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quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Candidaturas negras apresentam propostas setoriais em roda de conversa em Brasília

Candidaturas apresentaram propostas para o povo negro no Distrito Federal. Foto: Daniela Luciana Silva.

Por Cecília Bizerra Sousa,
Na noite desta segunda-feira (22), no auditório do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal, foi realizada a Roda de Conversa “Candidaturas Negras ao Legislativo”. O evento foi promovido pela Irmandade Pretas Candangas com o objetivo de abrir, para as candidaturas negras do Distrito Federal, um espaço para a apresentação de propostas, planos de mandato e discussão de temáticas de interesse da população negra, como a baixa representatividade de negros e negras no Legislativo e alternativas para mudança deste quadro.

O evento, que priorizou o debate entre candidatas e candidatos do Distrito Federal que pleiteiam cargos no Legislativo, contou com a participação das candidaturas à Câmara Distrital da Assistente Social Lucimar (PT), Denízia Maria (PT) e Fábio Félix (PSOL); da candidata a deputada federal Mácia Teixeira (PSTU) e do candidato ao Senado Professor Robson (PSTU). “Pensamos nessa atividade para que as candidaturas negras tivessem a oportunidade de apresentar suas propostas ao eleitorado afro-descendente, sobretudo as propostas de mudança do atual quadro branco e masculino do poder Legislativo brasileiro”, afirma Raíssa Gomes, integrante da irmandade de Pretas Candangas que ficou responsável pela mediação do debate.

Para a Irmandade Pretas Candangas, a atividade foi rica e produtiva e foi possível discutir não todos, mas muitos dos que são muito caros para os movimentos negros, como a violência policial contra jovens negros, saúde da população negra, violência doméstica, a questão do aborto relacionada à saúde da mulher negra, redução da maioridade penal, cotas nas universidades, entre outros. “Estamos muito satisfeitas com o resultado, discutimos com certa profundidade e qualidade estes temas. Foi possível ter um bom panorama do que propõem as candidaturas negras do DF ao Legislativo e, a partir deste panorama, vamos refletir sobre os votos que iremos dar no dia 5 de outubro”, reflete Raíssa Gomes, que também comemora a avaliação positiva que candidatos e participantes fizeram ao final da atividade.

Sub-representação de negras e negros no parlamento

Os dados apresentados que no Seminário Desigualdades no Parlamento: Sub-representação e reforma do sistema político, promovido no dia 19 de setembro pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) foram relembrados no debate. Entre outros dados alarmantes, o estudo revela que as mulheres negras e indígenas são as menos representadas na composição do universo de candidaturas nas Eleições 2014.

Segundo a análise, primeiro vêm os homens brancos, seguidos de homens negros (pretos e pardos), depois mulheres brancas e, finalmente, mulheres negras e indígenas. Segundo a candidata Mácia Teixeira, a sub-representação dos negros e negras no Parlamento, bem como a não incorporação da questão racial em bandeiras de campanha se dá porque o racismo no Brasil é naturalizado, e a luta antirracista é considerada “perfumaria” ou exagero. “A luta é tão invisibilizada e tida como perfumaria, exagero, que temos candidatos negros que não se reivindicam como tal e não tem uma pauta voltada para isso”, destaca a candidata.

Candidata Mácia Teixeira. Foto: Daniela Luciana Silva

Disputa interna nos partidos

A dificuldade dos partidos políticos em abordar e priorizar a temática racial também foi discutida no debate. A candidata Lucimar ressaltou que faz há muito tempo essa disputa dentro do seu partido, a partir da Secretaria de combate ao racismo e que vivencia constantemente “quedas de braço”, pois, segundo ela, a liderança não apenas do seu partido, mas de muitos outros, está vinculada vinculados às candidaturas brancas. “É fundamental que os segmentos do movimento negro estejam organizados partidariamente para se fazerem representar. Uma questão que é um divisor de águas na participação política é por onde passam as decisões dentro dos partidos e quem define quem será candidato a majoritário, a distrital, a federal”, pontua Lucimar.

