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quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Sobre Racismo à brasileira e a polêmica foto do bebê negro no carnaval!


Por Prof° Marcos Serra,
Antes de qualquer coisa, quero dizer que tive vontade de xingar o pai e a mãe pela agressão a que submeteram a inocente criança. Mas aí eu recorri ao bom senso e me calei. Não me calei para me calar! Como um bom professor e por tudo que represento para tanta gente (filhos, alunos, família, amigos etc.), me calei para em seguida provocar uma reflexão por aqui.

O casal em questão parece ser gente boa, pessoas legais, pelo o que pude observar nos comentários de seus amigos. Na verdade não duvido disso! E, sinceramente, o grande ERRO que percebo nas discussões Facebookianas, é esse ataque e defesa aos pais adotivos do menino. Enquanto uns dizem que "não tem nada demais", que "o casal adotou uma criança negra, logo não são racistas", "qual o problema com o macaquinho? Se fosse uma fantasia de gatinho ou outro animal qualquer, teria tanta polêmica?"; outros sentenciam: "racistas, desgraçados!", "adotam uma criança negra como um animal de estimação" etc.

Vamos lá... a reflexão que trago nesse momento, como tudo o que ocorre em sociedade, tem que ser percebida e analisada do ponto de vista histórico, filosófico e sociológico. Parece pretensioso né? Mas não é não. Esbarramos, mais uma vez, com a nossa paupérrima EDUCAÇÃO brasileira! Aliás, paupérrimo e cruel sistema educacional brasileiro! Se nos últimos 100 anos, o investimento em nossas escolas e em nossa política educacional fossem pela diversidade, entenderíamos que a história, filosofia, arte e cultura europeia (do colonizador) é apenas mais uma, dentre as indígenas e as africanas. Mas sequer aprendemos o que foi a colonização brasileira! Ainda acreditamos que fomos "descobertos"! Como expandir-se sem conhecimento? Para Einstein, nosso universo é do tamanho do nosso conhecimento. Daí, imaginem um conhecimento raso, manipulado, carregado de desinformação? Que "bicho" ia dar? Pois é... É nisso que deu!

No auge da superficialidade intelectual nascem os ignorantes e, mais adiante, os manipuladores (ou o contrário?). Não é à toa que o RACISMO em nosso país somente se consolida na injúria, na agressão, no ódio, enfim... o RACISMO aqui tem que ser intersubjetivo, ou seja, alguém branco tem que ofender alguém preto. Sim, isso tbm é RACISMO! Mas chamar, carinhosamente, uma criança preta de feijãozinho é afeto, RACISMO com "afeto" não existe, precisa de ódio, né? 

A questão é que o RACISMO brasileiro tem uma "roupagem" mais sutil do que cu de cobra. Oficialmente nos declaramos uma democracia racial, isso a bem pouco tempo na história - aliás, numa história que somou quase 400 de escravidão de pessoas negras, africanas e brasileiras! 

Não me canso de refletir: "Ora, será que dentre todas as famílias brancas que tinham negros escravizados, que os colocavam no tronco, nas correntes e tantas e tantas crueldades, não tinha ninguém gente boa?" É claro que tinha! "Então porque assim o faziam?" Por que não bastaria somente um sistema econômico escravagista, era preciso uma visão de mundo escravocrata, uma ideologia racista que sustentasse determinadas crueldades! A primeira delas deveria ser de cunho religioso, obviamente. Toda visão de mundo, toda cosmogonia, é intermediada pela religiosidade. Nesse sentido a igreja cumpriu seu papel quando determinou que aqueles corpos negros eram destituídos de alma, o que garantiria o bom sono das famílias gente boa!

