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quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

NESSE CARNAVAL VOCÊ PODE SER O QUE QUISER!

Campanha do Movimento Mulheres em Luta contra o machismo, racismo e homofobia no Carnaval.

Fotos de Johnatan Reis.

Queria passar o carnaval em Salvador, Olinda, Rio de Janeiro, mas acabou ficando em Brasília?

Vem sambar na cara das opressões no Carnaval mais feminista da cidade!  dia 02/03(Domingo), às 14h: Bloco das Perseguidas (concentração no Balaio Café)


Fonte: MML/DF.

Ator fala sobre período preso injustamente: ‘Existem muitos outros Vinicius lá dentro’

por Wilson Mendes,

Pouco tempo depois de atravessar as portas da Casa de Detenção Patrícia Acioli, em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio - onde passou 16 dias preso injustamente -, o ator Vinícius Romão de Souza, de 26 anos, conversou com jornalistas no play do prédio onde mora, no Méier, na Zona Norte da cidade. Cercado por vizinhos e amigos e visivelmente emocionado ao lado do pai, o tenente-coronel da reserva do Exército, Jair Romão de Souza, de 64 anos, o rapaz descreveu a sensação de enfim retomar a liberdade.



Vinicius Romão beija o pai, emocionado, na volta para a casa 
Foto: Thiago Lontra / Extra

- Estou muito feliz de ter sido solto, claro. De poder rever os amigos e familiares. Mas existem muitos outros Vinicius lá dentro - disse o ator, acrescentando:

- Tem muita gente que com certeza é inocente, ou que cometeu um crime pequeno e mesmo assim está lá. É complicado.


Vinicius Romão revê os amigos na volta para casa 
Foto: Thiago Lontra / Extra


- Fiquei numa cela onde havia mais 14 pessoas. Tinha gente que foi presa por tráfico de drogas, por Maria da Penha (violência doméstica)... Assim que entrei perguntaram qual a minha facção. Eu disse que era neutro e fiquei numa cela de pessoas sem facção. Na cela existem três beliches, seis camas sem colchão. Eu dormi no chão, com papelão - revelou.

Quatro vezes por dia, os chuveiros eram ligados e o banho durava 10 minutos. Além do banho, o tempo também era utilizado para encher copinhos de guaraná natural, únicos recipientes que tinham para guardar água. É assim que os presos se hidratam na Casa de Detenção Patrícia Acioli, em São Gonçalo, na Região Metropolitana.

- A lição que tirei foi a de aproveitar cada minuto. Senti falta de coisas como abrir a geladeira e beber água por exemplo. Lá, eu bebia água do banho. Ressocialização seria alguém conseguir sair de lá melhor do que quando entrou, só que isso acaba não acontecendo. Poderia ter uma biblioteca, palestras... Mas lá dentro as pessoas só têm ódio. É desumano - contou o rapaz.



Vinícius Romão falou com a imprensa no prédio onde mora, no Méier 
Foto: Agência O Globo

Para passar o tempo, os 15 homens que compartilhavam a cela fizeram um dominó e um jogo de damas de papel. Mas segundo o ator, mesmo para conseguir papel e lápis foi difícil.

- O que me emociona nisso tudo é o apoio que me foi dado. Pessoas que não via há muito tempo compraram a minha causa. Todas essas pessoas que estão aqui (em casa) para me receber. Tem gente que estudou comigo no primário e está aqui. Quando eu estava lá dentro, eu orava muito e sabia que aqui fora vocês também estavam. E isso me passava tranquilidade. Eu sabia que estava acontecendo alguma coisa aqui fora, mas não tinha acesso e não sabia ao certo o quê.

Vinicius Romão entre os amigos, no prédio onde mora
Foto: Domingos Peixoto / O Globo

Para o futuro, planos.

- Eu ainda vou fazer uma pós-graduação e decidir se continuo com a carreira de ator. O que quero, neste momento, é voltar logo a trabalhar. Tenho saudade do meu trabalho como vendedor. Eu fui o único negro, num grupo de 17 vendedores contratados como temporários. E fui o único a ser efetivado. É disso que falo.

Vinicius Romão se emociona ao falar sobre prisão
Foto: Thiago Lontra / Extra

Ainda na saída do presídio, Vinicius garantiu que perdoa a vítima de assalto que fez o seu reconhecimento equivocadamente. Já a copeira Dalva da Costa Santos, de 51 anos, falou com o EXTRA pelo telefone cerca de uma hora após o jovem ser solto. Emocionada, a mulher disse que não querer se expor para não prejudicar seu trabalho - ela é funcionária de uma empresa que presta serviços para o Hospital Pasteur, também no Méier. Dalva pediu desculpas ao jovem e também ao pai dele, o tenente-coronel da reserva do Exército, Jair Romão de Souza, de 64 anos.

- Peço perdão mil vezes ao Vinícius. Estou orando sem parar por ele. Para Deus estar guardando ele, o coração dele. E que ele consiga superar tudo isso o mais rapidamente possível. No que precisar de mim para resolver questões da Justiça, eu, como mãe de família, vou estar sempre à disposição - disse ela, que é evangélica e mãe de dois filhos.

Fonte: Extra.globo.

Sobre como minha mãe me ensinou consciência racial


Não me lembro de nenhum momento da vida em que não soubesse que sou negra e as implicações que isso tem. Conservo memórias dos primeiros anos de infância em que ouvia minha mãe contando suas experiências com o racismo. Ouvi essas histórias repetidas vezes, mas só muito recentemente percebi o quanto elas foram determinantes na minha vida.

Minha avó materna faleceu quando minha mãe tinha apenas três anos. Impossibilitado de criar quatro filhos sozinho, meu avô – trabalhador de olarias, perambulava de uma a outra o tempo inteiro – entregou as duas crianças mais novas (minha mãe e sua irmãzinha de dois anos) a pessoas interessadas em “cuidar” delas. Minha mãe foi “adotada” por uma senhora viúva que tinha outros filhos. Todos brancos.

Nessa casa minha mãe era responsável pelo serviço doméstico e outras tarefas. Quando atingiu dez anos foi enviada para “casas de família” como empregada doméstica. Conta que recebia roupas e alimentos como “pagamento”.

Minha mãe ficou praticamente analfabeta. No segundo ano escolar foi retirada da escola sob a alegação de que era muito encrenqueira. Ela batia nas crianças que a chamavam de “macaca” e “neguinha fedida”! Minha “avó” também concluiu que não havia mais necessidade de mantê-la na escola, já que havia aprendido o básico: escrever o próprio nome e fazer contas simples. Por ser mulher e negra a alfabetização era um luxo a que minha mãe não teve o direito de usufruir.

Sou da geração Xou da Xuxa. Como muitas crianças naquele período, ficava colada natelevisão e fazia questão de tomar “café da manhã” com a Xuxa. Ela comendo frutas e outras coisas que eu nunca tinha visto, enquanto eu comia meu pão com margarina ecafé com leite (hoje percebo o quanto aquilo era violento com quem tinha pouco ou nada para comer pela manhã). Minha mãe criticava meu interesse na “loura”. Apontava para a TV e dizia: “A Xuxa não gosta de negros! Tá vendo algum negro aí?”.

E assim fui crescendo entendendo que minha cor de pele me distinguia, de certa forma, de outras pessoas e que isso tornava minha vida mais difícil em alguns aspectos. Eu teria que enfrentar olhares desconfiados e obstáculos que pessoas com tom de pele mais claro jamais teriam. Mas, também aprendi a me defender, a não aceitar passivamente as ofensas e a não me deter diante dos obstáculos!


Consciência racial: essa foi a grande lição que minha mãe me ensinou! Ter aprendido isso desde muito pequena foi (e ainda é) muito importante na minha caminhada. Me ajudou alidar com muitas coisas e também causou alguns problemas para minha mãe. Como quando, por volta dos sete anos, eu cismei que queria uma boneca com minha aparência. Mas, aí já é outra história.

