por Monique Evelle,
Associação Brasileira de Magistrados, Promotores de Justiça e Defensores Públicos da Infância e da Juventude – ABMP entende que o disposto no art. 228 da Constituição Federal deve ser mantido, uma vez que consentâneo com os fundamentos do Estado Democrático de Direito e da República, que residem, entre outros, na cidadania e na dignidade da pessoa humana.
Todavia, novamente, está tramitando o projeto de lei que tem como objetivo, diminuir a idade da imputabilidade penal (PEC 171, de 1993, em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados).
De tempos em tempos a sociedade, impulsionada pela escalada da violência e pela sensação de insegurança, retoma a discussão acerca da redução da maioridade penal, divergindo sobre a idade em que a pessoa deveria ser considerada imputável, havendo quem defenda o patamar de 14 ou 16 anos, bem como quem pretenda a adoção do critério biopsicológico para avaliação da capacidade de entender e de querer do autor.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) afirma a inimputabilidade penal dos adolescentes com idade inferior a 18 anos, mas tal afirmação nada mais é do que a repetição do texto constitucional, já que este consagra, em seu artigo 228, a inimputabilidade dos menores de 18 anos. A Convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas, ratificada pelo Brasil, também reafirma o direito à Proteção Integral da criança e do adolescente.
Merece ressaltar que esse princípio constitucional da Proteção Integral promove a quebra do paradigma da incapacidade, porquanto, pelo ECA, o adolescente responde penalmente pelos atos por ele praticados se considerados infracionais, sob a interpretação do art. 103 que define o ato infracional como “a conduta descrita como crime ou contravenção penal”, através de medidas socioeducativas adequadas à prática de cada ato. Decorre que, inimputabilidade não implica em impunidade, que é a falta de punição ou de aplicação da sanção penal. Não significa irresponsabilidade pessoal ou social. O ato infracional deve ser entendido como fruto de desvios sociais, na perspectiva de “outsiders” (BECKER, 2008), muito mais pela invisibilidade das razões das práticas infracionais, da falta de investigação sobre a conduta moral e o “modus vivendi”, entendidos como a inteligência moral revelada através de seus hábitos e costumes, como testemunha da moral dos adultos ou da ausência desta, responsável pela formação da cultura da juventude – alienação moral aberta ou disfarçada de diversas maneiras.
Portanto, a ABMP no uso de suas atribuições legais REPUDIA qualquer iniciativa de deslegitimar os direitos da criança e do adolescente no Brasil, principalmente quando se trata da Redução da Maioridade Penal, uma garantia constitucional, por acreditar que esses sujeitos (os adolescentes) estão em situação peculiar de desenvolvimento e, que por isso necessitam de uma atenção maior do Estado no desenvolvimento de políticas públicas eficazes e eficientes que atendam suas necessidades básicas em termos da assistência social, educação, cultura, esporte, lazer, habitação e fortalecimento dos vínculos familiares, entre outros, pois, de modo geral, a ineficiência das mesmas está aproximando cada vez mais crianças e adolescentes de graves problemas sociais como a violência, tráfico de drogas, etc., que geram como consequência o conflito com a lei.
Assim, a ABMP não acredita que seja uma iniciativa promotora da cidadania para adolescentes colocá-los no Sistema Prisional, pois a redução da idade penal apenas levaria ao início prematuro e precoce da convivência, em um mesmo ambiente de pessoas ainda em formação (adolescentes de 16 e 17 anos) com aqueles de maioridade, que, inclusive, muitas vezes utilizam os adolescentes para prática de seus atos ilícitos.
A ABMP reafirma sua convicção que é preciso aperfeiçoar as medidas socioeducativas, a fim de que as mesmas promovam a verdadeira inclusão social dos adolescentes, de forma que a sociedade brasileira de fato cumpra com seu dever de construir uma sociedade inclusiva e democrática. Aliás, esse processo já se iniciou com a vigência da Lei nº 12.594/2012, conhecida como SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo e se intensificará com a implementação inclusive dos Planos Decenais de Atendimento Socioeducativo pelos Municípios, Estados e União.
Ademais, a proposta de redução da idade penal é inconstitucional, já que a imputabilidade penal corresponde cláusula pétrea, isto é, insuscetível de modificação por via de emenda, conforme artigo 60, § 4º, da Constituição Federal (assim: “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda constitucional tendente a abolir: … IV – os direitos e garantias individuais”), tendo, inclusive, o Supremo Tribunal Federal já se posicionado favoravelmente pela existência de direitos inviduais fora do rol exemplificativo do artigo 5º da Constituição Federal.
A ABMP defende que este é o caminho que deve subsidiar as discussões sobre os adolescentes em conflito com a lei, que precisam efetivamente de uma atenção maior do Estado, de seus Poderes, da família e da sociedade, conforme previsto nas normativas nacionais e internacionais adotadas pelo Brasil, com seus princípios e estandartes para preservar a defesa intransigente da garantia da Proteção Internacional dos Direitos Humanos das crianças e dos adolescentes.
Fonte: desabafosocial.
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