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sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

Rap, pedagogia e transformação Heitor Valente expande atuação na cultura hip-hop

Foto: Coletivo DUCA

Além de compositor e músico, Heitor apresenta uma aptidão natural para a pedagogia e projetos sociais, o rapper de Ceilândia dedica-se a atividades voltadas para o desenvolvimento social a partir de projetos que tem a finalidade de profissionalizar, construir e compartilhar experiências e aprendizados com as comunidades por meio da cultura e educação, vista por ele como instrumento de transformação, libertação e principalmente emancipação.

Foi nesse contexto que nasceu a AREA (Associação Respeito e Atitude), uma organização não governamental na qual ele é presidente, e que tem o objetivo de organizar, criar e unificar ações voltadas para a juventude à partir de projetos sociais.

O principal expoente dessa gama de programas, foi o Projeto RAP (Ressocialização, Autonomia e Protagonismo), que utiliza esse estilo musical como uma ferramenta pedagógica de diálogo e estabelece uma relação profissional e colaborativa com os jovens em situação de vulnerabilidade nas unidades de internação e nas escolas do DF.

Foto: Dona Filmes

As atividades vinculadas ao projeto RAP são bem diversas, as ações que ja atenderam mais de mil jovens incluem saraus, festivais de música, debates, oficinas, rodas de conversa, cursos profissionalizantes como os de barbearia e manutenção de aparelhos celulares, além de ser responsável pela confecção de três produções literárias, um cd musical e um vídeo clipe que chegou a ser transmitido no festival de cinema de Brasília.

Em 2018 o Projeto RAP foi premiado pela UNICEF, órgão da Organização das Nações Unidas que tem como objetivo promover a defesa dos direitos das crianças, um reconhecimento importantíssimo aos trabalhos realizados e que qualificam a ong como uma das mais relevantes organizações não governamentais a nível nacional.

Hoje, além de presidir a AREA, Heitor é membro do conselho de Desenvolvimento Econômico Sustentável e Estratégico do Distrito Federal (CODESE), integrante do projeto LÍDER do Sebrae DF e educador no Instituto Ajax, funções que exerce com profissionalismo, responsabilidade e compromisso com as origens.

Foto: Thaís Batalha

Apesar de tantas atribuições, ele ainda é um rapper e não deixou a música de lado, neste ano ainda pretende lançar seu segundo álbum intitulado “O Presságio”, que contará com algumas participações especiais que ainda serão divulgadas, portanto, para ficar ligado nas novas produções, procure por Heitor Valente nas principais plataformas de streaming e fique por dentro. 
 

Hospital do Gama/DF recebe superpediatra que alegra crianças nas consultas

Médico usa jalecos de super-heróis como Homem-Aranha, Capitão América, Batman e Super-Homem durante os atendimentos

Por Redação Jornal de Brasília
 
 
No Hospital Regional do Gama (HRG), o pediatra Ricardo Fonseca decidiu abandonar a tradicional vestimenta branca para usar jalecos de super-heróis. Não é preciso dizer que a mudança de visual foi um sucesso total entre as crianças, transformando as consultas em um momento de alegria para os pacientes.

“Nos atendimentos, eu via como as crianças tinham medo do jaleco branco. Principalmente as maiores, porque no primeiro ano elas tomam muitas vacinas e acabam associando a dor ao jaleco branco. Então, em 2018, tive a ideia de usar os jalecos de super-heróis para ‘quebrar com esse vilão’. Depois disso, as crianças adoraram”, conta o “superpediatra”, que é como Ricardo se intitula nas redes sociais.

A novidade já era adotada por ele nas visitas médicas e sociais que fazia em creches da Estrutural e na rede privada, onde atuava. A receptividade das crianças foi tão boa que Ricardo aumentou sua coleção de jalecos, adquirindo também os do Homem-Aranha e Capitão América, além de Batman e Super-Homem. Todos são feitos por encomenda em uma loja no Rio Grande do Sul.

Chamado no concurso público da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, o “super pediatra” começou a atuar no HRG a partir de janeiro deste ano. “Vi os bons resultados e resolvi usar aqui também. É engraçado porque, com eles, se quebra aquele gelo da consulta entre médico e paciente. Acabamos indo para uma área mais lúdica e humanizada do atendimento”, diz Fonseca.