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Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

A erotização e objetificação da mulher negra e a sexualidade feminina como tabu

Porque tantos homens ainda acham que a mulher está a sua disposição, assim como ele está para ser o macho alfa, porém quando a consciência sexual desta mulher, seu desejo e posicionamento são os mesmos que os dele, ela é vista como vadia? (Sim vadia, sem eufemismos!)Porque ainda hoje, vivemos numa sociedade na qual, apesar de nem sempre terem os mesmos direitos, as mulheres tem tantos deveres? Porque esse pensamento ainda persiste?! Creio eu que estes sejam questionamentos que muitas de nós se fazem, assim como muitas de nós ainda se anulam em nome do sonho do casamento, da maternidade… Mas será que esse sonho é real mesmo?

Trabalhamos, estudamos, conquistamos cada vez mais autonomia e independência para finalmente um dia assumir uma família bonita, com filhos… De preferência hétero! Não, espera…

Mas e o cara? Você não vai perguntar se ele é rodado, no seu circulo de amigas, não vai rolar o nome dele na boca de todas em comentários do tipo “Um gato mas muito safado, pode ir que eu garanto, todas pegam!”?Agora abraçando esse cenário vamos virar a lente pra nós mulheres pretas em especial: porque nós somos vistas de forma tão mais sexualizada? Quem de nós nunca ouviu da boca de um homem branco, (com aquela cara de quem vai te comer com farinha), “Eu adoro uma mulata” “Porque você não desfila no carnaval?!” “Morenas são as melhores”. E nesse sentido que estamos discutindo aqui sabemos o que “as melhores” significa (e inclusive o porque de sermos citadas como “morenas”), creio que todas nós já ouviu algo do tipo.

Apesar de estarmos no Brasil, que é um país tão miscigenado, ainda prevalece o estereótipo de raça, que determina que a mulher negra tem sempre lábios grandes, bumbum avantajado, corpo ‘atraente’ e o pior: ele vem acompanhado da ideia maluca de que ela está disponível (por ser mulher), e de que é isso que ela quer (porque o fenótipo dela sugere que ela é safada). E mesmo que seja porque ela não pode ser?
Constatando-se que ela seja sexualmente consciente e ativa, o valor dela na rodinha vai ser só o da “gostosa que pegaremos”, e só esse mesmo.

Imagem – Foto e arte de Bruno Gonçales.

O ‘valor cultural’ que se atribui à mulher negra além da branca é físico e estereotipado. Os ‘valores’ comportamentais que a mulher (preta ou branca) ‘deve’ seguir também. E porque até hoje temos de provar nosso ‘valor’ de todas as formas? Ele existe e está explicito pessoas, não temos que provar absolutamente nada!Não é possível abrir a cabeça de um ser machista e enfiar lá que temos não só os mesmos anseios enquanto ser humano, mas os mesmo desejos e instintos, marcados pela nossa individualidade. Mas não podemos aceitar que esse seja o protocolo, anulando nossas vontades, nossa expressão natural enquanto seres viventes!

Vamos nos situar e sintonizar com aquilo que nos diz ou não respeito!

Nós mulheres negras não somos todas mulatas do carnaval;
Aquilo que vestimos ou deixamos de vestir não determina nosso caráter;
Nenhuma de nós é serva de nenhum homem ou de pessoa alguma, e não temos dever ou obrigação alguns que os homens não tenham;
Mulher negra nunca foi sinônimo de mulher vulgar, bem como nenhuma mulher independente de sua postura deve ser;
E não, não é porque ele é homem que ele pode, nem tudo é elogio, e você não é um objeto!

Também na questão sexual é preciso se colocar pelo respeito de sua liberdade, bem como é dado ao homem. Seu direito de ser e estar te permite pensar como quiser, e estar com quem você quiser! E quando as pessoas que te interessam, sobretudo homens fizerem você ficar naquelas

“Poxa, mas essas pessoas são machistas…” , lembre-se de que você não está para as vontades de ninguém e sim para as suas, demonstre isso em suas atitudes, isso acaba por nos afinar com pensamentos semelhantes aos nossos, e ajuda a quebrar os tabus daqueles que nos observam.

Se o homem não é condenado por expressar sua essência na sua totalidade, nós também não seremos! Se somos mulheres, ou somos pretas, ou o que quer que ainda incomode e desvirtue tanto essas pessoas, vamos lembrar a elas sempre, que somos acima de tudo livres! (E temos plena consciência disso…)Acompanhe nossas atividades, participe de nossas discussões e escreva com a gente.

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Meu nome é Anne Dourado, sou poetisa e atualmente não estudo ou trabalho. Não faço parte de nenhuma frente ativa negra ou feminista de forma presencial por assim dizer, exceto discussões online, mas creio ter a algo a acrescentar. Sou mulher, sou negra, sou crítica e como muitas de nós creio que devemos aprender e se fortalecer entre nós.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

O racismo ainda não é uma questão superada no Brasil


A agressão contra uma manicure negra em Brasília revela que o racismo ainda não é uma questão superada no Brasil. Somente no Distrito Federal, 99 denúncias foram registradas entre março e setembro de 2013. Assista:


Fonte: CNJ.

Campanha contra homofobia



Os atores Marcos Damigo e Rodrigo Andrade (Foto), que viveram um casal gay na novela Insensato Coração, estrelam a campanha contra a homofobia da UNECO, PNUD, Secretaria de Direitos Humanos e Rede Globo lançada hoje. A campanha passará na Globo e fala do Disque Denúncia (Disque 100) de Direitos Humanos, que tem um número específico para a denúncia de crimes por homofobia. Na campanha, os atores chamam a atenção e afirmam que a homofobia é crime. O vídeo de 30 segundos foi produzido pela Globo, que vai exibir a campanha de graça nos próximos dias.

“Parece incrível mas em pleno século 21 ainda tem gente que não aceita o direito de cada um ter a sua orientação sexual”, diz Andrade. “Agredir, xingar, discriminar uma pessoa por ser homossexual é mais do que uma falta de humanidade, é crime”, afirma Damigo que foi capa da Lado A 37. “O disque direitos humanos recebe denúncias e enfrenta a violência”. “Ligue 1-0-0 e denuncie”. “E não se esqueça, o fim da intolerância começa em casa”, dizem os atores.

“Cidadania, a gente se liga em você” diz a campanha que finaliza com a logomarca da Rede Globo, antes, aparecem as logomarcas dos parceiros da iniciativa.

Disque direitos humanos, 100, recebe denúncias sobre homofobia. Assista:


Fonte: Faz Carão.

Ter e manter um filho


por: Rosely Sayão,
Ter e manter um filho custa caro, segundo reportagens em revistas, jornais, etc. Nelas, há contas, inclusive, que apontam valores que a presença de um filho acrescenta ao orçamento da família. E isso se estende por uns 20 anos, mais ou menos. Ou mais, muitas vezes bem mais.

No mundo do consumo, o valor financeiro das coisas é que está em questão. Por isso, quando alguém planeja ter um filho, considera primeira e antecipadamente o custo financeiro dele para, então, se preparar, se planejar. Ou postergar ou até mesmo desistir.

Quem não conhece mulheres e homens que fazem ou já fizeram um tremendo sacrifício financeiro em nome do filho?

Festas de aniversário com direito a recreacionistas, bufês, lembrancinhas etc.; viagens ao exterior; calçados ou roupas caras porque da moda; brinquedos e traquitanas tecnológicas de última geração; e mais: carro, escola, cursos extracurriculares, altas mesadas, aprendizado de língua estrangeira no exterior etc.

Quase nada disso podemos considerar como absolutamente necessário, mas tudo é, certamente, altamente desejado pelo filho ou pelos anseios dos pais em relação ao filho.
A lista é enorme e não para por aí. Os filhos querem, querem, querem, querem sempre mais. Nunca estão satisfeitos.

E os pais trabalham, trabalham, trabalham cada vez mais para ganhar mais e, assim, tentar satisfazer as necessidades e os caprichos do filho, que quase sempre custam bem caro.

Conheço mães e pais que fizeram financiamentos, parcelaram uma grande quantia de dinheiro em inúmeras prestações, abdicaram de gastos pessoais, tudo para dar ao filho um "book" ou um belo "look".

Há também os que fazem esses gastos para garantir seu próprio sossego. Afinal, a criançada e a moçada aprenderam muito bem como lutar para conseguir o que querem, não é verdade?

Mas, há outros tipos de sacrifício que os pais faziam pelos filhos e eles foram, quase todos, substituídos pelo sacrifício financeiro. Uma cena do filme "Billy Elliot" mostra um desses tipos de sacrifício.

