Foto: Felipe Scapino
Manifesto Crespo: Encontro em aldeia guarani, em SP, compartilha costumes ancestrais e luta contra estereótipos da indústria da moda
Por Vanessa Cancian, do Namu,
No extremo sul da cidade de São Paulo, na aldeia Tenondé Porã, onde vive parte da comunidade guarani, o coletivo Manifesto Crespo, formado por mulheres negras, promoveu o evento “Tecendo e trançando arte”. O projeto, criado com a finalidade de discutir a beleza verdadeira da mulher brasileira através da quebra dos estereótipos que predominamna moda e na mídia, levou até a comunidade indígena oficinas e atividades de troca de saberes entre as mulheres presentes.
Dentro de uma área de Mata Atlântica ainda preservada, as mulheres se uniram para compartilhar costumes ancestrais e colocar em contato essas etnias diferentes, mas com históricos comuns de luta, sofrimento e resistência. Em um ambiente marcado pela diversidade, anfitriãs e visitantes fortaleceram os laços que historicamente unem as duas culturas.
Foto: Marina Fontanelli
“O encontro nesse ambiente, junto aos povos originários foi escolhido porque a aldeia conta com a Jerá Guarani, uma liderança feminina que nos dá orgulho e que sabe que no passado existia muita união entre as comunidades negra e indígena”, afirma Lúcia Udemezue, membra doManifesto Crespo. Segundo ela, o ativismo de Jerá Guarani em diversos movimentos políticos fortalece a participação feminina na aldeia. “Nós acreditamos que as pautas das nossas lutas se encontram de alguma maneira e estamos juntos defendendo uma bandeira maior, em busca igualdade pra que seja feita a justiça que não foi feita há séculos em nosso país”, completa Udemezue.
Foto: Semayat Oliveira
“Ao aprender as amarrações para carregar os filhos percebi que nós fazemos da mesma forma que os negros. Dá pra ver a semelhança entre a sabedoria milenar presente nas duas partes”, diz Poty Porã, mulher guarani e professora da escola da aldeia. Segundo ela, foi gratificante participar das atividades e aprender a fazer turbantes e outras amarrações que foram ensinadas pelas integrantes do grupo.
Bonito é ser diferente
“As histórias das mulheres negras brasileiras possuem relatos semelhantes: quando crianças tinham o cabelo trançado pelos familiares, na juventude alisava e na idade adulta, há a busca por assumir os crespos”, conta Denise Souza, educadora e integrante do Manifesto Crespo. Para ela, as vivências organizadas encontram pontos em comum, independente do lugar onde seja aplicada.
Foto: Nathália Kamura
“A mídia, atualmente, mostra sua agressividade porque estamos reagindo. Quanto mais a gente combater, mais virá essa força contrária”, conta Lúcia Udemezue. O projeto se propõe a mostrar a beleza da diversidade e da mulher negra, na luta contra a mídia e a publicidade monocromática que insiste em explicitar em propagandas, filmes e novelas um único tipo de mulher, de pele branca e cabelos lisos.
Foto: Nathália Kamura
“Quando fazemos esse tipo de atividade dá pra ver que o olhar das pessoas muda e elas começam a enxergar a cultura negra de outra forma”, pontua Thays Quadros, produtora do projeto. Ela conta que o intuito do coletivo é passar as técnicas de tranças e turbantes de geração em geração, incentivando as crianças a aprenderem essas tradições. “Quando uma criança conhece a outra cultura, sabendo sobre as diferenças vai olhar com outros olhos e apreciar a beleza da diversidade. Para combater o racismo é preciso ensinar as pessoas a respeitar as diferenças”, completa.
Trançando e tecendo arte
Em 2014, o Manifesto Crespo, em parceria com a União Popular de Mulheres do Campo Limpo, foi contemplado com o “Prêmio Lélia Gonzalez – protagonismo de organizações de mulheres negras”. A iniciativa propõe a realização do resgate da cultura artística das tranças e turbantes afro em 5 cidades do estado, que contam lideranças femininas representativas e tradições ligadas a cultura africana no Brasil.
Foto: Felipe Scapino
“Nosso projeto começou com um grupo de mulheres jovens e negras que se reuniram para discutir a questão de identidade através do cabelo”, conta Lucia Udemezue. O impulso inicial para o nascimento do coletivo veio, segundo ela, das dificuldades de aceitação do cabelo crespo. “Começamos a juntar várias experiências para montar um projeto de cunho artístico, pedagógico e também político. Para assim, criar um ambiente em que a gente pudesse compartilhar as experiências e ouvir das mulheres como elas não aceitas em sociedade por conta de um padrão de beleza imposto”, completa.
Fonte: Negrobelchior.
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