Além dos trajes de super-heróis, a parte lúdica do atendimento de Ricardo inclui, ainda, truques de mágica e figurinhas coloridas, para a alegria dos pacientes.

A pequena Ana Clara, 6 anos, se impressionou na consulta, quando soprou a caixinha vazia trazida pelo médico e, em um passe de mágica, apareceu dentro dela um boneco do Super-Homem. “Gostei muito”, comentou a pequena, sorridente, enquanto acompanhava a consulta do médico com seu irmão mais novo, Nicolas, de apenas um mês.

Quem também gostou do atendimento foi a assistente de vendas e mãe das crianças, Juliana de Medeiros. “Muitas crianças têm medo ao falar de médicos, hospitais e consultas. Quando um pediatra atende assim, acaba divertindo a criança e, no processo, acalmando a mãe. É muito bom”, elogia Juliana.

As consultas pediátricas no HRG ocorrem entre terça e sexta-feira, nos períodos matutino e vespertino, para pacientes agendados e marcados pelas unidades básicas de saúde (UBS), por meio da regulação da Região de Saúde Sul.

Com informações da Agência Brasília. 
 

quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

"A saída para o negro é a luta"


A cor da pele marca as distâncias e a forma como o Estado lida com seus cidadãos e estabelece uma hierarquia racial. Mesmo que ascenda e ocupe espaços de privilégio e poder, como o Supremo Tribunal Federal, a mais alta Corte de Justiça do País, o negro é visto como exceção à regra e ponto fora da curva. Não é muito pensar que, na desigual sociedade brasileira, aos negros é dado o papel subalterno. “Isso precisa ser desconstruído”, defende Thula de Oliveira Pires, professora de direito constitucional da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Com mestrado e doutorado na área, e estudando a interface entre direito e racismo, Thula é mulher negra, criada em São Gonçalo, na região metropolitana do Rio de Janeiro, onde mora até hoje, mãe de Dandara, como assim se definiu em conversa com a reportagem da Radis, em junho. Para a pesquisadora, o racismo histórico brasileiro é uma questão de direitos humanos, e, enquanto esses não contemplarem as demandas e especificidades da população negra, servirão somente para poucos. Thula acredita que, para mudar esse quadro, é preciso pensar sobre como os códigos do racismo operam — e buscar estratégias eficazes para lidar com ele.

Em sua tese de doutorado você tratou da criminalização do racismo na Justiça. O que concluiu?

Temos dificuldade em pensar racismo institucional no Brasil dentro de uma perspectiva estrutural. Junto com alunos, levantei, de 1989 a 2011, todos os casos que envolviam questões raciais julgadas pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. O que vimos é uma vergonha. Os juízes não interpretam fatos explícitos de racismo como racismo. Algumas decisões são bizarras. Em um caso o juiz estava tão mal informado que não viu racismo no black face [maquiagem teatral na qual pessoas brancas são pintadas de negras para imitá-las de forma caricata], que marcou um dos maiores episódios de racismo dos Estados Unidos. Isso é ignorância e cinismo. Na decisão que condenou Rafael Braga [preso nas manifestações de junho de 2013 por portar uma garrafa de desinfetante e condenado a 11 anos e três meses de prisão], o juiz diz que próprio réu deu provas significativas de que estava envolvido e que apresentava “marcas” de crime. A imagem é evidente: o corpo do Rafael era a prova gritante do tráfico. Mas, no depoimento, Rafael negou o cometimento do crime. Então, como ele mesmo pode ser a prova cabal de que o crime aconteceu?

A marca é seu corpo negro?

Só dá para entender essa sentença usando um marca-texto na expressãozinha que fala dessa marca. É o corpo que está sendo usado como prova mais bem-acabada de tráfico de drogas. A pesquisa investigou a questão do racismo institucional e mostrou as entrelinhas dos processos. Um dos grandes problemas é que os juízes sequer se dão ao trabalho de argumentar, de explicitar ou não o racismo — o que não ocorre em casos envolvendo judeus, quando boa parte dos casos são considerados racismo e há uma argumentação tratando o caso. Não peço que um juiz faça uma tese sobre a questão racial, mas apenas que ele dê conta do que está no processo

Como você encara as acusações de que há “vitimismo” e “racismo reverso” nas ações do movimento negro?