O filme se passa em uma pequena cidade da Inglaterra nos anos 80. O protagonista é um garoto de 11 anos que se apaixona pelo balé, mas seu pai, um trabalhador comprometido com o movimento grevista dos mineiros, não aceita a escolha do filho até o momento em que se dá conta da possibilidade de o garoto ter uma vida melhor que a sua, dedicando-se ao balé.

É nesse momento que ele sacrifica suas convicções -ideológicas e trabalhistas-, deixa de honrar a greve da qual participava ativamente para possibilitar ao filho a busca de seu sonho.

Sim, ter e manter um filho custa caro, mas não vamos considerar agora o custo financeiro da questão. Vamos considerar o custopessoal.

Ter um filho custa horas de sono e muitas preocupações; custa mudanças de vida temporárias e renúncias; custa a necessidade de disponibilidade pessoal constante; custa abdicar de sonhos e projetos; custa paciência quando ela já se foi, custa perseverança mesmo quando cansados, e muito mais.

É: realmente, ter filho custa bem caro, mas para se ter uma ideia aproximada desse custo, precisamos deixar de priorizar o custo financeiro que o filho acarreta.

O verdadeiro custo, este não pode ser colocado em números porque é pessoal. Mas é certo que esse custo sempre é alto, mesmo quando não reconhecemos isso.

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Rosely Sayão, psicóloga e consultora em educação, fala sobre as principais dificuldades vividas pela família e pela escola no ato de educar e dialoga sobre o dia-a-dia dessa relação. Escreve às terças.

Fonte: Folha de S.Paulo.

Injúria racial choca, mas ainda é frequente no DF

Número de ocorrências policiais cresceu 40% em 2013: foram 430 casos, contra 303 em 2012

por Renan Bortoletto,
O número de ocorrências policiais por injúria racial e racismo no Distrito Federal cresceu 40% em 2013, em comparação ao ano anterior. De janeiro a dezembro de 2012, foram contabilizados 303 casos, contra 430 no mesmo período do ano passado. Os dados são da Coordenação de Inteligência e Estratégia da Polícia Civil. Muito além da existência do preconceito, a Secretaria Especial da Promoção da Igualdade Racial (Sepir-DF) avalia que os números retratam o aumento da intolerância das pessoas com atos racistas.

Uma das regiões administrativas onde o índice mais cresceu foi Brasília, que, em 2012, registrou 47 casos de injúria racial e racismo, contra 74 no ano seguinte. 


Diferenças

Os dados, porém, referem-se ao número de ocorrências, que pode ser menor que o número de vítimas. Os casos de injúria racial se sobrepõem numerosamente aos casos de racismo. Segundo o Código Penal, injúria racial consiste em ofender a honra de alguém com o uso de elementos referentes à cor, raça, etnia, religião ou origem, passível de um a três anos de prisão.

Já os casos registrados como crimes de racismo implicam conduta discriminatória dirigida a um determinado grupo ou coletividade, sendo o ato imprescritível e inafiançável. O autor pode ser condenado de um até três anos de prisão, dependendo da gravidade do ato.

No ano passado, o DF registrou apenas quatro ocorrências de racismo, enquanto que nos dois primeiros meses de 2014 já são três. O tema voltou a ser tema de discussão principalmente depois do episódio ocorrido em um salão de beleza na Asa Sul, quando uma australiana cometeu o ato de racismo contra uma atendente. Dois anos atrás, em 2012, um médico foi preso após ofender uma funcionária de um cinema, dizendo que ela “deveria morar na África para cuidar de orangotangos”.

Pense Nisso

O preconceito faz parte do cotidiano de milhões de brasileiros. Essa afirmação é admitida por muita gente, mas são poucos dispostos a reconhecer e vencer o racismo que guardam dentro de si. Em vez disso, frequentemente são pegos fazendo comentários carregados de pre.con.cei.to: opinião ou sentimento desfavorável, concebido antecipadamente ou independente de experiência ou razão. São conceitos repassados a cada geração, por meio de piadas “inocentes”, julgamentos do dia a dia. Felizmente, existem aqueles que superam a bagagem herdada de pais, tios e avós para escrever uma nova história de tolerância, igualdade e, sobretudo, respeito.

O que diz a lei

Conforme a Lei 7.716/1989, é determinada a pena de quem, de modo discriminatório, recusa o acesso a estabelecimentos comerciais (um a três anos), impede que crianças se matriculem em escolas (três a cinco anos), eque cidadãos negros entrem em restaurantes, bares ou edifícios públicos ou utilizem transporte público (um a três anos). 

Funcionários públicos que cometerem racismo podem perder o cargo. Trabalhadores de empresas privadas estão sujeitos a suspensão de até três meses. As pessoas que incitarem a discriminação e o preconceito também podem ser punidas.

Como denunciar: Telefone 156, opção 7

Cena difícil de esquecer

“Ela perguntou na recepção se tinha alguém disponível para fazer a unha dela. A secretária falou que sim e me chamou. Quando ela me viu, perguntou se podia ser atendida por outra pessoa”. O relato é da manicure Tássia Pereira dos Anjos, 22 anos, vítima de racismo no salão de beleza da 115 Sul. Dez dias depois do ocorrido, o clima de indignação permanece.

Tássia relembra que a australiana, no entanto, não se contentou em apenas não ser atendida pela manicure, como pediu para que não ficasse perto ou olhando para ela. “Ela ergueu o tom de voz e se dirigiu a mim questionando o porquê de gente de 'raça ruim' ficar olhando para ela”, diz.

A tensão ficou ainda maior depois que a cliente se recusou a pagar pelo serviço. “Foi aí que a dona do salão também se exaltou. O que mais chamou a atenção é como ela enfrentava todos. Quando um policial chegou, ela disse novamente que não queria ser atendido por ele, pois alegou que o PM, que a prendeu, era também de cor”. A manicure teme que a Justiça mais uma vez não seja feita e o caso seja apenas mais um. “Ela falava que ninguém podia prendê-la, desafiou nossas leis”.

Mais denúncias

Apesar deste caso e das demais ocorrências, o secretário de Promoção da Igualdade Racial (Sepir-DF), Viridiano Custódio, acredita que as pessoas estão mais atentas à forma com que elas se dirigem aos demais. “A questão do racismo no Brasil sempre foi velada. Só em 2002 é que nossos governantes reconhecem que há racismo no País. A partir daí, a sociedade começou a denunciar e eu considero isso positivo. Um número grande de denúncias faz com que as pessoas pensem duas vezes antes de praticar o ato”, analisa.

Brechas na lei dificultam fim do problema

O secretário da Sepir, Viridiano Custódio, diz acreditar que ainda é necessário fazer algumas alterações na legislação brasileira. “Sou a favor da unificação da injúria racial e do racismo propriamente dito”, completou. Para ele, o Código Penal deveria ser mais severo. “Todas as leis têm suas brechas. No caso da australiana, por exemplo, ela não ficou nem um dia presa porque o advogado alegou que ela tem emprego e residência fixos e não afetaria a ordem pública e econômica do País, o que lhe concedeu uma liberdade provisória”, comentou Custódio.

Atualmente, a Sepir dispõe de nove programas sociais que visam a erradicar o racismo, além de assessoria jurídica e psicossocial às vítimas. O secretário comemora o sucesso do disque-racismo (telefone 156, opção 7). “Desde março de 2013, quando foi implementado, já recebemos mais de oito mil ligações que caracterizavam 126 tipos diferentes de injúria racial ou racismo”, enumerou. 

Censo do IBGE revela que 57,5% da população do DF é de negros. 

É preciso conscientizar

Uma das novidades da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial é a inclusão de um curso para aqueles que cometeram atos de injúria racial ou racismo. A ideia, que conta com o apoio da Universidade de Brasília (UnB) e é liderada pelo Núcleo de Enfrentamento à Discriminação do Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT), será implementada em abril deste ano.

“A pessoa que comete este tipo de crime está disposta a fazer acordos com o Estado, bem como prestar serviços à comunidade ou pagar multas. Com o curso, vamos promover uma reflexão e confrontar o agressor para uma mudança de comportamento. O curso funcionará como parte da pena dele uma vez que ele aceite as condições. Caso contrário, ele pode ser levado a julgamento e consequentemente poderá ir para a prisão”, analisou o promotor de Justiça do Núcleo de Enfrentamento à Discriminação do MPDFT, Thiago Pierobom.

