Rapper lança 'Pedras, Flechas, Lanças, Espadas e Espelhos', disco que documenta jornada por fé e o direito de continuar sonhando
Por THIAGO ANTUNES ,
Rapper Thiago El Niño lança novo disco - Paulo Abreu / Divulgação
Por THIAGO ANTUNES ,
Depois de uma luta árdua, é preciso se recolher para refletir. Conversar consigo mesmo(a) para instrumentalizar novos saberes e, em outro momento, decidir as próximas ações. Nesse contexto de batalha e mudanças de paradigmas, o rapper Thiago Elniño lança seu segundo álbum de estúdio. 'Pedras, Flechas, Lanças, Espadas e Espelhos', representa a jornada do homem negro que quer o direito de continuar sonhando e faz ponte entre a ancestralidade do artista e a espiritualidade africana.
Em entrevista ao DIA, Thiago detalhou o processo de composição do álbum, suas azeitadas parcerias e contou sobre seus novos planos artísticos.
O DIA - Por que o nome 'Pedras, Flechas, Lanças, Espadas e Espelhos?
Thiago Elniño: Eu lancei um disco anterior chamado 'A Rotina do Pombo'. Foi um disco muito feliz, na mesma medida que me trouxe algumas frustrações. Teve um estudo intenso, busquei trabalhar com pessoas que queria. Eu ainda não tinha um alcance legal, mas o disco me apresentou dentro da cultura hip hop de uma forma muita positiva. Foi sucesso de crítica, sucesso entre artistas e produtores do rap, mas em termos de público não teve um alcance muito significativo.
O disco contava a história de um personagem, então me aproximei da galera do teatro para conseguir essa narrativa. Estava psicologicamente abalado quando saí do disco pelas dores que perpassavam o personagem e, nesse processo, eu pensei que não queria mais fazer um álbum. Eu não queria sucesso de crítica, queria sucesso de público, poder conversar com o povo preto que sofre o racismo que eu sofria. No início de 2018, houve uma crise carcerária no Norte do país. Ver a rebelião, aqueles homens degolados, principalmente negros, mexeu muito comigo. Isso me motivou a escrever e resolvi fazer um EP. Quando comecei a fazer, me vieram as dores e dos desconfortos do trabalho anterior, era um momento em que estava destruído. Então, resolvi parar para não me machucar.
Mas, na feitura do EP, saiu a música 'Filhos do Sol', que está nesse disco e narra a perspectiva de quem está de fora da cadeia, mandando uma mensagem para quem está dentro. A faixa foi chegando nas pessoas, dando esperança, felicidade e recebi retornos de gente que falava que a escutava para ir trabalhar, para ter força. Pensei: 'Isso é novo no meu trabalho'. Nunca tinha experimentado esse tipo de elogio e isso me despertou a vontade de produzir músicas no mesmo caminho.
Era um momento da minha vida que eu estava me aproximando do pan-africanismo, coisas relacionas ao Malcolm X. Ele tem uma frase que diz: 'Para o homem preto alcançar a autonomia, deve usar todas as armas necessárias'. No início do meu trabalho, tinha essa coisa do boompap, mais marcado e eu não me abria para sonoridades novas como o trap e o afrobeat. Vi que, através do funk, também posso conquistar um outro diálogo. Essas seriam minhas armas necessárias. O disco também é espaço de luta e fé, com a relações à umbanda, ao candomblé...que evoca uma energia e uma arma dos orixás, além de uma linguagem diferente. Por isso, 'Pedras, Flechas, Lanças, Espadas e Espelhos'.
Há muitas participações de destaque no disco, como Luedji Luna e Rincon Sapiência. Fale sobre isso
Acho que estamos na 'era das participações'. Acho que tem uma geração do rap é muito cheia de 'não me toque' e tradicionalismo. Eu tenho um lance que eu nunca começo uma música sabendo o jeito que ela vai terminar. Eu começo e deixo ela pedir o que ela precisa. Quando a música pede alguém e a pessoa em questão não estiver, a musica não vai sair, vou engavetar. Tenho músicas guardadas para Xênia França, por exemplo, por achar que a voz dela é a certa. Então, eu tive a sorte de construir músicas que dialogavam com essas pessoas, que também faziam parte do mesmo cenário. E são todas pessoas próximas, que eu frequento, converso, encontro para bater papo, tomar uma cerveja. Também tiveram casos em que alguém me falava: 'Fulano de tal gostaria de te conhecer' e as propostas casavam. E aí foi tudo acontecendo um pouco naturalmente.
Você comentou sobre luta e fé. Acha que também há um sentido de cuidado e proteção no disco?
