos dela. Mulheres vestem camisas com a mensagem: "sou negra, em caso de emergência não deixe a polícia "socorrer". Mais tarde gritavam "sem hipocrisia, essa polícia mata negro todo dia".

A produtora executiva Gabriela Fernandes, 27 anos, referiu-se à repercurssão da morte de Cláudia como "um fato que ganhou magnitude justamente porque alguém filmou, mas existem outros casos em que as pessoas morrem e ninguém sabe, o Brasil tem que abrir os olhos para isso".

Crime bárbaro
A auxiliar de serviços gerais levou dois tiros de fuzil durante uma operação policial no Morro da Congonha, em Madureira, Zona Norte do Rio. Segundo testemunhas, ela ainda estava viva quando foi socorrida por policiais militares e levada ao hospital. No trajeto, o porta-malas do camburão se abriu e Cláudia, pendurada pela roupa, foi arrastada no asfalto por, pelo menos, 350 metros. 
(Com informaões de Daniela Garcia)

Ocupar a Universidade: Cotas! É o nosso povo colorindo a educação brasileira!


Se tem algo que me da profundo tesão, é conhecer novas universidades.

Parece engraçado, mas chega a ser um vício… Conhecer novas universidades, pra mim, é um misto de curiosidade, mistério, tesão. Os espaços de construção do conhecimento sempre me despertaram o sonho e a esperança, vontade de algo novo. Mas as universidades, para além disso, tem algo de assustador.

Quando era criança, ficava atônita ao entrar em alguma escola diferente. Quando passava em frente, queria saber tudo sobre aquela escola. Chegava a sonhar com elas. Um costume talvez estranho.

Lembro da primeira vez que entrei em uma universidade…. na Feevale, em Novo Hamburgo. Eu estava na oitava serie, e queria fazer meu Ensino Médio na escola de aplicação de lá… O que não foi possível pois eu não podia pagar pelo curso, visto que era uma escola privada. Mais tarde, fui atendida durante alguns meses no setor de fisioterapia, nas piscinas da Feevale. Foi um tempo bom, eu me sentia realmente importante por passar livremente por aquelas portas.

Depois, voltei à essa universidade, no terceiro ano do Ensino Médio, para fazer um vestibular simulado e depois no ano seguinte, o ENEM. Foi a primeira vez que senti a ansiedade em realizar uma prova importante: mas eu sabia que as provas que viriam pela frente, determinariam meu futuro.

Quando resolvi prestar vestibular, me inscrevi na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), na cidade vizinha a que eu morava. Eu considerava o curso de historia dessa universidade melhor, devido a sua estrutura (sobretudo por ter a maior biblioteca da AL) e pela recomendação dos meus professores.

Não cogitei tentar a federal (que ficava em Porto Alegre, há uns 40km de onde eu morava). Achei que seria muito difícil passar no vestibular, sempre ouvi que a universidade seria diurna, que não havia como escolher turnos para as aulas, ocasionando que eu não teria condições de trabalhar, teria possivelmente que mudar de cidade e minha família não tinha como me custear sem trabalhar, visto que eu já estava no mercado de trabalho desde o colégio.

O pior: estava entrando em debate as tais das cotas. Fiquei revoltada: porque eu iria estudar em uma universidade que no vestibular diz que sou inferior, que eu preciso de cotas para ingressar… Eu era severamente contas as cotas!

Nunca uma “boa” aluna, mas sempre me virei bem, tinha boas notas e raramente me dedicava a estudar fora da escola, gostava de literatura: lia muito, mas não ficava horas estudando como minhas colegas.

Lembro que uma pessoa disse que eu deveria tentar. Que a UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) não era algo inatingível. Mas preferi ouvir todas as outras que disseram que não valia à pena, afinal, eu não tinha chance mesmo, e na universidade privada, estudando a noite, eu poderia seguir trabalhando de dia para pagar pela minha formação, nada mais justo, certo? Errado!

Durante mais de três séculos, nesse país o meu povo ficou do lado de fora do ensino regular, assim como ficou à margem do acesso a emprego, saúde de qualidade e a garantia doa direitos básicos para sobrevivência.

Mas meu povo resistiu! E através do Movimento Negro organizado, vem lutando pelo direito ao acesso a educação, enquanto massificamos as taxas de evasão escolar, de mortalidade infantil e materna, além da morte precoce dos nossos meninos, que mortos ou encarcerados acabam desumanizados, deixando de ser gente, tornando-se apenas estatísticas.

Sem me dar conta disso tudo, pisei pela primeira vez na Unisinos no dia do vestibular. Ao lado da minha melhor amiga percebemos que aquele era o primeiro dia do resto das nossas vidas. Aquela era uma das poucas certezas que tinhas, que se confirmou. O medo, a incerteza, a curiosidade e a esperança tomavam conta do meu ser, e decidi que a partir daquele dia, a universidade me pertencia.

Que felicidade, passei no vestibular! Mas a universidade é particular! Por quatro longos anos fiz o possível e o impossível para me formar o quanto antes: comecei matriculada em poucas cadeiras, financiei e fiz muitas, cancelei o financiamento, fui para a iniciação científica, arrumei trabalho dentro da universidade e finalmente, me formei: historiadora. A filha da empregada com o calderista, lá do fundo da vila, a primeira da família com ensino superior.

