A pedido dos três estudantes angolanos, que não querem que seus nomes sejam divulgados por momento, redigimos esta nota com objetivo de externalizar o gravíssimo caso.
Por Coletivo Negro USP,
Três estudantes universitários angolanos foram espancados por policiais militares na madrugada de domingo, 29/3, na região do Brás, em São Paulo, após uma briga com outros três jovens brancos, que segundo os angolanos, teriam feito provocações racistas.
Os universitários A.B. (PUC-RS), H.B. e E.G. (USP), todos de 24 anos, relataram que tinham acabado de sair de um bar nas proximidades da estação de metrô do Brás, onde muitos africanos costumam confratenizar nos finais de semana, e stavam caminhando pela calçada no sentido da estação, quando três jovens brancos, que passavam pelo local de taxi, começaram a insultá-los de dentro do carro.
“Hei preto, macaco, disseram-nos”, relatou H.B., que estava caminhando mais a frente dos outros dois, e disse que revidou com xingamentos. Logo em seguida, ele relata que os três jovens saíram do carro e partiram pra cima dele. Ao ver a situação, os outros dois angolanos que estavam mais atrás correram para ajudar o amigo, oque provocou uma grande briga entre eles.
H.B. diz que um deles tentou roubar o seu celular e o outro fingiu que estava portando uma arma na cintura e ameaçou sacá-la. “Mesmo assim nós fomos pra cima dele”.
Outros angolanos que estavam próximo ao local correram e apartaram a briga. Após este fato, A.B. diz que voltaram ao bar pra pedir à outros africanos que os acompanhassem até a estação em segurança. Mas quando retornaram ao local da briga, havia uma viatura da PM chegando com os três jovens que estavam no taxi.
“Um deles chegou apontando para nós e dizendo pros policiais ‘óh, foram eles, foram eles!’”, observa H.B.. Segundo os estudantes, a polícia, sem ao menos buscar saber oque havia ocorrido, chegou apontando as armas e, mesmo depois quando eles já tinham mostrado os documentos, começaram a agredí-los gratuitamente.
A.B. conta que a polícia também começou a agredir os outros angolanos que estavam ao redor: “Alguns gritavam ‘são só estudantes, párem de bater, não precisam fazer isso’, mas eles não pararam e foram pra cima dos que estavam em volta olhando.”
Perplexo, H.B. diz que não conseguiu entender até agora por que aconteceu tudo aquilo. “A polícia nem quis saber oque realmente ocorreu. Acreditou nos três rapazes que nos insultaram. E quando quisemos dizer que aquilo era injusto e desnecessário, eles [os policiais] nos bateram mais”.
Inconformado, E.G. conta que nunca passou por nada disso, e não entende o por que a polícia agiu daquela forma, uma vez que eles não reagiram.
“Nos mandaram ficar na parede e mostrar nossos documentos. Mas quando estávamos mostrando, um deles começou a agredir o A.B.. Daí, eu pedi para que eles parassem de bater, mas outros [policiais] foram pra cima de mim, me derrubou no chão e pisou em minha cabeça”.
Inconformado, o estudante H.B. afirma que teve seu corpo todo pisoteado, enquanto via o rosto de seu amigo, que levou quatro pontos na testa, ser arrastado pela calçada coberto de sangue. O terceiro estudante teve seu dedo quebrado ao proteger o rosto do cassetete, além de surras levadas e um ferimento na cabeça.
“Feche os olhos e morra!”
Segundo os estudantes, as agressões e ameaças seguiram dentro das viaturas no trajeto.
E.G., o único encaminhado ao hospital, conta, com voz embargada, que estava algemado, sangrando abundantemente e com muita dificuldade em respirar. Ao pedir socorro aos policiais, ouviu a seguinte frase: “feche os olhos e morra!”
Auto-agressão e desacato
Um dos estudantes relatou que presenciou um dos policiais rasgando a própria farda e quebrando o próprio relógio, para acusá-los no boletim de ocorrência. Além disso, eles estranharam os procedimentos usados para levá-los à delegacia. “Nos separaram em três viaturas. Não há motivo pra isso. Fiquei muito assustado, eles deram várias voltas [conosco]. Não sabia oque iriam fazer [conosco], pensei que iam dar sumiço em nós”, relatou um dos estudantes.
Os estudantes foram levados ao 8o DP, no Brás, onde foram autuados por desacato.
Convênio Internacional
Os estudantes fazem parte do programa PEC-G, um convênio internacional entre o Brasil e vários países em desenvolvimento, gerido pelos ministérios da educação e do exterior, que proporciona bolsas de estudos em cursos de graduação por diversas universidade do país.
Longe de ser uma exceção, o presente caso é mais um exemplo do tratamento do Estado brasileiro para com os negros, sejam eles brasileiros ou não. Estes estudantes poderiam estar dentro da triste estatística do genocídio negro. Talves não estejam, por serem estrangeiros.
Além da violência gratuita da polícia, há elementos de racismo institucional e ferimento dos direitos humanos. Os três estudantes estão sob a responsabilidade diplomática de nosso país, que necessita, desta forma, tomar providências urgentes sobre o caso, garantir segurança a eles e punir os responsáveis por esta barbárie.
Casos parecidos
Em maio de 2012, no mesmo local, ocorreu uma briga entre brasileiros e angolanos. A ocasião resultou com a morte da angolana Zulmira de Souza Borges, 26, estudante de engenharia. Até hoje o caso não obteve respostas.
No mesmo ano, em Porto Alegre (RS) dois estudantes universitários africanos, um da República Democrática do Congo e outro do Benin, foram autuados por um policial militar e obrigados a descer do ônibus. Na abordagem um policial negro teria dito a seguinte frase “Vocês não sabem que isso no Brasil sempre aconteceu e vai acontecer de novo?”. Após a denúncia dos estudantes na na mídia, o caso foi investigado e os policiais envolvidos foram absolvidos, tendo a sua ação caracterizada como “abordagem técnica”.
Fonte: Geledés.
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