Durante o curso, a pessoa que cometeu atos de injúria racial ou racismo acompanhará exposição de vídeos, leitura de textos e participará de rodas de discussão com temas ligados ao assunto. O curso terá duração de oito horas, dividido em dois turnos de quatro horas cada com obrigatoriedade de presença.

“Déficit de cidadania”

Na visão da juíza do Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT), Carla Patrícia Nogueira, que é também professora de direito e autora de livros sobre cotas raciais, ainda vivemos em um país extremamente racista, potencializado por uma cultura que permitiu o sistema de escravidão por quase 400 anos. “Fomos o penúltimo país no mundo a abolir a escravidão, então, é preciso que a sociedade brasileira reflita sobre esses dados e encare de frente o fato de não tratarmos as pessoas com o mesmo respeito e consideração a todos devidos”, observou.

A juíza encara como 'déficit de cidadania' os últimos fatos de discriminação racial ocorridos no País. “Acho, contudo, que racismo é conduta gravíssima, que atenta contra a dignidade não só da pessoa ofendida, como de toda a sociedade. Precisamos refletir se queremos um país que discrimina sua maior riqueza: a diversidade”, acrescentou.

Fonte: Da redação do Jornal de Brasília.

Depois de presos, jovens confessam que espancaram professor no Pier 21


Segundo a polícia, o crime ocorreu, porque a vítima teria reclamado com um dossuspeitos

Os dois jovens que agrediram o professor de Educação Física, Lucas Silva Lopes Xavier, 27, no Shopping Píer 21, na noite de domingo (23/2), confessaram o crime, em depoimento à Polícia Civil. Os suspeitos são primos e no dia do crime, passaram a maior parte do tempo bebendo, na casa de familiares. 

Em coletiva, na manhã desta terça-feira (25/5), Mabel Faria, titular da 1ª Delegacia de Polícia, informou que as agressões começaram, porque a vítima teria feito uma reclamação a um dos suspeitos, Yago Barboza da Silva, 21 anos, que fazia xixi próximo ao banheiro do shopping.

Yago é estudante de Educação de Física e morador de Arniqueiras. Segundo a polícia, ele não gostou de Xavier ter ido falar com ele, por isso começou as agredi-lo. Ao ver o que o primo fazia, Matheus Phanta Junges, 20 anos, morador do Guará, se aproximou do local e ajudou Yago a bater em Xavier, que ficou desacordado.

Depois do espancamento, os dois jovens foram embora. Contudo, o segurança do shopping anotou a placa do carro em que eles estavam. A polícia conseguiu localizar o dono do veículo, que informou ter vendido o automóvel para Yago. 

A polícia prendeu Yago na noite dessa segunda-feira (24/2), no momento em que ele chegava da faculdade. Detido, o jovem informou para polícia onde Matheus morava e conseguiu prende-lo também. A Polícia Civil acredita que apenas os dois jovens estavam envolvidos nas agressões, entretanto, a polícia continua investigando o caso, pois há a suspeita de que Xavier também tenha levado uma garrafada na cabeça. 

Yago e Matheus vão responder por homicídio tentado qualificado com motivo fútil, já que a vítima não teve chance de defesa. 

O crime

De acordo com testemunhas que estavam no estabelecimento, o professor, morador do Lago Norte, se divertia em um bar acompanhado do consultor Maurício Barroso, 31 anos. Por volta das 22h, dirigiu-se ao banheiro situado perto da entrada principal do shopping e reagiu à situação constrangedora. Ao chamar a atenção do grupo, foi agredido por dois rapazes musculosos. Um deles quebrou uma garrafa de cerveja na cabeça do jovem. Na sequência, a dupla desferiu socos e chutes. “Eu o encontrei desacordado uns 10 minutos depois, nem sabia da confusão. Não podemos aceitar que esse tipo de coisa se torne natural. Ele não morreu por sorte. Não cabe imaginar que existam pessoas tão covardes no mundo”, lamentou Maurício.

O professor está internado na unidade de terapia intensiva (UTI) do Hospital Santa Helena e não se recorda do episódio. Ainda não há previsão de alta. Embora Lucas esteja consciente, o quadro dele é considerado grave. As pancadas provocaram traumatismo craniano e a quebra da mandíbula em duas partes. O maxilar será reconstruído por intervenção cirúrgica, mas o que mais preocupa os médicos são três coágulos no cérebro. Talvez seja necessário submetê-lo a um procedimento a fim de drenar o sangue. Além disso, Lucas está com os movimentos do lado esquerdo do corpo comprometidos. 

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Libertem Vinícius Romão!


por Jean Wyllys,
Vinícius foi vítima de uma prisão arbitrária motivada por racismo. Em outras palavras, o "crime" de Vinícius é ser negro, ter cabelo “black power” e estar caminhando na hora e local "errados". O fato de ser um negro foi suficiente para torná-lo um assaltante em potencial na concepção de mundo dos policiais que o prenderam e da vítima que o apontou como culpado.

Infelizmente, essas prisões “por engano” são muito comuns em nosso país. Como vítimas principais, estão, na maior parte dos casos, homens negros, pobres e moradores de periferia. Pessoas que estão na chamada “miséria de posição”, segundo o sociólogo Pierre Bourdieu. Essa posição – ser negro, ser pobre e morador de periferia - é "miserável" porque torna vulnerável quem, nela, está.

Passei imediatamente a acompanhar o caso e coloquei minha equipe à disposição do pai de Vinícius, que até agora não conseguiu ver o filho. O ator já está com um pedido de liberdade provisória feito e aguardando a decisão. A Comissão de Direitos Humanos da ALERJ também está empenhada em seguir os desdobramentos. Esse e outros tantos casos graves de racismo serão objeto de audiência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara já na primeira sessão, que estava marcada antes deste ocorrido. 

Todas e todos que conhecem Vinícius estão indignados! Em defesa destas e tantas outras prisões injustas, motivadas por racismo e por outros preconceitos, peço que #LibertemViniciusRomão!

Fonte: Jean.wyllys.

Humor negro é o que combate o racismo



por Bia Cardoso,
Imagino que muitas pessoas devam ler textos das Blogueiras Negras e pensarem: “nossa, que mulheres sem humor”. O humor é uma das melhores formas de comunicação humana, um texto bem humorado facilmente conquista as pessoas. Porém, em nossa sociedade, é preciso sempre se perguntar: quem está rindo? está rindo de quem? Porque o humor, assim como qualquer outro elemento cultural, também é utilizado para perpetuar preconceitos e apontar quem pode rir de quem.

Mulheres negras são muito bem humoradas. Converse com elas e descobrirá expressões, piadas internas e muitas gargalhadas. Porém, quantas humoristas negras tem destaque em nosso país? Sim, há pouquíssimas humoristas mulheres fazendo sucesso e eu ainda quero que elas sejam negras. Sei que estou pedindo demais, mas minha proposta nesse texto é justamente procurar iniciativas humorísticas produzidas por negras e negros que ajudem no combate ao racismo.

Wanda Sykes

O primeiro nome que sempre me vem a cabeça quando penso em comediantes negras é o da norte-americana Wanda Sykes. Entre seus vídeos mais famosos no youtube estão o que ela questiona o que é pior Ser gay ou negra? e o que apresenta a proposta da vagina removível, fazendo inclusive piada com a violência sexual que afeta as mulheres. É claro que nem todo mundo vai rir das piadas de Wanda, mas acredito que seja um bom exemplo de como fazer boas piadas com temáticas complicadas, o que prova que tudo depende de qual seu objetivo no humor. Porém, meus vídeos favoritos dela são o que ela trata do racismo reverso e dos estereótipos em relação as mulheres negras a partir da figura de Michelle Obama.

