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quinta-feira, 3 de abril de 2014

Você ainda tem dúvidas sobre as cotas na UnB?


As cotas na UnB existem faz 10 anos e na época que elas foram implantadas, ficou decidido que 10 anos depois revisariam a política. Semana passada houve um CEPE que analisaria a questão. O CEPE (Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão) é uma entidade deliberativa da UnB que reúne representantes das faculdades/institutos/departamentos da Universidade, mais os representantes discentes da pós e da graduação. Foi o mesmo órgão que aprovou as cotas em 2004. 

A única proposta dos conselheiros neste último CEPE que considerava a manutenção das cotas raciais reservava só 5% das vagas pra negras e negros. Hoje são 20%. A UnB foi vanguarda no Brasil ao implementar essas cotas. Esses 20%, valor determinado em 2004, seriam aplicados a todas as vagas da UnB, mas na verdade só incidiram sobre o vestibular, não no PAS. Os 5% seriam pra compensar esse valor que não foi preenchido. 

Os 5% hoje seriam adicionais à chamada Lei de Cotas (Lei nº 12.711). A lei é bem recente (de 2012) e é federal, ou seja, é aplicada a todas as universidades públicas. Ela funciona assim: 50% das vagas são reservadas pra cotas sociais (estudante de escola pública com renda familiar de 1,5 salário mínimo), e 56% delas (ou seja, 28% do total) são para negras e negros. O valor 56% é proporcional à quantidade de "negros e pardos" no DF. A lei também não prevê nenhum critério de avaliação além da auto declaração, o que permite que qualquer pessoa, ainda que branca, se inscreva como cotista. O processo na UnB previa inicialmente envio de foto para a banca avaliadora, e posteriormente se instituiu a entrevista. Caso a candidata ou candidato não se satisfizesse com o resultado, poderia pedir recurso. Hoje não há mais foto ou entrevista devido à lei.

Na prática isso exclui os negros e negras de classe média, os das escolas particulares, os bolsistas pobres de escolas particulares, os que estudam em escolas públicas e que não se encaixam no critério de renda da lei. Sobre as escolas particulares, é importante lembrar que ainda que a aluna ou aluno não tenha estudado em uma delas durante toda a sua vida escolar, ainda que por um mês, não serão abrangidos pelo processo. E mais, as escolas particulares brasileiras tem os mais diversos perfis e atendem aos mais variados públicos - bem como as públicas (exemplos distoantes são os Colégios Militares brasileiros, que tem um padrão competitivo de educação e atendem parte da elite). O efeito é potencialmente o de retirar espaço de pessoas negras da universidade e separar negras e negros "ricos" de "pobres". Além de excluir muita gente, essa vinculação necessária das cotas sociais com as raciais associa o racismo à pobreza, como se ele não fosse um problema que afeta a população negra como um todo. 

Hoje, com 20% de cotas na UnB, somente 11% dos estudantes são negras e negros. Antes não chegavam a 2%, o que demonstra a importância da política. Esse percentual ainda é bem distante da meta de 20% estabelecida pelo CEPE 10 anos atrás.

Mesmo com esses 20% reservados, parte das vagas não são preenchidas e vão para aquelas vagas remanescentes. Reduzindo as vagas reservadas para 5% (caso o percentual seja aprovado), menos negros ainda entrarão. É importante lembrar que foi decidido em CEB que o ENEM para a UnB terá nota mínima de 350 pontos por etapa (característica exclusiva da UnB), o que limita mais ainda o ingresso - lembrando que todas as vagas da Lei de Cotas para negras e negros são parte das cotas sociais, porque teoricamente teriam mais dificuldade de aprovação. Ou seja, mais vagas ociosas, não preenchidas por pessoas pretas. Se nem os 5% forem aprovadas, somente as pessoas contempladas pelas cotas sociais poderão concorrer às cotas raciais.

Então o que se vai decidir é se manterão as cotas raciais, adicionais à Lei de Cotas (que só contempla negros pobres), ou retirarão as cotas raciais (sem critério social).

Apesar de fazer 10 anos que a revisão da política de cotas está prevista, e de fazer 1 ano que se discute a questão entre as conselheiras e conselheiros dos institutos (segundo a Reitoria), houve quase nenhuma publicização do fato para estudantes. Ficamos sabendo pouquíssimo tempo antes da data, e que fariam uma decisão tão importante.O CEPE acabou lotado de pessoas, várias do movimento estudantil, indignadas com a forma com que as coisas estavam sendo levadas. Notadamente a maioria era branca, o que reflete a falta de informação sobre a decisão, principalmente dos próprios cotistas da UnB. Um dos representantes discentes presentes sugeriu que se adiasse a votação para que se pudesse divulgar o que estava acontecendo. Havia várias dúvidas sobre o conteúdo da votação e a conjuntura real da política de cotas. Solicitaram uma audiência pública sobre o assunto, e decidiram adiar a deliberação para o dia 3 de abril. Não teria nem um mês de adiamento por conta do edital do 2/2014 que precisa ser lançado logo, já com o conteúdo dessa decisão. 

Ocorreu ontem a audiência pública, onde houve explicação do relatório dos 10 anos das cotas e manifestação de diversas pessoas sobre o assunto, desde estudantes militantes do movimento negro e indígenas, representantes de coletivos políticos da universidade, professores e professoras da universidade, membros da comissão do CEPE, inclusive o prof José Jorge de Carvalho, um dos idealizadores das cotas em 2004. Foi marcante a manifestação de estudantes indígenas - apesar da questão em discussão ser as cotas raciais - cuja invisibilidade e falta de apoio intensificam as barreiras da universidade.

Aguarde mais informações e não deixe de comparecer ao CEPE do dia 3 de abril na Reitoria!

Acesse aqui o Relatório: Dropbox/RelatorioSistemaCotasUnB

Confira aqui a Lei de Cotas: Lei_12711

E aqui, o documentário sobre a implantação das cotas: 
Parte 1 youtube.com/
Parte 2 youtube.com/
Parte 3 youtube.com/

Fonte: MariaCotista.

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