por Fernanda Brigatti
O governo Bolsonaro encaminhou ao Congresso um projeto de lei que praticamente acaba com a política de cotas para pessoas com deficiência ou reabilitadas. O PL 6.159/2019 permite que as empresas substituam a contratação pelo pagamento de um valor correspondente a dois salários mínimos mensais.
Estão sujeitas às regras as empresas que têm cem ou mais funcionários.
Nesta terça-feira (3), Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, uma reunião na Câmara dos Deputados deve definir uma estratégia para barrar o avanço do projeto e derrubar a urgência com que ele está tramitando.
Para a vice-presidente da Ampid (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência e Idosos), a subprocuradora-geral do trabalho Maria Aparecida Gurgel, todo o projeto de lei é grave para as pessoas com deficiência. “Ele desconfigura toda a ação afirmativa que é a reserva de cargos”, afirma.
O projeto traz ainda outras mudanças em relação às cotas, como a contagem em dobro quando da contratação de um trabalhador com deficiência grave, e a inclusão de aprendizes nessa verificação.
“Essa regra [da deficiência grave] parece boa, pois as pessoas com deficiência grave são as que mais têm dificuldades para serem incluídas, mas no final das contas, quem é que vai dizer se é deficiência grave ou moderada?”, afirma Tabata Contri, da Talento Incluir, empresa que presta consultoria para inclusão.
O Ministério da Economia diz que o conjunto de mudanças deve beneficiar 1,25 milhão de trabalhadores.
O recolhimento mensal, no caso das empresas que não cumprirem a cota, será feito a uma conta da União, que abastecerá programa de reabilitação física e profissional. A criação dessa política de recuperação para o trabalho já era prevista na Medida Provisória 905, que criou o programa verde amarelo de estímulo ao emprego.
Tabata Cotri diz que a possibilidade de substituir o cumprimento da cota é contraproducente e preocupante. “Hoje você já tem empresas que preferem pagar a multa a fazer um esforço para cumprir a regra”, afirma.
Nos últimos três anos, a inclusão de trabalhadores com deficiência melhorou. De 418 mil, em 2016, eram 486 mil trabalhadores formais em 2018. Tabata diz que os números só começaram a melhorar a partir de 2015, após a definição de regras para a inclusão desses profissionais.
“A gente tá falando de 24% da população que tem alguma deficiência. Faz muito mais sentido que elas estejam trabalhando”, afirma.
Para o advogado Dario Rabay, da área trabalhista do escritório Mattos Filho, as mudanças do projeto de lei ajustam a regra à realidade, pois muitas empresas não conseguiam cumprir a cota, o que levava muitas ao fechamento de TACs (Termos de Ajustamento de Conduta) com o MPT (Ministério Público do Trabalho).
Ele diz que a Justiça do Trabalho tem jurisprudência favorável às empresas nos casos em que há a comprovação de ter havido esforço no cumprimento da cota.
Rabay considera positiva a criação de alternativas ao preenchimento dessas vagas. Além do pagamento, a possibilidade de duas empresas se associarem para compartilhar o cumprimento da cota.
A diretora da consultoria Santa Causa, Aline Morais, diz que as mudanças propostas são um retrocesso e têm perfil assistencialista.
Na nota de repúdio divulgada pela Ampid, a associação diz que o envio do projeto de lei viola a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, da qual o Brasil é signatário, e obrigaria o governo a consultar as pessoas com deficiência.
O Ministério de Economia diz, em nota, que a tramitação do projeto é o momento propício para a discussão. Afirma também que a medida pretende avançar na política de inclusão por duas formas alternativas de cumprimento.
Inclusão de trabalhadores com deficiência
Cota nas empresas
Como é hoje
Número de funcionários Percentual de reserva para trabalhadores com deficiência
- De 100 a 200 - 2%
- De 201 a 500 - 3%
- De 501 a 1.000 - 4%
- A partir de 1.001 - 5%
46,6 milhões de trabalhadores
486 mil eram pessoas com deficiência
> O PL 6.159 tramita em regime de urgência
Fonte: folha
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