Um passeio pela elegante rua Oscar Freire, em São Paulo, acabou em constrangimento e racismo para a família de Jonathan Duran. Em uma publicação no Facebook, feita no último sábado, ele contou que foi expulso da frente da loja da marca Animale enquanto falava ao telefone e acusou uma das vendedoras de racismo: “(Ela) chegou irritada e falou para mim: ‘Ele não pode vender coisas aqui!’. Olhei para ela sério e respondi: ‘Ele é meu filho’!”. O filho de Jonathan é negro. “Em certos lugares em São Paulo, a pele do seu filho não pode ter a cor errada”, desabafou.
O caso teve forte repercussão nas redes sociais e, por conta das diversas mensagens de apoio, curtidas (já somam quase 3 mil) e compartilhamentos que recebeu, Jonathan publicou mais considerações sobre o ocorrido na madrugada desta ultima terça-feira.
“Não importa quantas vezes você lê sobre esses casos de racismo, nada te prepara para o choque quando acontece com seu filho. Provavelmente vão dizer que foi um ‘mal-entendido’ (mesmo quando as crianças negras têm o azar dos mal-entendidos sempre acontecerem com elas). No entanto, minha preocupação é quando o ‘mal-entendido’ não é mais com uma vendedora de uma loja, mas com um policial armado”, afirmou.
"Estou procurando mudança social", diz pai de garoto vítima de racismo
Segundo Jonathan, ele e o filho estavam parados em frente à loja Animale para esperar a mulher, que estava em outro estabelecimento para comprar sapatos
Reprodução de post publicado por Jonathan: "Ele é meu filho", disse à vendedora que expulsou a criança
A situação pela qual passou o editor Jonathan Duran, 42 anos, em frente a uma loja na rua Oscar Freire, em São Paulo, repercutiu nas redes sociais e voltou a acender o debate sobre a discriminação racial no país. No relato na internet, ele acusa a vendedora de uma loja de ser racista com o filho, uma criança negra de 8 anos, ao tentar expulsar o garoto da frente do local, após confundi-lo com um ambulante. Para especialistas ouvidos pelo Correio, a história evidencia um preconceito enraizado no Brasil e ressaltaram a importância de se denunciar e expor os casos.
Segundo Jonathan, ele e o filho estavam parados em frente à loja Animale para esperar a mulher, que estava em outro estabelecimento para comprar sapatos. Enquanto ele falava ao telefone com a companheira, uma funcionária tentou expulsar o filho do local. “A vendedora chegou e falou brava: ‘Não pode vender coisas aqui!”, contou. Jonathan disse que, antes de ir embora, limitou-se a informar: “Ele é meu filho”. Na mensagem publicada no sábado em redes sociais, Jonathan, que é norte-americano, desabafou: “Em certos lugares em São Paulo, a pele do seu filho não pode ter a cor errada”. O post tinha mais de mil compartilhamentos na tarde de ontem.
Na avaliação de Carlos Alberto de Paula, professor da Universidade de Brasília (UnB) e coordenador de Enfrentamento ao Racismo do Distrito Federal, o caso esvazia o argumento de que o problema se restringe meramente a uma discriminação econômica. “São situações que evidenciam um aumento crucial em torno da discriminação. As evidências são recorrentes. A eterna renitência de que a questão passa só pelo econômico se esvazia quando ocorre em campo demarcado à circulação de determinado grupo social, como a Oscar Freire”, disse. Para o professor, as questões racial e social caminham juntas, e os constantes relatos de discriminação servem para derrubar a hipótese de que o Brasil não é um país racista.
“Esse aspecto é danoso e precisa ser discutido. Não se pode achar que estamos vivendo num país maravilhoso com aquele discurso da cultura paradisíaca em que todas as culturas se encontram e convivem em paz. Se existe esse discurso, ele deve ser discutido”, disse o professor do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da UnB Nelson Inocêncio.
Na avaliação dos especialistas, é fundamental que o caso seja denunciado à polícia. Ao Correio, Jonathan disse que ainda não decidiu se fará uma ocorrência na polícia, mas afirmou que pretende continuar falando sobre o assunto para estimular o debate sobre a questão racial. “No fundo, o que estou procurando é uma mudança social”, disse. Por meio de nota, a Animale informou que entrou em contato com o pai, que repudia qualquer ato de discriminação e que apura o caso internamente.
“São situações que evidenciam um aumento crucial em torno da discriminação. As evidências são recorrentes”
Carlos Alberto de Paula, coordenador de Enfrentamento ao Racismo do DF.
“Isso é alimentado por uma mídia onde negro só aparece como bandido ou coitadinho, nunca como médico, engenheiro, executivo, cientista, etc. Os casos de racismo contra crianças que aparecem na imprensa costumam ser de famílias de classe média-alta/classe alta, e/ou onde pelo menos um dos pais é estrangeiro. E todos os outros casos que acontecem todos os dias?”, publicou.
Através de sua assessoria de imprensa, a Animale afirmou que “já entrou em contato com Jonathan Duran e reitera que repudia qualquer ato de discriminação. O caso está sendo apurado internamente”.
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Memória
Relembre alguns casos recentes de racismo que tiveram ampla repercussão
Agosto de 2014
» O goleiro Aranha, do Santos, foi alvo de ofensas racistas de torcedores do Grêmio durante partida em Porto Alegre. Uma torcedora foi identificada por câmeras de segurança e foi hostilizada pela população.
Fevereiro de 2014
» A cobradora Claudinei Gomes, 33 anos, foi xingada de “negra ordinária e preta safada” por uma passageira, no trajeto Santa Maria/M Norte
» Uma australiana, residente no país há cinco anos, recusou-se a fazer as unhas com uma manicure negra, em um salão da 115 Sul, a quem ofendeu de “raça ruim”, e exigiu que a profissional ficasse longe dela. Levada à 1ª DP, a estrangeira repetiu as agressões contra uma agente negra da Polícia Civil.
Outubro de 2013
» O contador Kim Furtado foi chamado de “retardado” por uma caixa de banco ao tentar fazer um depósito de R$ 50 mil. A funcionária quis saber a origem do dinheiro e só acreditou em Kim quando um amigo branco confirmou a história do contador
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