Essa questão do pan-africanismo, de potencializar vozes, tem uma coisa do ambiente politico 'de peito aberto'. Toda ação tem uma reação e estamos vivendo uma reação muito forte. O momento do agora é que temos que nos defender e sermos estratégicos. Voltou a estar perigoso viver. Vejo muito o primeiro disco como um quilombo, os guerreiros saindo...neste agora os guerreiros estão voltando machucados, lutar não deu certo, é o momento da gente travar um diálogo entre a gente, de falar com a nossa espiritualidade, das relações com a mulher preta, ter uma conversa interna, um 'vamos se cuidar, vamos estar junto'.
Como estão os shows de lançamento?
Fizemos no Sesc Barra Mansa, a Luedji Luna conseguiu vir e todas as participações eram de mulheres pretas. Foi muito bonito. O show está bem bacana, respeitando a questão com a minhas espiritualidade, com percussões, uma apresentação nova...está bem bonito. As pessoas dançaram bastante, se divertiram.
E os planos para a turnê? Fará algo no Rio, São Paulo?
A gente não teve uma abertura tão setorizada, quando soltamos o disco falamos sobre a possibilidade de expandir. Temos shows marcados no Sul, vamos para Teresina, pro Nordeste...quando o disco saiu abriu essa possibilidade, principalmente em apresentações no Sul e Nordeste. Temos o Martché nos efeitos, dois percussionistas, a Ana Carolina, da festa Bafro, com DJs mulheres pretas, sendo DJ na turnê e a Natache, que também participa do disco, comandando as músicas, vocalistas...
O que você tem escutado e o que serviu de inspiração para o disco?
Tenho escutado agora esse momento de MCs no rap, com Djonga, BK', Sant, muito essa molecada que tem chegado. Lá fora tem J. Cole...mas muito do disco veio do Itamar Assumpção, o Jards Macalé, artistas ditos como 'malditos', o Luiz Melodia...Eu destaco o Itamar, o Marku Ribas. Além do Fela Kuti, que eu chamo de 'papai' (risos). A gente tinha essa proposta de colocar o povo para dançar e vimos isso no Sesc Barra Mansa. O Fela tem isso e um suingue que faz parte da gente.
O próximo disco será dançante, então?
Já estou na produção do próximo, inclusive. Durante o 'Pedras....', conheci o Alan e o Difunto Beats, que são de Campos e Macaé. Eles foram os caras que trouxeram o funk e o afrobeat. O disco já estava bonito, e eles jogaram tudo para uma força maior e viraram beatmakers oficiais no próximo trabalho. Acho que teremos muito mais melodias, de tornar o soul e o afrobeat mais recorrentes no que eu faço.
'Pedras, Flechas, Lanças, Espadas e Espelhos' está disponível nas plataformas de streaming e no Youtube
Em entrevista ao DIA, Thiago detalhou o processo de composição do álbum, suas azeitadas parcerias e contou sobre seus novos planos artísticos.
O DIA - Por que o nome 'Pedras, Flechas, Lanças, Espadas e Espelhos?
Thiago Elniño: Eu lancei um disco anterior chamado 'A Rotina do Pombo'. Foi um disco muito feliz, na mesma medida que me trouxe algumas frustrações. Teve um estudo intenso, busquei trabalhar com pessoas que queria. Eu ainda não tinha um alcance legal, mas o disco me apresentou dentro da cultura hip hop de uma forma muita positiva. Foi sucesso de crítica, sucesso entre artistas e produtores do rap, mas em termos de público não teve um alcance muito significativo.
O disco contava a história de um personagem, então me aproximei da galera do teatro para conseguir essa narrativa. Estava psicologicamente abalado quando saí do disco pelas dores que perpassavam o personagem e, nesse processo, eu pensei que não queria mais fazer um álbum. Eu não queria sucesso de crítica, queria sucesso de público, poder conversar com o povo preto que sofre o racismo que eu sofria. No início de 2018, houve uma crise carcerária no Norte do país. Ver a rebelião, aqueles homens degolados, principalmente negros, mexeu muito comigo. Isso me motivou a escrever e resolvi fazer um EP. Quando comecei a fazer, me vieram as dores e dos desconfortos do trabalho anterior, era um momento em que estava destruído. Então, resolvi parar para não me machucar.
Mas, na feitura do EP, saiu a música 'Filhos do Sol', que está nesse disco e narra a perspectiva de quem está de fora da cadeia, mandando uma mensagem para quem está dentro. A faixa foi chegando nas pessoas, dando esperança, felicidade e recebi retornos de gente que falava que a escutava para ir trabalhar, para ter força. Pensei: 'Isso é novo no meu trabalho'. Nunca tinha experimentado esse tipo de elogio e isso me despertou a vontade de produzir músicas no mesmo caminho.