Então o que tínhamos era a institucionalização da crueldade, que perpetuou a institucionalização do RACISMO. "Como é isso?" - você pode se perguntar. "É cruel pra cacete tbm!" - eu responderia. O racismo institucional brasileiro, ao contrário daquele que é decretadamente separatista (Apartheid da África do Sul e de estados dos EUA), propõe a invisibilidade do racista, atribuindo ao negro, principal vítima deste processo, como o principal responsável, aqui no face e na vida cotidiana tbm. Existe uma naturalização cruel! Se a maioria esmagadora dos presidiários são negros (as), a culpa são dos próprios negros (as)! Se a maioria das pessoas que vivem em situação de rua são negras, elas são culpadas! Se nas universidades os pretos são em números ínfimos, tbm são os responsáveis por isso! Mas aí, quando alguém que não é preto (a) esbarra com um (a) profissional preto (a) em um cargo "de elite", por exemplo, porque o espanto sempre ocorre? Por que não nos espantamos quando os vemos nos noticiários policiais, na guerra ao tráfico de drogas?

Essa falta de conhecimento realmente limita qualquer universo! Não há reflexão histórica! Não estudamos a riqueza da cultura africana e afro-brasileira, muito menos como se deu a lei áurea e suas graves consequências para a população negra desse país! Tudo em nome de uma ideologia que propaga a supremacia de quem nasceu ou descendeu da Europa. Complicado isso né? 


Aí me esbarro com a foto dessa família no carnaval e percebo o quanto estamos falidos em educação! O quanto nosso universo não se expandiu (caramba Einstein...)! O quanto nossos "umbigos" assumem a dianteira ao esbravejarmos pela liberdade de opinião, muitas vezes discriminatórias e sem conhecimento algum do que realmente ocorre! 

Quem é negro, principalmente nossas belas crianças e adolescentes, compreendem perfeitamente como os SÍMBOLOS carregam SIGNIFICADOS, positivos ou devastadores para a auto-estima, para as vidas em questão! Por mais que o pai da criança seja gente boa (nem quero discutir isso), tenha tido a melhor das intenções ao fantasiar seu filho de macaquinho do Aladim, ele não tem ideia do que isso representa para quem é preto. Ele não é preto! 

Eu acho o macaquinho super fofo, bem como o Snoopy e o Burro amigo do Shrek. Mas sei o que é ser chamado de mico, macaquinho, gorila, King Kong... Sei como isso doía... Sei como era ruim ter que rir junto com os coleguinhas para poder ser incluído. Não dá pra ignorar isso quando se é criança/adolescente! Por isso, é preciso compreender o RACISMO e combatê-lo, nunca, jamais, reproduzi-lo!

Suposição: será que quando esse menino estiver com mais idade, na escola, (e eu acredito que os pais o colocarão na melhor delas), ele vai exibir essa foto para a professora e os coleguinhas, quando for solicitada, por exemplo, uma fotografia com seus pais durante algum carnaval? E os coleguinhas, acharão fofo? Ninguém vai morrer de rir do menino, aludindo o macaquinho a sua pessoa? Espero sinceramente que não! 

Mas como não sou nada ingênuo, como não acredito no combate ao RACISMO com negros (as) se calando, ou brancos afirmando seus SÍMBOLOS incrustados em nossa sociedade, sigo na denúncia da subjetividade. 

Eu acredito naquilo que insistem que eu deixe de acreditar: a denúncia! 
Denunciar sempre! Investir numa educação que rompa com os estigmas e conte, de fato, nossas lindas histórias e filosofias!

Não devemos nos importar se nos acusam de chatos, politicamente corretos ao extremo, "vitimizados" etc.

Não devemos nos importar, pois entendo que este incomodo que estão sentindo com nossa afirmação, boicote, denúncia, "chatice", significa que estamos no caminho certo. O mito ideal da democracia racial brasileira (o papo da igualdade) é o negro calado, de preferência não levantando sua voz, sobretudo não erguendo sua cabeça! Por isso tantos pretos também naturalizam situações como a da foto, eles também tiveram que rir quando os chamavam de macaquinho.

O RACISMO deu muito certo por aqui!


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