Candidata Assistente Social Lucimar. Foto; Daniela Luciana Silva

O candidato Fábio Félix também mencionou a dificuldade de se debater este tema dentro dos partidos políticos, inclusive os de esquerda. “Temos um setorial de negros e negras no PSOL, e ainda há muita dificuldade de mobilizar para este tema. Mas conseguimos fazer com que a candidata Luciana Genro pautasse isso no seu programa, ela assinou uma carta compromisso. Temos feito o debate, que é importante na campanha, incorporado com políticas sociais e em outras áreas”, afirma Fábio Félix.

Candidato Fábio Félix. Foto: Daniela Luciana Silva.

Legislação sobre trabalho doméstico

Para o candidato do PSTU ao Senado Federal, Professor Robson, é significativo que se tenha aprovado uma legislação sobre o trabalho doméstico que as equipare a trabalhadores de outras áreas, mas acha que isso devia ter sido feito há muito tempo. “Defendemos as propostas de legislação que coloca a trabalhadora doméstica como uma trabalhadora.Neste assunto, percebemos limitações na visão policlassista, pois muitas mulheres feministas defendem direitos pra elas, mas não para a empregada delas. Somos contra este retrocesso”, destaca o candidato que aproveita para fazer críticas ao atual governo e à candidatura de Marina Silva à presidência. “Temos que lutar contra as reformas trabalhistas colocadas pelo estado burguês. O PT, com 12 anos, não acabou com as propostas de reforma trabalhista. E agora a candidata Marina fala em rever o conceito de trabalho escravo. Pela força das mobilizações, precisamos impor a mudança que a gente quer”, finaliza Robson.

Candidato Professor Robson. Foto; Daniela Luciana Silva.

Intolerância religiosa e religiões de matriz africana

Sobre intolerância religiosa, a candidata Denízia Maria, que se apresentou como policial militar e pastora evangélica, foi questionada pela platéia sobre laicidade do Estado e intolerância religiosa em relação às religiões de matriz africana. Para a candidata, existe uma “cultura” que deve ser respeitada. “Gosto muito da falar: você pode não gostar de mim, mas você tem que me respeitar. Se todos são iguais, quem sou eu para colocar uma desigualdade entre eles? Todos tem que ser acolhidos, existe uma cultura e nós temos que se respeitar”, responde Denízia Maria.

Candidata Denízia Maria. Foto: Daniela Luciana Silva.

Descriminalização e legalização do aborto

A candidata do PT, Denízia Maria, também foi questionada sobre a criminalização do aborto e, surpreendendo a todas, respondeu sem titubear que o aborto não deve ser crime. “Eu tenho certeza de que nós mulheres temos que decidir o que tem que ser feito”, defende a candidata que afirmou já ter sido “menina de rua assaltante” (sic).

A candidata Lucimar (PT), também se posicionou pela descriminalização do aborto, apesar de ter manifestado a dificuldade de falar e se posicionar sobre o tema. A candidata justifica sua posição no fato de as mulheres negras serem as principais vítimas do aborto clandestino no país. “Esta é a primeira vez que falo em público sobre isto. Tenho dificuldade, por questões pessoais, de me colocar favorável ao aborto. Mas sou favorável à descriminalização do aborto. Nenhuma mulher tem que ser presa ou criminalizada por fazer aborto. A realidade nós sabemos muito bem, quem morre nos espaços de realização de abortos clandestinos são, em maioria, as mulheres negras”, posiciona-se a candidata, que defende que, assim, a mulher tenha o direito de decidir sobre o seu corpo.

A candidata Mácia Teixeira vai além e se diz a favor da legalização do aborto, destacando as questões de classe envolvidas na prática. “Quem tem dinheiro faz com toda segurança possível, quem não tem, morre com os açougueiros. É preciso deixar claro que legalizar não significa dizer que é obrigatório. Quem não quer, não faça, mas que seja permitido a quem quer o direito de fazer”, finaliza Mácia Teixeira.

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