Era um momento da minha vida que eu estava me aproximando do pan-africanismo, coisas relacionas ao Malcolm X. Ele tem uma frase que diz: 'Para o homem preto alcançar a autonomia, deve usar todas as armas necessárias'. No início do meu trabalho, tinha essa coisa do boompap, mais marcado e eu não me abria para sonoridades novas como o trap e o afrobeat. Vi que, através do funk, também posso conquistar um outro diálogo. Essas seriam minhas armas necessárias. O disco também é espaço de luta e fé, com a relações à umbanda, ao candomblé...que evoca uma energia e uma arma dos orixás, além de uma linguagem diferente. Por isso, 'Pedras, Flechas, Lanças, Espadas e Espelhos'.
Há muitas participações de destaque no disco, como Luedji Luna e Rincon Sapiência. Fale sobre isso
Acho que estamos na 'era das participações'. Acho que tem uma geração do rap é muito cheia de 'não me toque' e tradicionalismo. Eu tenho um lance que eu nunca começo uma música sabendo o jeito que ela vai terminar. Eu começo e deixo ela pedir o que ela precisa. Quando a música pede alguém e a pessoa em questão não estiver, a musica não vai sair, vou engavetar. Tenho músicas guardadas para Xênia França, por exemplo, por achar que a voz dela é a certa. Então, eu tive a sorte de construir músicas que dialogavam com essas pessoas, que também faziam parte do mesmo cenário. E são todas pessoas próximas, que eu frequento, converso, encontro para bater papo, tomar uma cerveja. Também tiveram casos em que alguém me falava: 'Fulano de tal gostaria de te conhecer' e as propostas casavam. E aí foi tudo acontecendo um pouco naturalmente.
Você comentou sobre luta e fé. Acha que também há um sentido de cuidado e proteção no disco?
Essa questão do pan-africanismo, de potencializar vozes, tem uma coisa do ambiente politico 'de peito aberto'. Toda ação tem uma reação e estamos vivendo uma reação muito forte. O momento do agora é que temos que nos defender e sermos estratégicos. Voltou a estar perigoso viver. Vejo muito o primeiro disco como um quilombo, os guerreiros saindo...neste agora os guerreiros estão voltando machucados, lutar não deu certo, é o momento da gente travar um diálogo entre a gente, de falar com a nossa espiritualidade, das relações com a mulher preta, ter uma conversa interna, um 'vamos se cuidar, vamos estar junto'.
Como estão os shows de lançamento?
Fizemos no Sesc Barra Mansa, a Luedji Luna conseguiu vir e todas as participações eram de mulheres pretas. Foi muito bonito. O show está bem bacana, respeitando a questão com a minhas espiritualidade, com percussões, uma apresentação nova...está bem bonito. As pessoas dançaram bastante, se divertiram.
E os planos para a turnê? Fará algo no Rio, São Paulo?
A gente não teve uma abertura tão setorizada, quando soltamos o disco falamos sobre a possibilidade de expandir. Temos shows marcados no Sul, vamos para Teresina, pro Nordeste...quando o disco saiu abriu essa possibilidade, principalmente em apresentações no Sul e Nordeste. Temos o Martché nos efeitos, dois percussionistas, a Ana Carolina, da festa Bafro, com DJs mulheres pretas, sendo DJ na turnê e a Natache, que também participa do disco, comandando as músicas, vocalistas...
O que você tem escutado e o que serviu de inspiração para o disco?
Tenho escutado agora esse momento de MCs no rap, com Djonga, BK', Sant, muito essa molecada que tem chegado. Lá fora tem J. Cole...mas muito do disco veio do Itamar Assumpção, o Jards Macalé, artistas ditos como 'malditos', o Luiz Melodia...Eu destaco o Itamar, o Marku Ribas. Além do Fela Kuti, que eu chamo de 'papai' (risos). A gente tinha essa proposta de colocar o povo para dançar e vimos isso no Sesc Barra Mansa. O Fela tem isso e um suingue que faz parte da gente.
O próximo disco será dançante, então?
Já estou na produção do próximo, inclusive. Durante o 'Pedras....', conheci o Alan e o Difunto Beats, que são de Campos e Macaé. Eles foram os caras que trouxeram o funk e o afrobeat. O disco já estava bonito, e eles jogaram tudo para uma força maior e viraram beatmakers oficiais no próximo trabalho. Acho que teremos muito mais melodias, de tornar o soul e o afrobeat mais recorrentes no que eu faço.
'Pedras, Flechas, Lanças, Espadas e Espelhos' está disponível nas plataformas de streaming e no Youtube
Fonte: odia
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