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segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Candomblé é TRADIÇÃO, ANCESTRALIDADE, RESISTÊNCIA

Mae Menininha (front center). Courtesy Anacostia Community Museum/Smithsonian Institution

Pra começar, não há nada de descolado em ser de religião de matriz africana. Não é alternativo nem religião da moda. O que me espanta é ver como a nossa mídia ainda sustenta superficialidade e continua representando aspectos da cultura negra de maneira esvaziada, estereotipada, deturpada. Essas religiões tem tradição, fundamentos, regras na sua existência.

Quando você recebe um convite para ser entrevistada numa revista, não há garantias de como o conteúdo vai ser veiculado. Mas, associar a sua entrevista a uma reportagem que traz o Candomblé e a Umbanda como religiões da moda, e como se isso fizesse de você “alternativo” é lastimável. Precisamos nos retratar de outra forma, com criticidade e mais respeito. Querem falar sobre os jovens no Candomblé e da Umbanda? Identifique que essas são religiões de matriz africana, elas tem origem, elas tem tradição, memória, história, estrutura, que resistem de geração em geração, que são heranças culturais.

Difundir informações esvaziadas e estereotipadas é um desserviço, não soma em nada. Que nível de instrução e informação querem propagar e para quem? Essa é uma representação que não aceitamos mais calados. CHEGA! No teatro querem trazer blackface, na televisão, personagem “Africano” e na revista, fazer das nossas religiões um espaço para descolados. Isso porque o convencional seria ser adepto a alguma religião de matriz europeia?

ATÉ QUANDO ESSA IDEIA DO EXOTISMO VAI SER PROPAGADA?

A chegada às religiões de matriz africana deve ser feita com seriedade e respeito, independente das motivações de cada um. Penso também que adentrar numa vida de religião de matriz africana, conhecer toda a riqueza e complexidade que existem nelas implica em assumir uma conduta a favor do direito à equidade, já que essas religiões tem como eixo fundamental a coletividade e a pluralidade.

As religiões de matriz africana, o candomblé e a umbanda se mantêm vivas graças a muitaRESISTÊNCIA, elas enfrentam um racismo e discriminação secular. Quantas casas de candomblé são destruídas pela intolerância religiosa e violência? Quanto racismo se enfrenta dia a dia por fazer parte de uma religião de matriz africana? E que acolhe seus adeptos sem distinção de raça e de classe. Não adianta ser da umbanda e do candomblé e ser contra as cotas, ser a favor da repressão policial, achar que não precisa se atentar sobre o que as mulheres negras estão questionando. Estar numa religião de matriz africana significa estar junto às causas e lutas que assumimos, por um compromisso histórico, por empatia.

Sou nativa da Ilha de Itaparica, na Bahia. Minha família, especialmente meu Bisavô Cassimiro, se dedicou ao culto de Egungun e ancestralidade até a morte. Ele era Ojé (sacerdote) no culto a Egungun. O meu avô foi Ogan suspenso em Ogum durante muitos anos.

O candomblé faz parte da minha história desde criança. Eu sou filha de orixá, essa religião me fez nascer para minha espiritualidade. Nos inúmeros rituais do candomblé há preceitos, obrigações, hora pra iniciar os rituais, rezas, banhos, saudações. Os preceitos especialmente não são fáceis pra quem é jovem. Não foi pra mim.

Eu por exemplo, tive minha iniciação como filha de orixá aos 18 anos. Durante UM ANO, tive que viver em resguardo (momento dedicado para que os orixás exerçam proteção e influência direta para o iniciado). Nesse resguardo tive que durante 6 MESES me privar do sexo, do álcool, de algumas comidas específicas, oferendar meu orixá toda segunda feira, não pude frequentar festas, baladas, não podia ficar na rua depois da meia noite etc. São inúmeras regras fundamentais, referente a um exemplo dos tantos rituais existentes no Candomblé, poderia citar vários aqui. Não é brincadeira ser filho de orixá.

Não vejo como posso ser descolada por ter a minha fé, por ter uma religião familiar, passada de geração pra geração, como herança. Graças aos orixás, conheci um mundo novo. RESPEITEM NOSSAS HISTÓRIAS!

ESSA REPORTAGEM NÃO ME REPRESENTA, e não representa nenhuma religião de matriz africana!

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Imagem destacada: Blog Tambores da Alma

Nativa da Ilha de Itaparica na Bahia, mora em São Paulo, é assistente social, educadora, estudante de mestrado em Educação e integrante do coletivo Em Alto e Bom Tom, fundado pela atriz e assistente social, Mariana Miguel Avelino. Coletivo que se propõe a problematizar e ressignificar a representação da mulher negra na sociedade, principalmente nos meios de comunicação. Fazemos isso através da produção de projetos audiovisuais. A educação é um dos principais espaços de atuação do coletivo.

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