A inserção do negro nos espaços sempre é vista como a conquista de alguém que honra por ser a exceção, por ser de primeira linha, por ter estudado em Paris. Mas o racismo nem sempre é explícito, então há um esforço para tentar demonstrá-lo. É daí que surgem as acusações de “vitimismo” ou “mimimi”. Quando a pessoa assume o discurso do racismo reverso, eu uso um raciocínio lógico dedutivo que desmonta seu argumento. Se alguém disser “me chamou de branquela e fui discriminada”, pergunto: no que chamar de “branquela” inviabilizou sua trajetória numa sociedade como a brasileira? Qual é o seu prejuízo por ser “branquelo”? Você perdeu a oportunidade de emprego ou de acesso a algo? Conotação de respeito? Não! Então fica mais fácil para a gente discutir.

Recentemente, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, se referiu ao ex-colega Joaquim Barbosa como “negro de primeira linha”. O episódio ilustra esta situação?

O episódio explicita a maneira pela qual o racismo também opera nos lugares privilegiados. A possibilidade de o negro estar num local de poder está condicionada a sua aproximação com o padrão branco e masculino. A fala do ministro denuncia muita coisa, mas nada traz de novo. E o pedido de desculpas também. É sempre “uma piada”, um “mal- -entendido”, um “eu não quis fazer assim” ou “eu queria ter aprendido a falar em outros termos, mas é o inconsciente”. Eu prefiro tratar a questão racial a partir das estruturas: não personalizo os episódios ou busco intenções particulares. Se há efeitos desproporcionais de violência, de não acesso e desrespeito em relação à população negra, há racismo. Pelas repercussões desse episódio, há caminho para alguma repactuação. O ministro não é algoz, apenas verbalizou a maneira pela qual os códigos do racismo operam no Brasil. É por isso que a intenção não importa. Nós temos que pensar como esses códigos operam para entender o mundo que herdamos e buscar ferramentas que sejam eficazes contra eles.

Há uma naturalização deste “mal-entendido”?

Não é confortável para ninguém se defrontar com imagens construídas a vida inteira. Uma pessoa comprometida com os direitos humanos só se dá conta do seu nível de racismo quando discute branquitude. E é natural que a primeira reação seja de resistência: “não é nada disso, eu sempre me coloquei ao lado de vocês”. É por isso que prefiro quando botam o capuz. E também entendo que num determinado momento não ter conversa é do jogo. Mas se existe alguma potência nesse estado de absoluto retrocesso que vivemos, é a de instaurar um conflito real. Acho que a população negra tem recursos escassos e vai continuar disputando permanentemente, porque sempre vai ter gente de fora. E enquanto tiver gente de fora, tem que ter disputa.

De que modo o racismo afeta a saúde da população negra?

O povo negro está adoecendo de tudo e o genocídio é a chave para entender essa situação. Genocídio não é só extermínio. Ele também se manifesta nas estruturas do Estado, no cárcere, na escola e no sistema público de saúde. O racismo acontece no sistema de saúde quando a pessoa não tem acesso, não é reconhecida como sujeito ou demora a receber atendimento — o que nem sempre está relacionado à enfermidade que carrega. Há um arquétipo sobre o corpo negro de que ele aguenta dor e é mais forte, e que pode ser atendido num segundo momento. A precarização do SUS também afeta a saúde. Ainda que os profissionais de saúde queiram oferecer o melhor tratamento possível, ele é inviabilizado devido às condições, medicamentos, falta de materiais e acesso às cirurgias que são necessárias.





Como é possível mudar esse cenário?