Lizzie Mae e o ‘Ask a Slave’


Atriz norte-americana Azie Dungey em seu figurino de escrava, durante o período que trabalhou como atriz na propriedade de George Washington. Crédito: Azie Dungey

Atualmente, meu canal favorito do youtube chama-se (http://www.youtube.com/channel/UCHPZR1lUMS47BA-N2Ihrtlg), Ask a Slave ou Pergunte a Escrava. É uma iniciativa da atriz norte-americana Azie Dungey. Nos vídeos, ela interpreta Lizzie Mae, uma das escravas da propriedade agrícola de George Washington, primeiro presidente dos Estados Unidos, e responde perguntas sobre sua vida. A ideia surgiu depois que Azie trabalhou como atriz durante anos em Mount Vernon, a residência de George Washington, que hoje funciona como um museu. Entre as perguntas que lhes eram feitas pelos visitantes, a principal era: por que você quis ser uma escrava?

Infelizmente, os vídeos não possuem legendas, nem são dublados. Porém, para você ter um gostinho do humor de Lizzie Mae, aqui vai um exemplo:

Um homem no primeiro episódio pergunta esta pérola: “Como é que você conseguiu ser empregada de um homem tão distinto? Você viu o anúncio no jornal?”. E a resposta de Lizzie Mae é: “Com certeza! O anúncio dizia: Precisa-se de empregada. Não há pagamento. De preferência mulata, atrevida e com bons quadris. Deve trabalhar 18 horas por dia, sete dias por semana, sem feriados. Mas, você tem que usar um vestido bonito, e se for sortuda, pode se realizar tendo o filho bastardo de algum homem branco famoso. Mal acreditei quando li isso, corri e disse: Inscreva-me!”

Tá bom pra você?

No Brasil, uma das iniciativas mais bacanas é do ator Érico Braz e da atriz Kênia Dias. Junto com a família, produzem o canal Tá bom pra você? no youtube, em que recriam peças publicitárias veiculadas na TV, mas tendo personagens negros como protagonistas. O ator contou, em entrevista ao jornal A Tarde, que a ideia surgiu após sua enteada começar a questionar a participação do negro na mídia: “A Gabriela começou a questionar a participação do negro na mídia em geral. Indicamos para ela ler o livro Um Defeito de Cor (Ana Maria Gonçalves, Editora Record). Mas ela continuou fazendo perguntas. Queria saber porque os assuntos sobre negritude, que são discutidos em casa, não são realizados também na escola. Então decidimos criar o canal para mostrar o outro lado da moeda”, conta Brás.

O vídeo mais visualizado do canal é Black Margarina. Nessa mesma entrevista, Érico e Kênia apontam outras questões em relação a consumo, publicidade e racismo:

“É engraçado que margarina, por ser um produto mais barato, é consumido muito mais pela população de baixa renda. E nós sabemos a cor da pobreza. E nem mesmo assim as empresas se propõem a colocar negros fazendo a propaganda. E é isso que o Tá Bom pra Você quer fazer. Vamos afirmar que preto também come pão. Estamos mostrando que o negro consome e eles devem atentar para isso”, fala Érico.

O vídeo mais recente é (http://www.youtube.com/watch?v=VvxWjLX9r6w), Black Livre que retrata um comercial de absorvente íntimo em duas versões, para as mulheres mais velhas e para adolescentes. “Absorvente é algo que faz parte do cotidiano de qualquer mulher. E porque nunca vimos uma publicidade com mulheres negras? Isso (a ausência de modelos negras) desacata até mesmo a lei da natureza. É uma falta de respeito, ainda mais no Brasil, onde a maioria da população é negra. O que só faz constatar quanto a democracia racial é mentirosa”, diz Kênia Dias.

Humor negro?

É claro que nenhuma dessas comediantes que citei está livre de escorregar em algum tema ou desrespeitar minorias. É importante que façamos essa reflexão em cima de qualquer forma de comunicação, especialmente o humor.

Enquanto pensava nesse texto, me peguntei: qual a origem da expressão ‘humor negro’?Segundo a Wikipédia: “O humor negro é um subgênero do humor que utiliza situações consideradas por muitos como de mau gosto ou politicamente incorretas, preconceituoso, usualmente de natureza mórbida, para fazer rir ou divertir o público menos susceptível. Entre os temas retratados pelo humor negro estão a morte, o suicídio e o preconceito racial (geralmente abordando etnias excessivamente vitimizadas pelo status quo ou por algum evento histórico que façam os outros grupos vê-los como supostas “vítimas” implicitamente)”.

Além de “humor negro”, outras expressões como “lista negra”, “magia negra”, “ovelha negra”, “mercado negro” ou até mesmo “o lado negro da força” sempre nos fazem remeter a palavra negra/negro como algo ruim. São expressões usadas no cotidiano e com certeza alguém virá dizer que isso não é racismo cultural, que a cor preta é a ausência de cor, logo é utilizada para expressar o que está escondido nas sombras. Poderia questionar esse “escondido nas sombras”, mas será mesmo que não há nenhuma associação? Nossa língua é viva e perpetua-se pelo tempo de acordo com os usos que as pessoas fazem dela. Se uma palavra recebe constantemente uma conotação que a desvaloriza, como se sentem as pessoas que se identificam com ela?

No dicionário Priberam, o verbete negra/negro recebe as seguintes associações: sombrio, triste, infeliz, mofino, fúnebre, tétrico, aflito. Em comparação, o verbete branca/branco é descrito como: Que tem a cor da neve ou do leite, pálido, alvo. Um verso branco é um verso livre, solto. Ao que me parece, pálido não chega a ser algo tão ruim para identificar alguém.

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‘As mulheres são criadas para achar que o casamento é muito importante’ diz Chimamanda Adichie

Foto: Ivara Esege

Escritora aclamada pela crítica internacional, a nigeriana pertence ao mundo cult, mas virou hit na internet depois de ter palestra ‘sampleada’ pela cantora Beyoncé.

Até poucos meses, a escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie era conhecida apenas por um público muito específico da literatura. Apesar de ter ganhado o Orange Prize por seu segundo romance, Meio Sol Amarelo, e colaborar periodicamente para a revista The New Yorker, a africana conquistou popularidade mundial depois de ter um trecho de sua palestra Todas deveríamos ser feministas “sampleado’’ por Beyoncé, em seu último disco. Entretanto, quando indagada sobre a cantora, ela se nega a comentar. Mas o fato é que, hoje, o cenário é outro para Chimamanda – bem diferente de 2008, quando teve passagem discreta pela Flip, em Paraty. Depois do ‘impulso’ da cantora pop, seu último livro, Americanah – a ser publicado no Brasil, no segundo semestre, pela Cia das Letras – saltou da posição 861 para 179 nas vendas na Amazon.

Radicada nos EUA, a escritora é militante contra o preconceito. O tema, inclusive, foi o fio condutor de uma outra conferência, ministrada por ela em 2009, intitulada O perigo da história única. O vídeo, que se espalhou pela rede, ganhou espaço nos debates online sobre estereótipos e visões restritas sobre a África: “Quis falar sobre como é importante não pensar que sabemos tudo sobre um lugar ou sobre alguém, quando, na realidade, apenas sabemos um pouco”. Outro tema pelo qual Chimamanda ganhou fãs – não por meio da literatura, mas pela internet – foi o feminismo.

Quando o assunto é diferença de gênero, a escritora repete, alto e bom som, alguns dos conceitos ditos na palestra que conquistou Beyoncé: “A mensagem da mídia, hoje, é ‘como manter um homem’, ‘como encontrar um homem’. Mesmo que você seja uma superprofissional ou tenha uma empresa, não está totalmente satisfeita de verdade até encontrar um homem. Essa é a mensagem. Com os homens é diferente”, afirma, defendendo um tipo de feminismo moderno: “Muitas vezes, quando falamos sobre ser feminista, as pessoas atribuem estereótipos muito negativos a essa palavra. Confundem feminismo com mulheres que odeiam os homens e acham que todas as relações entre homens e mulheres são opressoras”, afirma.

Ela vai além e também entra em questões políticas. Recentemente, declarou publicamente ser contra a lei antigay da Nigéria e, em seu livro Americanah, escreve sobre a eleição de Obama em 2008: “Acho ele brilhante, um dos melhores presidentes que os EUA já tiveram. Entrou no cargo com enorme quantidade de expectativas, que não eram realistas. Então, as pessoas que se dizem decepcionadas são as que sentiram que ele era Jesus Cristo e que iria transformar água em vinho”.

A seguir, os melhores momentos da conversa.
Como soube que a Beyoncé usaria uma amostra de sua conferência em sua música? Ela entrou em contato com você?

