Por Sara Joker,
Semana que passou falei sobre intolerância religiosa com minhas crianças, senti o quanto existia e ainda existe preconceito com religiões afro-brasileiras entre minhxs alunxs. É como se a grande maioria dxs negrxs que conheço tivesse preconceito com seus antepassados e a manifestação de fé desses antepassados. Risadas, comentários maldosos sobre “macumbeiros”, que colocam seu nome na boca do sapo, que fazem “magia negra” contra pessoas na encruzilhada.
Festa de comemoração ao dia de Iemanjá, no dia 8 de dezembro, na praia de Pajuçara. Imagem por Larissa Fontes.
O preconceito contra religiões afro é muito comum entre “cristãos”, medo do desconhecido? Racismo? O que me deixa mais intrigada é que esses “cristãos” (evangélicxs e católicxs) são, na sua maioria, negrxs e mestiçxs. Não que todxs xs “cristãos” sejam preconceituosxs, mas conheço uma boa maioria que olham atravessado para uma fé desconhecida.
Mas seria medo esse receio? Ou seria racismo? Conversei com as minhas crianças. Expliquei que toda religião é uma forma de Deus se manifestar no nosso coração, que Deus é sempre o mesmo. A maldade está no coração das pessoas, a falta de caráter não tem a ver com a sua religião.
Sei que muitas pessoas irão discordar de mim, mas acredito no oprimido com preconceito pelo seu igual, então acho normal ver negrxs racistas, mulheres machistas e homossexuais homofóbicxs. Vejo muitas mulheres negras que olham com preconceito para outras negras com o black ao natural, mas isso é assunto para quando eu decidir tirar um post para reclamar do racismo que aparece na ditadura estética, imposto também por mulheres negras para as próprias negras.
Explicar que centros espíritas de religiões afro não tem nada a ver com o diabo foi mais difícil que imaginava. Crianças ainda estão passíveis a mudanças de opinião. Tem algo que eu ainda não sei fazer, como ajo com adultxs? Como explico a adultxs que são meus conhecidxs que umbanda não é coisa do diabo, que quem frequenta terreiro não é um indivíduo que maltrata pessoas, que é sem caráter?
Como abrir a mente de adultos? Sempre acreditei no poder de mudança da criança e do adolescente em sua família. Acredito que posso tentar diminuir o racismo e a intolerância religiosa através das minhas crianças. Sempre que conversamos sobre cultura negra eu tento abrir mais a mente deles, diminuindo o preconceito e a intolerância e mostrando que eles são atores da transformação do mundo em relação a tudo.
Assumo que foram poucxs xs adultxs que consegui convencer até hoje, sou muito cabeça dura, então não consigo argumentar com algumxs desses adultxs. Com as crianças, me sinto menos acuada a mostrar minhas opiniões, pode ser pela transferência que elas têm comigo ou talvez por eu ser mais acostumada a conviver com jovens.
Só sei que aprendi a comer pelas beiradas, dividir para conquistar, falar primeiro com as crianças, chegar axs adolescentes e, no final, incentivar adolescentes e crianças falar sobre preconceito (seja ele qual for) dentro de casa, aos poucos, sem bater de frente com nenhumx adultx.
Sara Joker é feminista, artista, quadrinista, bissexual, mulher, negra de coração e cantora nas horas vagas.
Fonte: BlogueirasNegras.
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