O racismo se reinventa e se readequa. Eu acho que a formação profissional é um momento em que é possível perceber como operam as estruturas do racismo. Não creio que ela consiga alterar o racismo nesses grupos, mas pode indicar que o exercício da função pública exige algumas condutas. Ainda que seja racista, o agente do Estado é obrigado, pelo menos, a obedecer à impessoalidade e à moralidade administrativa. Mas eu não tenho a esperança de que é possível sensibilizar essas pessoas para que um dia venham a olhar o outro de maneira não hierárquica. Por isso acho necessário investir na formação permanente como um todo, nas faculdades de Medicina e Enfermagem, nos cursos de técnico de Enfermagem, dos profissionais que atuam dentro do hospital.

A formação mais humanista daria conta de mudar essa concepção?

Esse humanismo hegemônico não nos humaniza. Só um outro humanismo que atribua humanidade a todos os corpos humanos. O pensamento pós-colonial e decolonial ajuda a entender esse novo humanismo. Entendo que a formação vai além do caminho instrumental do direito. Uma saída é fomentar modelos distintos de atuação do direito com modelos alternativos de justiça restaurativa, modelos autônomos de mediação de conflito, longe de um direito técnico-formal, institucional.

Você tem usado em artigos e palestras o conceito de “amefricanidade”. Você poderia explicar do que se trata?

Essa categoria político-cultural foi cunhada pela historiadora Lélia Gonzalez [1935/1994], uma das principais articuladoras do movimento negro. Ela quis pensar os reflexos do projeto colonial escravista sobre a vida de uma mulher negra no Brasil. Lélia entendia que, apesar das especificidades e de contextos que forjam diferenças entre populações afrodescendentes na América Latina, existe uma unidade marcada pela experiência da escravidão e que permite pensá-la em termos diaspóricos [deslocamento normalmente forçado ou incentivado]. É uma categoria que inclui a experiência ameríndia, mas que não pretende determinar tudo aconteceu com esta população. Lélia falava em primeira pessoa e não tinha a pretensão de falar em nome da mulher afroboliviana ou afroperuana, por exemplo. Eu vejo o pensamento de Lélia reverberando nos processos recentes de articulação e de ação política das mulheres.

Qual a contribuição que este conceito traz para o momento atual?

A de que temos que pensar em ferramentas que deem conta do que nós, mulheres negras brasileiras ou latinoamericanas, herdamos desse legado. Não temos que tentar adaptar uma solução pensada para outra realidade. Não dá para achar que na rubrica dos direitos humanos, por exemplo, será produzido algum resultado mais interessante. Se vamos falar sobre a violência obstétrica, temos de observar nossas especificidades. Não dá para ficar discutindo se a anestesia dificulta ou não o parto natural, se a nossa principal demanda talvez seja o acesso à anestesia. Não dá para continuar a sermos vistas como aquelas que aguentam dor. Temos que disputar e repactuar nos nossos termos.

Por que falar de direitos humanos em um contexto de desmonte de tantos direitos?

Esse momento é uma oportunidade política para a gente disputar um lugar. Nós sempre estivemos excluídos do acesso aos direitos. Agora, que a ameaça de corte é para muitos, é possível colocar os nossos termos à mesa para dar conta da nossa realidade. Creio que tem que haver uma repactuação ou os direitos humanos vão continuar disponíveis para poucos. No Brasil, os direitos humanos sempre foram tratados de maneira não racializada. Quando a realidade de pessoas negras emerge, somos obrigados a disputar categorias que determinam sua subalternização ou sua precariedade. Não creio que teremos uma organização política de massa se não permitirmos que a articulação pelos direitos envolva todos os que são diretamente afetados.

Qual o papel da comunicação na mudança deste cenário? Você vê algum impacto positivo no uso das novas tecnologias pelos movimentos sociais?