Não quero falar sobre Beyoncé.

Em sua palestra, que a cantora incluiu no disco novo, você fala sobre a criação de mulheres de uma maneira diferente – para que sejam mais independentes. Acredita que já estamos trilhando esse caminho?

Gostaria que isso fosse verdade, mas não é. Em todas as partes do mundo as mulheres ainda são julgadas de forma diferente em diversos assuntos. São as mulheres que valorizam mais o casamento, não os homens. São as mulheres que ainda valorizam o compromisso, não os homens.

Isso é algo generalizado?

Sim. A mensagem da mídia, hoje, é: “Como manter um homem”, “Como encontrar um homem”. E mesmo que você seja uma superprofissional ou tenha uma empresa, não está totalmente satisfeita de verdade até encontrar um homem. Essa é a mensagem. Com os homens é diferente. Então, as mulheres são criadas para achar que o casamento é muito importante. Os homens não. Isso é um problema.
Eu lhe retorno a pergunta que você propôs na palestra, quando diz “por que ensinamos as meninas a quererem se casar e não os homens?”
Bem… não sei. Acho que tem um aspecto um pouco cultural e, se voltarmos na história da humanidade, é história, é cultura e também é religião. Acho que a religião tem um papel importante nesse caso. Mas também acho que podemos desfazer isso. Não estou tão interessada em perguntar por que fazemos isso, mas em perguntar como podemos mudar isso.

Então, qual é o maior desafio para as mulheres hoje?

Há muitos desafios. Na Nigéria, por exemplo, as mulheres se escondem nas sombras do poder. Mesmo as que têm um cargo alto fingem quando estão em público. Elas ainda têm de entrar no jogo de como a sociedade espera que elas sejam. Se saem com o marido, têm de ser justas com ele, têm de dizer coisas como “oh, estou tão feliz que meu marido me permite”. Esse tipo de coisa. Seria muito bom se mais mulheres sentissem que não têm de se adequar a todas as expectativas culturais.

Sheryl Sandberg, CEO do Facebook, defende que, na medida em que mulheres conquistarem posições de poder, a tendência é a forma de trabalho (horário e método) mudar. Concorda?

As normas no ambiente de trabalho como são hoje foram feitas por homens, sob pressupostos de que as mulheres ficavam em casa e tomavam conta das crianças. E agora que as regras dos gêneros estão mudando. Só acho que mais países precisam repensar como podemos estruturar os horários de trabalho.

Acredita que o termo feminismo também sofre preconceito?

Sim. Muitas vezes, quando falamos sobre ser feminista, as pessoas atribuem estereótipos negativos. Confundem feminismo com mulheres que odeiam os homens e acham que todas as relações entre homens e mulheres são opressoras. Isso não é feminismo, realmente. É um radicalismo. Entretanto, acho que está mudando. Na década de 1970, as mulheres estavam muito mais dispostas a se rotularem como feministas. Isso mudou nos anos 90 e espero que seja melhor nos próximos dez anos, que mais mulheres e homens pensem sobre essa palavra.

No seu último romance, Americanah, você aborda o tema do cabelo para as mulheres como sendo uma questão não apenas estética, mas política.

O cabelo, muitas vezes, não é apenas cabelo. Certamente, julgamos as pessoas com base na aparência. E, para as mulheres, o cabelo tem esse caráter. Veja, por exemplo, a questão da coloração. Algumas escolhem não tingir o cabelo e essa atitude é interpretada como se ela estivesse rejeitando ideais convencionais de beleza, ou talvez ela “só seja muito orgânica e goste de ioga”. Mas, para as mulheres negras, é diferente.

Como?

Nós somos as únicas mulheres no mundo que gastam muito tempo e dinheiro para fazer com que o cabelo tenha uma aparência completamente diferente da original. Isso é o resultado de muitas coisas, entre elas a colonização e o imperialismo. Mas, acima de tudo, a sensação de que você não está no centro das coisas. Então, há essas jovens africanas que crescem sem olhar uma foto sequer de pessoas que se pareçam com elas. Interiorizamos ideais de que nosso cabelo é, de alguma forma, feio.

Não acha que isso está mudando no mundo?

Quanto mais mantemos o cabelo natural, mais as pessoas leem todos os tipos de significados para isso. Já me disseram, por exemplo, que, por não colocar produtos químicos em meu cabelo, estou levantando uma bandeira. Na verdade, gosto do meu cabelo do jeito que ele é. É tão convencional a ideia de que você tem de fazer alguma coisa no seu cabelo que, quando você escolhe não fazer, isso acaba se tornando uma bandeira.

Sua conferência O perigo da história única teve mais de 5 milhões de visualizações na internet. O que você quer dizer quando fala em “história única”?

Falo sobre uma visão única. Quis falar sobre como é importante não pensar que sabemos tudo sobre um lugar ou sobre alguém, quando, na realidade, apenas sabemos um pouco.

Acredita que é possível ter uma “história única” sobre nós mesmos?

Isso é bem interessante, na verdade. Acredito que podemos ter uma visão única sobre os outros. Em geral, as pessoas têm conhecimento sobre suas próprias complexidades.

Em sua palestra, você fala sobre os estereótipos que as pessoas têm da Nigéria. Qual era a sua “história única” do Brasil, antes de visitar o País?

Ah… o futebol, não é? Eu sou nigeriana, e o futebol é quase uma religião aqui. Mesmo que você não goste, é muito provável que saiba sobre o assunto. Mas devo dizer que, na verdade, estou brincando, porque fui ao Brasil duas vezes e sei que é um país muito complexo. Acho que uma das “histórias únicas”, ou estereótipos sobre o Brasil, é a que fala sobre como a raça realmente não importa – e há essa mistura incrível de pessoas. Então, estou muito interessada em como a raça se manifesta no Brasil, porque não acredito nessa versão da história.

O Brasil tem uma semelhança com a Nigéria, que é o sincretismo religioso, tema que você trata no livro Hibisco Roxo. Chegou a sentir essas semelhanças quando visitou o País?

Sim, com certeza. Lembro-me de estar dirigindo do aeroporto do Rio de Janeiro para a Flip e pensar em como o Brasil se parece com a Nigéria. Mas as estradas no Brasil são melhores (risos).

Você já afirmou que gosta muito de escrever sobre as emoções humanas. Como desenvolve o tema quando está diante do computador?

Não tenho muita certeza sobre o quanto de minha escrita é inteiramente consciente. Mas, em geral, estou muito interessada nas pessoas. Gosto de observar e entender o que significa ser humano. Estou interessada nas emoções humanas, porque acho que elas guiam muito do que fazemos.

Em Americanah, um dos personagens acompanha as eleições de Barack Obama. Como uma nigeriana que mora nos Estados Unidos, o que acha do presidente?

Acho ele brilhante, um dos melhores presidentes que os EUA já tiveram. Ele entrou no cargo com uma enorme quantidade de expectativas, que não eram realistas. Então, as pessoas que se dizem decepcionadas são aquelas que sentiram que ele era Jesus Cristo e iria transformar água em vinho. Mas ele não é, e acho que tem feito o bastante. E também o admiro profundamente como pensador e escritor. Se você ler o primeiro livro de Obama, seu livro de memórias, A Origem dos Meus Sonhos… acho que é muito bem escrito, mas também mostra que tipo de mente e, principalmente, sua imaginação. Creio que pessoas assim deveriam estar em cargos públicos.

E quanto à primeira-dama?

Adoro a Michelle!

Quando veio ao Brasil para participar da Flip, você leu uma pequena parte de Autobiography of My Mother, da romancista Jamaica Kincaid, como seu trecho de livro favorito. Se fosse escolher agora, qual seria?

Acho que escolheria Michael Ondaatje, porque estou lendo ele novamente. E sempre amei seu trabalho. Amo seus livros. Estou cada vez mais interessada em escrever esse tipo de coisa, acho que é muito inspirador.

Nessa mesma ocasião, você justificou sua escolha dizendo que era um livro poético e sensual. É ainda esse tipo de literatura que lhe interessa?

Sou interessada em todos os tipos de literatura. Da mesma maneira que adoro ler livros poéticos e sensuais, gosto muito de uma literatura que não tenha nada disso.

Já tem alguma ideia para seu próximo livro?

