Por Tamara Naíz,
Uma nova questão se coloca para reflexão: a instituição de cotas étnicas e sociais para a pós-graduação. Democratizar o acesso significa assegurar mais perfis na pós-graduação brasileira. Não é tarefa fácil em um espaço onde a tal da “meritocracia” é a palavra mais valorizada –e garantir sua permanência também não é simples.
Estamos timidamente avançando, segundo dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE, recentemente divulgados: o número de estudantes negros (soma de pretos e pardos) no mestrado e no doutorado mais que duplicou de 2001 a 2013, passando de 48,5 mil para 112 mil, ainda.
Essa ampliação reflete um país que tem mudado, mas que ainda precisa avançar muito para a efetiva inclusão em variados níveis, os negros representem a maior parte da população (52,9%), já os pós-graduandos negros representam apenas 28,9% do total.
Ressalto ainda que esse aumento da participação de negros na pós reflete o crescimento da pós-graduação de modo geral. Ampliar a participação dos negros não significa apenas combater uma desigualdade e o racismo historicamente construídos e perpetuados ao longo da nossa história, mas também abrir a possibilidade para se combater de forma efetiva o racismo na academia, refletido, por exemplo, na limitação dos alcances das pesquisas realizadas.
Há também de se ampliar o alcance do conhecimento produzido, para que ele possa refletir a diversidade da nossa população e das nossas possibilidades de desenvolvimento.
A defesa de cotas étnicas e sociais na pós-graduação é uma defesa da Associação Nacional de Pós-graduandos, aprovada nas resoluções de seu 24°Congresso, já apresentada para o Governo Federal.
A iniciativa já está em curso em algumas localidades. O Rio de Janeiro destinou 12% para cotas étnicas e sociais, e a Universidade Federal de Goiás recentemente tornou-se a primeira instituição pública de ensino superior do país a aprovar as cotas de modo abrangente para toda a instituição. Serão ao menos 20% das vagas para negros e indígenas.
A partir das lutas do movimento negro, dos movimentos sociais de forma geral, dos acadêmicos, das reflexões e debates levantados sobre a temática, a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial deve apresentar uma proposta de cotas raciais para a pós-graduação ainda este semestre, com o intuito de que as instituições federais brasileiras garantam não apenas o ingresso, mas também o estudo de temas diversificados.
A proposta se baseia na Lei 12.711/12, conhecida como Lei de Cotas da graduação. Até 2016, 50% das vagas de universidades federais e instituições federais de ensino técnico de nível médio devem ser destinados à estudantes de escolas públicas, garantindo, também, reserva de vagas para negros.
A pós-graduação é por excelência um lugar de produção do conhecimento, de ciência, um lugar que se propõe a pesquisar, a se inquietar, a propor questões e soluções para a sociedade. Esse lugar, para se manter saudável, deve estar livre de certezas absolutas e verdades eternas, deve ambicionar o novo, valorizar a diversidade e todas as possibilidades que ela traz.
Desse modo, o estabelecimento das cotas na pós-graduação representa um grande avanço na luta por justiça social e por reparação em nosso país. Mas não apenas isso, significa a compreensão de que a Universidade é um local que deve refletir a sociedade nova que pretendemos construir, e não a manutenção das desigualdades que se perpetuam.
Significa ter na universidade gente diferente, que olha a sociedade de forma complexa, problematiza questões variadas e pensa soluções não óbvias, a partir de múltiplos olhares. Significa lançar mão de uma infinidade de futuros possíveis. Significa a ampliação e a ressignificação dos horizontes formativos. Significa abrir lugar para a inquietação, para o olhar curioso e transformador de quem acaba de chegar e traz um mundo de possibilidades.
Cotas, sejam bem vindas à pós-graduação!
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Tamara Naíz – Presidente da ANPG (Vermelho)
*Associação Nacional dos Pós-Graduandos (ANPG)
Fonte: Negrobelchior
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