Acho esses movimentos impactam nos lugares onde se constituem. O corpo negro esteve sempre muito isolado. Sempre foi visto como um que fura o funil, e é difícil produzir uma articulação de fôlego sozinho, ou com poucos. Quando juntos, eles se fortalecem, conseguem se articular e se capacitar. A conversa fica maior. Em boa parte desses coletivos há um compromisso histórico das articulações negras no Brasil de unir teoria e prática. Mas não dá para saber o que podem atingir e até onde podem ir. Eu vejo que há uma geração em que alguns têm se articulado por vias tradicionais, e outros optam por formas mais alternativas, digo, autônomas. É essa pluralidade de articulação que vai produzir uma disputa política nova. A luta dos negros sempre foi imbricada e geralmente tem um compromisso que vai além da questão racial e de gênero. Há sempre uma luta contra o legado colonial escravista. São movimentos decoloniais, pós-coloniais. A comunicação pode reverberar outras possibilidades. Nessas experiências alternativas as próprias pessoas produzem e reproduzem suas narrativas. Só que essas experiências não aparecem ou aparecem de maneira deturpada e hierarquizada na mídia. É importante informar e trazer à luz essas experiências nos termos daqueles que as experimentam.

O que você prevê para o futuro?

Luta. Luta. Eu não tenho otimismo nas lutas internas do direito. Mas se eu não tivesse otimismo, eu estaria deprimida. Tem que ter algum grau de otimismo para manter a chama da luta acessa. A população preta não tem outra alternativa: ou luta ou sucumbe. O otimismo serve para levantar e botar a armadura antes de sair de casa. A saída é a luta, o conflito, a disputa. Não vejo outro caminho ou perspectiva.
 
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Fotografia: Eduardo de Oliveira.

Entrevista com Thula de Oliveira Pires 16 Agosto 2017 | por Adriano De Lavor e Liseane Morosini

Tempo de leitura: 6 - 12 minutos 
 
Fonte: fiocruz

Bloco Cafuçu do Cerrado (16/02)


💜 Vem Neném! Vem com amor, vem com #beijaço! O bloco Cafuçu do Cerrado convida o público mais irreverente do carnaval de Brasília para uma festa inesquecível! No palco principal: Otto (PE), Totonho (DF), Orquestra Cafuçu com part. especial de Emília Monteiro. E, ainda no comando da discotecagem greística, os tradicionais DJs Baga System mais a presença da ilustríssima DJ Mica Brega. Esperamos todas rariús e todos os cafuçus de peito aberto e sem preconceitos!

16 de fevereiro
Das 10h às 18h30
Setor Bancário Norte
Acesso gratuito

#carnaval2020 #carnavaldebrasilia — em Setor Bancário Norte.

Sex Education: uma série necessária em tempos de Damares e abstinência sexual

por Adriano Favarin
Imagem: Reprodução 
 
No início do ano, a Netflix lançou a segunda temporada de uma série que teria tudo para ser apenas mais um clichê adolescente, como American Pie e tantos outros filmes do gênero. Porém, se o sucesso que a série tem alcançado pode ser explicado, por um lado, por conseguir explorar cada um dos seus personagens para além da superficialidade padrão desses clichês adolescentes, por outro lado, ela tem sua origem também na identificação (atual ou saudosista) do público com os dramas afetivos e sexuais que se desenvolvem ao redor de cada personagem.

Para além disso, o sucesso da série - que embora se passe centralmente em uma escola do ensino médio, não se resume apenas ao universo de adolescentes de 16 anos -, evidencia que, diferente do que Foucault preconizava, ainda que avançamos para uma sociedade em que o consumo do sexo tem sido cada vez mais popularizado (banalizado), a sociedade se mantém profundamente reprimida e ignorante (carente) sexual e afetivamente.

É essa contradição cada vez mais gritante para a juventude entre uma aparente liberalização sexual com um aumento da carência das condições de um suporte social e de capacidade estrutural para lidar com essa situação, que faz aumentar problemas como a gravidez indesejada na adolescência; o número de jovens mortas por abortos clandestinos; a violência trans e homofóbica nas ruas; a violência doméstica; o aumento no número de pessoas com IST’s (Infecções Sexualmente Transmissíveis); o aumento dos casos de depressão, ansiedade e solidão; etc...

Enfim, quanto mais se aumenta a mercantilização e a oferta de sexo, de desejo e de corpos, e quanto mais se nega à juventude um suporte social e estrutural para lidar com essa realidade, mais se aumenta também a miséria sexual e afetiva da juventude e da sociedade de conjunto!