Tenho, sim, mas sou muito supersticiosa. Então, não vou lhe contar.

Fonte: Estadão.

Mulheres de Taguatinga participam de pesquisa sobre diversidade sexual


Objetivo é avaliar o grau de aceitação social da diversidade sexual

O secretário afirmou, ainda, que o prazo não será prorrogado e que o cidadão com débitos inscritos em Dívida Ativa do DF fica impedido de utilizar os créditos do Nota Legal. A Secretaria da Mulher iniciou, esta semana, em Taguatinga, uma pesquisa para aprofundar o conhecimento em um dos principais eixos de atuação da pasta, os problemas relativos ao plano "Rede Mulher", em todas as suas dimensões – raciais, étnicas, geracionais, orientação sexual, deficiência, inserção social, econômica e regional.

Entre os temas que serão avaliados estão a aceitação da homossexualidade, a percepção sobre a discriminação de mulheres lésbicas, além da opinião pública sobre a criminalização de atitudes homofóbicas, o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a adoção de crianças por casais homossexuais.

A ação é coordenada pela Subsecretaria de Políticas para as Mulheres e será realizada em pontos de concentração de Brasília, Ceilândia, Planaltina, Samambaia e Taguatinga, tendo como meta entrevistar mil pessoas.

Para a subsecretária de Políticas para as Mulheres, Sandra Di Croce Patrício, a sondagem irá apoiar a formulação das políticas públicas de gênero e diversidade do Governo do Distrito Federal.

"O momento da realização da pesquisa é estratégico, estamos iniciando o processo de formulação do "1° Plano Distrital de Políticas para as Mulheres" e a questão da diversidade permeia todo esse trabalho", disse.

Os resultados da pesquisa devem ser divulgados ainda em fevereiro.


Fonte: Agência Brasília.

Terrenos de templos religiosos serão regularizados

Foto: Glaucya Braga/GDF

Governador Agnelo Queiroz assinou decreto que possibilita venda e concessão dessas áreas

Por Vaneska Freire, da Agência Brasília,
BRASÍLIA (21/2/2014) – O decreto que permite a licitação de terrenos de templos religiosos, com preferência para os atuais ocupantes, foi assinado nesta sexta-feira (21) pelo governador Agnelo Queiroz. A iniciativa permitirá a regularização urbanística e fundiária das unidades imobiliárias ocupadas por entidades religiosas de qualquer culto para celebrações públicas, entidades de assistência social e povos ou comunidades tradicionais no Distrito Federal.

O governador afirmou que um terço dos terrenos do DF estava irregular. "Fizemos um grande trabalho de regularização. Os templos religiosos e entidades sociais são uma área especial, mas tínhamos muita dificuldade para legalizar as áreas que ocupam. Buscamos todos os caminhos para garantir segurança jurídica e a regularização", declarou Agnelo.

O decreto abrange os templos e entidades que já ocupavam o terreno antes de dezembro de 2006. Essas áreas serão licitadas, e os ocupantes terão a opção de comprar ou receber a concessão de uso. "A licitação será para Concessão de Direito Real de Uso, com opção de compra, e até 240 meses para pagar", explicou o secretário de Habitação, Geraldo Magela.

A Terracap convocará as entidades relacionadas na Lei Complementar nº 806/2009 para que apresentem requerimento de regularização, juntamente com a documentação exigida, no protocolo da Secretaria de Habitação (Sedhab).

"Com a assinatura desse decreto, teremos condições de publicar o primeiro edital em poucos dias", garantiu Magela. Antes da licitação, todos os terrenos a serem licitados serão vistoriados pela Terracap, para comprovar a utilização para atividades religiosas e de assistência social.

As entidades que prestam serviço social permanente poderão ter a Concessão de Direito Real de Uso gratuitamente. Neste caso não terão a opção de compra.

(V.F./I.M.*)

Fonte: DF.gov.br.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Pesquisa analisa racismo no Brasil


por Valor Econômico,
Quanto mais escura a cor da pele, menos renda, menos educação, menos oportunidades. O inverso também é verdadeiro: quanto mais clara a cor da pele, mais renda, mais educação, mais oportunidades. Para além da diferença aguda entre os pontos mais extremos da desigualdade na estratificada sociedade brasileira - na ponta mais alta, homem, branco, urbano e rico; na mais baixa, mulher, preta, rural e pobre -, a pesquisa A Dimensão Social das Desigualdades, do sociólogo Carlos Costa Ribeiro, encontrou uma escala de desigualdades que acompanha de forma contínua o escurecimento da cor da pele.

Os dados mostram como a cada ponto a mais no escurecimento da cor da pele corresponde também um ponto a menos na escala de oportunidades sociais e econômicas (veja gráfico na próxima página). "Com isso, consigo refinar a percepção sobre desigualdade racial", diz Ribeiro, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp), da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj). A proposta de trabalhar com um amplo espectro de cores de pele - 14, autodeclaradas pelos seus entrevistados - está ancorada na história da miscigenação racial no país. No Brasil, explica, raça diz mais respeito à aparência física e à cor da pele do que à origem. Tonalidade da pele, tipo de cabelo, formatos de nariz e de boca são traços distintivos de maior ou menor proximidade com o branco, expressão física dessa miscigenação, e melhor representação da realidade social do que a mera divisão entre brancos e não brancos.

Para recuperar os aspectos históricos do racismo brasileiro, Ribeiro voltou a 1890, ano do primeiro censo demográfico no país, quando 56% da população era negra. O fim da escravidão havia sido decretado dois anos antes. Em seguida, uma política de "embranquecimento" estimulou não só a vinda de imigrantes europeus como também os casamentos inter-raciais, início da miscigenação brasileira: "Havia uma ideologia racista que considerava os brancos superiores aos negros, e esses casamentos eram uma forma de projetar o embranquecimento da população", afirma.

O censo de 1940 já mostrava os primeiros resultados dessa política: 64% dos brasileiros foram identificados como brancos e apenas 36% como negros. São números que se mantiveram mais ou menos estáveis até o fim dos anos 1990, quando 54% da população era autodeclarada branca e havia 46% negros, considerando a soma de pretos e pardos. No censo de 2010, o percentual de brancos caiu para 47% - 91 milhões de brasileiros -, inferior aos 50% que se declararam pretos ou pardos. Do total de 97 milhões de negros, 82 milhões são classificados como pardos.

É nesse ponto que reside o ineditismo da pesquisa, levantamento de dados em uma amostra de oito mil domicílios brasileiros, o equivalente a 3,3% da população. Ao identificar os muitos tons de pele do grande grupo de pardos e, portanto, ao representar melhor as distinções existentes na ampla camada que separa brancos e negros, o estudo mostra que o racismo não está apenas nas pontas extremas entre o branco e o preto, mas se dá em cada um dos degraus de cor que separam, por exemplo, o moreno do moreno claro, o mulato do moreno escuro, o jambo do castanho.

"É uma forma de modelar, de nuançar a desigualdade racial brasileira, em vez de trabalhar apenas com o grande contraste que há entre brancos e negros", aponta. Ao observar essas nuanças, Ribeiro constata que, no Brasil, uma pessoa de pele branca, mesmo de origem negra, tem mais chances de ser socialmente percebida como branca, independentemente da cor da pele dos pais. No entanto, suas chances de mobilidade social e econômica serão menores, já que a desigualdade de oportunidades está relacionada às origens familiares e as condições socioeconômicas de origem.

Ribeiro observa que sua pesquisa faz sentido no Brasil não apenas porque aqui a divisão entre brancos e não brancos mascara uma realidade social mais complexa, mas sobretudo porque a história do racismo no país passa por uma miscigenação que os Estados Unidos, por exemplo, não experimentaram.

"O enigma da desigualdade racial no Brasil está no fato de que as relações sociais horizontais [entre pessoas da mesma classe social] são relativamente fluidas e flexíveis, mas as relações verticais [entre classes sociais diferentes] são profundamente estratificadas", diz. Nas relações verticais, pesquisas como essa do Iesp percebem a desigualdade entre renda, educação e ocupação entre brancos e negros, indicadores da extrema rigidez da mobilidade social dos negros. Já nas relações sociais horizontais, os vínculos sociais nas mesmas classes sociais seriam mais flexíveis.