Ai alguém me disse: tu estava certa, se tu mulher, negra, pobre, trabalhadora, da vila conseguiu, cotas pra quê? Respondo, cotas sim, porque sou exceção, lamentavelmente, não sou a regra.

Quando em um curso de 300 estudantes, menos de cinco deles são negros não somos regra, somos exceção! Não se trata de questionar a capacidade alheia, como pensei, mas de criar oportunidades que nos motivem ao ingresso na universidade, que por ser pública é nosso direito. Não precisamos trabalhar para sustentar empresários do setor da educação, mas gozar do direito ao acesso ao ensino público, pelo qual pagamos diariamente e, forma de impostos, e ao mesmo tempo, menos se 5% do orçamento da União são dedicados para isso.

Hoje, já no final do mestrado em Ciências Sociais, já atuando no Ensino Superior, militante e consciente do meu papel na sociedade, e da importância que o a minha titulação têm para a população negra entendo o tanto que perdi acreditando no discurso do senso comum de que a universidade pública não era lugar pra mim.

Na noite da minha formatura na graduação, fui a oradora da turma de 2011/02. Naquela oportunidade, agradeci os meus ancestrais, pois hoje, sempre que entro em uma universidade, levou meu povo comigo.

Mas cada vez que entrei em qualquer universidade, pública ou privada, mas sobretudo nas federais, lembrei do meu povo analfabeto, pobre e marginalizado, que entra junto comigo sempre que eu piso em uma grande instituição de ensino. Por isso, entre tantos sentimentos, uma certeza: assim como os que vieram antes de mim, preciso abrir caminho para os que virão.

Mesmo que eu não tenha sido cotista, as cotas são um direito e a garantia de que nosso povo vai ocupar e colorir a universidade.

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Letícia Maria é historiadora, mestranda em ciências sociais e militante. Escreve também em Memórias de uma Motoqueira Solitária e Movimento Contestação.

UnB deve decidir sobre sistema de cotas até abril

Imagem da Universidade de Brasília: reitor da UnB, Ivan Camargo, garantiu que o assunto será votado antes do próximo vestibular da instituição.

Universidade de Brasília, a primeira federal a adotar o sistema de cotas, deve decidir se vai aderir exclusivamente à lei

Brasília - A Universidade de Brasília (UnB) deve decidir, no próximo dia 3 de abril, se vai aderir exclusivamente à Lei de Cotas (Lei 12.711) para o ingresso de estudantes negrosindígenas ou se manterá parte da política de inclusão criada pela própria instituição há dez anos, combinando as regras previstas nas duas normas.

A decisão deveria ter sido divulgada no último dia 13 pelo Conselho de Ensino Pesquisa e Extensão (Cepe) da universidade, mas foi adiada depois que estudantes pediram mais tempo para discutir as alternativas.

O reitor da UnB, Ivan Camargo, garantiu que o assunto será votado antes do próximo vestibular da instituição.

No ano passado, quando a política de cotas da universidade completou uma década, uma comissão formada por professores da UnB concluiu um relatório, com análise de pesquisas e dados do Centro de Seleção e de Promoção de Eventos (Cespe), da Secretaria de Assuntos Acadêmicos (SAA) e do Centro de Informática da UnB (CPD), que aponta que os resultados da política de cotas da universidade é positivo.

“Com as cotas, a UnB escolheu o caminho certo e o debate nacional que se instalou desde então confirmou esse acerto. Do ponto de vista acadêmico, o rendimento dos estudantes formados, em todas as áreas do conhecimento, não varia muito entre cotistas e aqueles que ingressaram pelo sistema universal. Além disso, os dados mostram a expressiva quantidade de estudantes negros que não teriam ingressado na UnB se não houvesse a possibilidade de concorrência pelo referido sistema de cotas”, destacaram os integrantes da comissão.

No documento, a comissão recomenda que a UnB opte por uma solução mista: a reserva de metade das vagas para alunos de escolas públicas - previsto na Lei de Cotas - e a reserva exclusiva para negros, independentemente da situação socioeconômica, como ocorre atualmente, mas reduzindo o percentual de 20% para 5%.

A Universidade de Brasília foi a primeira a adotar uma política de reserva de vagas. Quase 4 mil alunos entraram na instituição por meio do sistema de cotas raciais e 2 mil ex-alunos foram beneficiados pela política.

O grupo aponta, pelo menos, duas razões para essa alternativa.

A primeira delas é que, apesar de terem se passado dez anos, o plano de metas definido pela UnB em 2003 ainda não foi totalmente alcançado. “A UnB já inclui, em 2012, um total de 41% de estudantes negros, contudo, a população de pretos e pardos no Brasil, como um todo, é 50%, e no Distrito Federal é 56%, o que significa dizer que se o sistema de cotas for interrompido, a igualdade racial proposta pelo plano de metas não será alcançada em sua plenitude”, afirmaram os professores.

Fonte:Exame.