Enquanto o governo Bolsonaro e a ministra Damares propõe como solução reacionária para essa equação problemática que a juventude simplesmente pare de fazer sexo, a série da Netflix vem atuando na contramão e buscando apresentar - às vezes em chave dramática, às vezes em chave cômica - várias informações relevantes para que a juventude possa praticar um sexo com informação suficiente para que este seja seguro e prazeroso.

A série vai abordar desde dúvidas que causam ansiedade, angústia e traumas em inúmeros jovens quando estes estão iniciando sua vida sexual ativa - como se fazer um “boquete”, como estimular o clitóris, como fazer a “chuca”, etc -, até os temas que são verdadeiros dramas sociais - como a necessidade do aborto, o preconceito e a ignorância em relação a IST’s e os abusos sexuais em transportes públicos.

Enquanto a extrema-direita segue repudiando à educação sexual nas escolas, ela mantém a juventude na ignorância sobre seus próprios corpos e desejos e reféns das piores consequências sociais em relação a prática de um sexo desconhecido. Como se não bastasse o desserviço com essa política de falta de informação para a juventude, agora o governo chega ao absurdo de propor uma campanha ideológica pela abstinência sexual!

Em vez de informar e educar, a saída é proibir e estigmatizar. Isso sem falar de algo estrutural do capitalismo, que são os impeditivos econômicos que fazem com que a grande maioria dos adolescentes não tenham condições de construir e descobrir relações sadias com o seu sexo, seu corpo e seu afeto de maneira independente, profunda e íntima junto com outros adolescentes.

Ainda de acordo com a propaganda do governo, educação sexual não deve ser tarefa da escola mas sim tarefa da família. Nesse âmbito, a série da Netflix também tem a felicidade de apresentar a complexidade das relações parentais que permeiam os personagens da série, e a partir daí demonstrar como parte das contradições e dramas que afetam a vida afetiva e sexual de vários jovens está associada com as contradições intrínsecas da própria relação familiar.

Seja a jovem de aparência rebelde e o passado de relação com a mãe viciada e o irmão traficante; seja o jovem de aparência valentona e sua relação com um pai autoritário e uma mãe submissa; seja o jovem tímido e com ansiedade sexual e sua relação com uma mãe super-protetora e invasiva; ou o atleta popular cuja mãe transfere para ele suas vontades e desejos frustrados. Enfim, de inúmeras formas a série vai demonstrar a impossibilidade de que uma verdadeira e saudável educação sexual venha unicamente do núcleo familiar.

Outra grande sacada da série - em tempos em que o governo faz propaganda contra a discussão da fluidez do gênero e da sexualidade com os jovens - é conseguir explorar de maneira muito sensível a diversidade sexual e as descobertas e experimentações afetivas da juventude não apenas em relação ao gênero oposto, mas também com o seu próprio gênero. Na segunda temporada a série vai apresentar a assexualidade, a pansexualidade e relacionamentos afetivos e sexuais de gays e lésbicas de uma maneira extremamente natural.

Ainda sobre esse tema, a série vai quebrando, de maneira paulatina durante as duas temporadas, a imagem homofóbica por trás das atitudes de Adam, o filho do Diretor, com um dos protagonistas da série, Eric, assumidamente gay. Para além do superficial clichê de que “todo homofóbico é um gay enrustido”, a série vai se aprofundar no personagem de Adam, relacionando suas atitudes com uma inveja latente diante da coragem e autenticidade do outro e do próprio afeto e apoio que o pai de Eric possui pelo filho em contraste com o autoritarismo com o qual seu próprio pai lhe trata. Adam não se identifica enquanto gay (muito pelo contrário, ele seria o esteriótipo do que se chama hoje de "hétero-padrão-topzera"), mas isso não impede a série de ir construindo sobre sua personagem e a de Eric uma complexa - e mais comum do que se costuma imaginar - relação homoafetiva.