"Comparações entre Brasil e EUA são traiçoeiras, porque os modelos de racismo são diferentes", argumenta a secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Luiza Bairros. Ela se refere ao fato de que, apesar da miscigenação e da cor da pele, há discriminação mesmo nas situações de sociabilidade horizontal. Ela toma como exemplo uma quadra de escola de samba que, observada por um pesquisador americano, pode dar a impressão de haver maior nível de igualdade entre negros e brancos do que de fato a população negra experimenta no seu cotidiano.

"Em outros espaços que sejam de maioria branca, não há a mesma flexibilidade. Essas relações sociais aparentemente igualitárias só ocorrem em espaços de maioria negra", diz. Com isso, Luiza ataca também o que considera outro mito do racismo brasileiro: o de que não há segregação espacial. "São sutilezas que precisam ser observadas, sob pena de se considerar que as relações sociais horizontais se dão independentemente da cor da pele." Assim, o degradê de cores da sociedade pode contribuir para perceber melhor a influência de cada tom da cor da pele na discriminação racial.

A pesquisa chega como parte de uma longa trajetória de trabalhos sobre racismo, que começa com Gilberto Freyre, nos anos 1930, passa pelos estudos do sociólogo Carlos Hasenbalg, autor de "Discriminação e Desigualdades Raciais no Brasil" (1979), e tem seu ponto fundamental de inflexão com o economista Ricardo Henriques nos anos 90. Então pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Henriques já argumentava que o racismo é o núcleo duro da desigualdade brasileira. Afirmação que se deu em um momento político em que o debate sobre cotas, ações afirmativas e políticas públicas criava o que ele e Ribeiro consideram uma falsa disputa: o que é mais importante, a discriminação racial ou a de classe? "Não gosto da ideia de precedência", afirma Henriques, hoje superintendente do Instituto Unibanco, onde se dedica a projetos de educação para jovens, um dos grandes gargalos da mobilidade social brasileira. "Embora o elemento classe componha a desigualdade, é impossível tirar da história do país a questão racial", comenta.

Ao mostrarem o degradê da desigualdade racial, Ribeiro diz que seus dados pretendem contribuir para superar essa dicotomia que marca o debate brasileiro sobre desigualdade. "A dicotomia entre classe e raça não faz sentido no Brasil. São as duas coisas, até porque não existe uma fronteira absolutamente clara entre elas", defende ele. No argumento de que raça é o núcleo duro da desigualdade brasileira, como defendido por Henriques, há um objetivo político determinado: o desenvolvimento de políticas públicas que enfrentem a desigualdade racial sem estabelecer precedência da classe em relação a raça.

"Na cultura das gestões públicas, no desenho das políticas públicas, o racismo entra como uma questão muito remota. Sem o elemento racial, pode-se até fazer uma importante política que enfrente a desigualdade de renda e mesmo assim não terá havido o enfrentamento da diferença", diz Henriques. A confirmar seus argumentos estão os dados de renda recém-divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), indicando que, entre 2003 e 2013, a renda da população negra - aí somados pretos e pardos - cresceu 51,4%, enquanto a da branca aumentou apenas 27,8%. Apesar do expressivo crescimento, a renda dos negros corresponde apenas a 57,4% da renda dos brancos.

Em grande medida, o alto percentual de crescimento entre os negros ocorre pelo que as pesquisas de Henriques já haviam detectado no fim dos anos 1990: há uma sobrerrepresentação de negros na população pobre. Em 1999, o pesquisador contabilizou que os negros eram 45% da população, mas eram também 64% dos pobres e 69% dos indigentes. Na medida em que cresce a renda média dos pobres, como ocorreu na última década, cresce necessariamente a renda média dos negros.

"Pretender enfrentar primeiro o problema de classe é acreditar que se pode dar conta da desigualdade em fases e em algum momento chegará aos negros", diz Henriques. Ao borrar as fronteiras que se pretendiam nítidas no par brancos e não brancos, Ribeiro se alinha à argumentação de Henriques: se a desigualdade social brasileira é pior para aqueles que têm a cor da pele mais escura, políticas que apenas trabalhem com distribuição de renda, sem levar em conta o fator racial, vão alcançar por último o mais preto, que é também o mais pobre e o que tem menos oportunidades.

"No Brasil, como não é possível pensar raça e classe como grupos separados, trabalho com modelo aditivo em que se somam renda, família de origem, raça, gênero, região", diz Ribeiro. É a partir desse modelo que ele pode encontrar não apenas os extremos - homem branco urbano e rico versus mulher negra rural e pobre - como perceber que em cada ponto da escala de cores há um tipo de discriminação e desigualdade específica.

Com os dados que levantou, a pesquisa caminha na contramão de discursos que apontam para a possibilidade do que alguns estudos sobre desigualdade racial chamam de "embranquecimento por dinheiro". Como nas estatísticas a cor é autodeclarada, o embranquecimento se daria como parte de processos de ascensão social. Quanto maior a renda, mais aquele que se declarava preto pode passar a se declarar pardo e o pardo pode se declarar branco. No degradê da discriminação percebido por Ribeiro, esse "embranquecimento" tem limites explícitos. "Pode ser uma estratégia para enfrentar a barreira do preconceito", diz Ribeiro.

"Ainda que as pessoas de pele mais escura possam tentar, é como se a pele negra tivesse um valor em si que não pode ser ultrapassado pela renda", observa Luiza. "É muito comum no Brasil que as pessoas de pele mais escura que se declaram negras sejam discriminadas em espaços majoritariamente brancos", observa a secretária, citando como exemplo as dificuldades que os alunos negros cotistas têm enfrentado nas universidades federais. "O que se percebe é que, numa conjuntura de melhoria nas condições de vida nas pessoas negras, as discriminações aumentam, porque cada vez mais negros entram em espaços que eram exclusividade de brancos."

Um sinal de que o racismo é o núcleo duro da desigualdade brasileira pode ser o fato de que acesso à renda não é suficiente para enfrentar a discriminação. Nesse aspecto, o diretor da Anistia Internacional no Brasil, Atila Roque, afirma que a população negra ainda é a mais discriminada, por exemplo, nas abordagens policiais e na violência de Estado.

"O que se percebe no Brasil é que, apesar das políticas públicas que promoveram melhoria de renda e até de oportunidades e mobilidade social, a população negra ainda é a mais discriminada. Isso se expressa, por exemplo, no chamado racismo institucional, como no acesso das negras a serviços de saúde reprodutiva, nas abordagens policiais e na violência de Estado em geral. Jovens negros também estão entre as principais vítimas de homicídios, tragédia que não tem merecido a devida atenção das políticas públicas. O racismo no Brasil é fator central de uma estrutura social que distribui desigualmente o poder político, a distribuição dos recursos e o acesso aos direitos humanos fundamentais", afirma.

Por fim, há um fenômeno novo percebido tanto pela secretária Luiza quanto pelo sociólogo Ribeiro: há um processo de escurecimento da população, detectado não apenas nos dados do Censo de 2010, que vem sendo confirmado pela última Pnad. Sobretudo entre a população jovem, há uma tendência ao escurecimento que pode estar relacionada com a possibilidade de obter as recentes vantagens conquistadas pelas políticas de ação afirmativa. "Um dos aspectos importantes da discriminação racial no Brasil é a diferença entre a maneira como cada um se autodeclara e a maneira como é visto pelos outros", afirma Luiza.

Se houver uma vantagem em se declarar negro, porém, a forma como a raça foi construída no país permite a fluidez na autodeclaração de cor. Até porque, ao enfatizar a cor da pele, e não a ascendência, o racismo brasileiro cria mais uma armadilha. Se os brasileiros fossem discriminados pela origem, e se em 1890 havia 56% de africanos no país, a categoria afrodescendentes se aplicaria hoje a todos os brasileiros. O termo afrodescendente foi criado em 2001 pela ONU para identificar a diáspora africana em vários países. No Brasil, acredita a secretária, acabou sendo usado de forma muito demagógica. "Dizer que somos todos afrodescendentes equivale a dizer que somos todos iguais, o que não é verdade", diz. O que o trabalho de Ribeiro só reafirma: na sociedade brasileira, alguém está em posições mais ou menos vantajosas não pela origem, mas pelo lugar que ocupa no degradê da cor da pele.