A série ainda aproveita para mostrar pra Damares algo que já é científica e estatisticamente estudado e comprovado pelo menos desde Freud: que mesmo em ambientes unicamente masculinos - colégio militar, presídio, monastério, etc... - é impossível impor uma abstinência sexual. A série vai mostrar uma cena de “brotheragem” (masturbação ou felação entre homens) de dois estudantes do Colégio Militar para onde Adam é mandado pelo pai. O homoerotismo e as práticas sexuais entre dois homens (ou duas mulheres) é muito mais comum do que se imagina, e vai muito para além da necessidade de assumir ou não uma identidade gay/lésbica. A série finaliza de maneira brilhante essa situação com a declaração do Sargento sobre o tema de que “muitos de nós somos nessa instituição. Mas é melhor ignorar certas coisas.” Uma afirmação que facilmente ultrapassa a ficção.

Ainda que os dilemas e dramas afetivos e sexuais que a série traz também estejam presentes em grande medida na série animada Big Mouth (inclusive a construção de alguns de seus personagens), Sex Education tem a vantagem de trazer maior grau de realidade e identidade entre os personagens e o público.

É em toda essa perspectiva que a série Sex Education tem o seu mérito em trazer a tona não apenas dramas clichês adolescentes (ainda que haja isso também na série), mas trazer problemas, dúvidas, soluções e reflexões em torno da sexualidade, da afetividade e das contradições na construção de relações dentro dessa sociedade, sugerindo ao público pensar e repensar valores, determinações e preconceitos.

Ao contrário da abstinência sexual compulsória incentivada pelo governo Bolsonaro e a ministra Damares, e ao contrário da imposição cada vez maior do Estado, da Igreja e da família de controle sobre o corpo e o desejo da juventude, é necessário que os estudantes se organizem com os professores pela defesa de uma educação sexual livre e emancipadora nas escolas. É necessário que se fortaleçam os espaços de debate entre a juventude e o operariado sobre sexualidade e política; que se garanta o direito ao aborto legal, seguro e gratuito; que se possibilite ao máximo as condições de independência financeira para a juventude em relação aos pais e para as mulheres em relação aos maridos; e que se garanta espaços seguros e gratuitos para a juventude ter o direito ao prazer e ao conhecimento do seu próprio corpo.

Somente compreendendo a função social por trás de toda e cada repressão sexual, é que se faz possível construir uma política realmente revolucionária para a libertação sexual. Pois ainda que esta não se alcance automaticamente com a tomada das ruas ou do poder pela juventude e pela classe trabalhadora, é somente uma política que se proponha a destruir e transformar radicalmente todo esse sistema capitalista de exploração e opressão que pode ser capaz de dar livre vazão para todas as expressões de afetividade e sexualidade humana. 
 

quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

Documentário resgata trajetória de Abdias do Nascimento

 
Documentário da TV Senado resgata a trajetória do ex-senador Abdias do Nascimento. Professor, artista plástico, escritor, teatrólogo, político e poeta, Abdias foi pioneiro do movimento negro no Brasil e recebeu homenagem do Senado nesta sexta (21) pelo centenário de seu nascimento. O documentário 'Abdias: Raça e luta', produzido em 2012, tem direção de Maria Maia. Assista:



Fonte: Senado Federal

Exposição gratuita em Brasília tem como tema a cultura e a religião negra

Mostra fica em cartaz até o fim de março


O Museu Nacional da República recebe a mostra “Geometria, símbolos e cores”, do artista Josafá Neves. A exposição é gratuita e fica em cartaz até o dia 29 de março, com visitação das 14h às 18h30, às segundas-feiras e das 9h às 18h30, de terça a domingo.

Quem visitar o museu poderá conferir de perto as obras do artista brasiliense que abordam os orixás, entidades cultuadas em religiões de matriz africana. A mostra reúne esculturas, quadros e instalações do artista, nascido no Gama.

A proposta da exposição é fazer um mergulho na história e cultura negra do país, provocando a reflexão sobre arte, origem e religião do povo negro. Para isso, o artista usa obras que representam cada um dos 16 orixás.

Foto: Chico Furtado/Inspira Filmes

SERVIÇO
Exposição “Geometria, símbolos e cores”
Data: até 29 de março
Local: Museu Nacional da República (Esplanada dos Ministérios)
Horário: 14h às 18h30 (segundas-feiras); 9h às 18h30 (terça a domingo)
Entrada gratuita